O governador Binho Marques despediu-se ontem, 18, da comitiva de autoridades do Estado americano da Califórnia, que passou quatro dias conhecendo as experiências de sustentabilidade econômica, social e ambiental do Acre. O grupo, liderado pelos secretários Mike Chrisman, de Recursos Naturais, e Linda Adams, de Proteção Ambiental, fez uma avaliação positiva da viagem e anunciou que irá atuar em favor de parcerias entre o Estado da Califórnia e o Governo do Acre. “Fico feliz com essas impressões”, disse Binho Marques.
A possibilidade de parcerias vai de temas como a defesa civil – área que a Califórnia tem grande know-how no atendimento às emergências decorrentes dos incên-dios florestais, até assuntos de maior complexidade, como a construção de uma economia de baixo carbono. “Estivemos discutindo entre a possibilidade de colocar o Acre dentro do mercado de carbono”, informou Linda Adams.
Secretários e assessores viajaram ao Acre por manifestação do governador da Califórnia, Arnold Schwazernegger. A Califórnia se desponta como líder de governos subregionais, que, entre outros exemplos, realizam ações independentes de enfrentamento às mudanças climáticas. Nesse contexto, se constitui em parceiro que pode colaborar com o Acre na consolidação de seu novo momento.
Comitiva conhece experiências ambientais do Acre
A estratégia de desenvolvimento do Governo do Estado pautada na valorização da floresta e a política de sustentabilidade, com foco na melhoria da qualidade de vida e na inclusão social e econômica das famílias. Estes foram os nortes para que a equipe de governo definisse a agenda da visita de representantes do governo da Califórnia ao Acre.
De acordo com o secretário de Meio Ambiente, Eufran Amaral, a agenda foi dividida em três etapas. Foram escolhidas três experiências nas quais a preservação e valorização do meio ambiente atuam como orientações centrais. “Nossa proposta é mostrar o planejamento estratégico de governo a partir de ações concretas. Em qualquer situação, seja vivendo na floresta, da floresta e com a floresta, a preservação vai estar presente”, afirma Eufran Amaral.
Ao longo de três dias no Acre, eles conheceram modelos de florestas conservadas (comunidade Ashaninka), florestas manejadas (indústrias de base florestal) e florestas consolidadas. O grupo foi acompanhado pelos secretários de Estado Eufran Amaral (Meio Ambiente), Fábio Vaz (Governo) e Carlos Resende (Floresta).
Mike Chrisman, secretário de Recursos Naturais – instituição que equivale à Secretaria de Meio Ambiente do Acre (Sema), se disse impressionado com o compromisso das comunidades e dos grupos indígenas. “Acredito que tenho muito a aprender com as experiências que vivenciei no Acre sobre sustentabilidade, e as levarei para a Califórnia”.
Em Xapuri, os secretários da Califórnia iniciaram a visita pela Casa de Chico Mendes. Em seguida conheceram as fábricas de pisos e de preservativos masculinos e o Seringal Cachoeira. Ontem, 18, a comitiva visitou propriedades rurais em Bujari.
As visitas de comitivas estrangeiras ao Acre fazem parte da tática de integração do Governo do Estado. E são resultados da estruturação da Política Estadual de Valorização Ambiental, fruto da construção coletiva do Zoneamento Ecológico-Econômico. Além disso, elas permitem a troca e o compartilhamento de competências e experiências, e a proximidade entre os dois países abre possibilidades para novas parcerias financeiras e de cooperação técnica.
“Já avançamos muito com a política de valorização ambiental. Estamos procurando mais parceiros para continuarmos com as melhorias”, avalia Eufran.
As potencialidades da Floresta Amazônica
A secretária de Meio Ambiente da Califórnia, Linda Adams, e o secretário de Recursos Naturais, Mike Chrisman, conheceram ainda mais um pouco do que a Floresta Amazônica pode oferecer tanto às pessoas que vivem nesta região quanto aos visitantes. Nilson e Duda Mendes foram os anfitriões da comitiva na Reserva Extrativista Chico Mendes.
Durante a caminhada pela mata iam contando um pouco das lendas e histórias, falando das espécies das árvores e dos segredos que cada uma revela, além de destacar a importância do trabalho desenvolvido pelos seringueiros. “Nós que vivemos na floresta aprendemos a respeitar a natureza”, enfatizou Nilson Mendes, durante o encontro com a comitiva da Califórnia.
Uma das árvores que mais chamou a atenção dos visitantes, em especial da secretária Linda Adams, foi a Rainha da Floresta, uma samaúma com mais de 20 metros de altura. De acordo com os moradores da Reserva, o maior galho da Rainha da Floresta aponta para o lado que tem água. “Estou impressionada com tudo o que estou vendo aqui. É importante conhecer e ver de perto a beleza e os tesouros encontrados na Floresta Amazônica”, disse a secretária enquanto contemplava a Reserva Extrativista Chico Mendes.
A Reserva é um dos lugares que demonstra as potencialidades da região amazônica, as belezas naturais proporcionam a possibilidade do ecoturismo. Na Pousada Cachoeira, os turistas têm a oportunidade de vivenciar a vida na floresta.
Além disso, é possível ainda conhecer o trabalho de manejo florestal, uma das estratégias incentivadas pelo Governo do Estado dentro de uma política de desenvolvimento sustentável. “Aqui a comitiva pode conferir de perto outro tipo de relação com floresta. As pessoas que moram na Reserva precisam retirar seu sustento da floresta, mas têm feito isso de forma harmônica”, destacou Eufran.
Para exemplificar a afirmação, o secretário falou da importância do manejo florestal e da consolidação das cadeias produtivas com base na participação das famílias. Os planos de manejo estão diretamente ligados à produção do Complexo Florestal Industrial de Xapuri. No Seringal Cachoeira, por exemplo, 86 famílias retiram por ano 11 toneladas de borracha seca, 300 toneladas de castanha e seis mil metros cúbicos de madeira das áreas de manejo.
“Estamos unindo a comunidade a um empreendimento de alta tecnologia, e mais que isso agregando valor à matéria-prima. Os moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes são um exemplo de que a integração entre comunidade e poder público garantem a atuação em várias linhas como na extração de madeira, turismo, e nas cadeias produtivas da borracha e castanha. E também a melhoria da qualidade de vida, aumento na geração de renda e na garantia de serviços ambientais”, concluiu o secretário.
Fábrica de Preservativos Natex irá ampliar a produção em 2010
Com a meta de viabilizar a economia extrativista, agregando valor ao produto e elevando a qualidade de vida dos seringueiros a Natex, única indústria no mundo a utilizar como matéria-prima o látex nativo, iniciou a operação com toda a produção destinada ao Ministério da Saúde. Os preservativos fabricados no Acre são distribuídos pelo Governo Federal através do programa DST/Aids.
Os resultados positivos permitiram a ampliação do projeto, assim a partir do próximo ano, a idéia é iniciar a produção de preservativos para a linha comercial. E como incremento dois estudos estão em andamento para colocar no mercado um produto com mais diferenciais. As pesquisas tecnológicas são voltadas para o desenvolvimento de gel lubrificante e outro retardante com produtos naturais.
O histórico, as metas e o processo de fabricação foram apresentados aos integrantes da comitiva. Durante a visita a equipe de governo ressaltou a importância do empreendimento para os seringueiros. Depois da instalação da Natex, o preço final da borracha teve um incremento de 250%. Os seringueiros têm uma renda mensal de em média dois salários mínimos durante os sete meses de safra.
A indústria tem capacidade instalada para a produção de 100 milhões de camisinhas por ano. Atualmente gera 150 empregos diretos, além de envolver no processo de extração do látex 500 famílias.
Para que o processo de retomada da borracha fosse viabilizado, o Governo do Estado investiu em ações integradas que têm garantido a infra-estrutura necessária para o êxito do empreendimento, como a recuperação de ramais, reabertura de varadouros, programa de energia solar e do fogão que gera energia, e na melhoria sanitária das propriedades rurais.
Poder público, comunidade e iniciativa privada investem na exportação de pisos e deques
Durante a visita da comitiva da Califórnia à fábrica de pisos Xapuri, os integrantes puderam conhecer o beneficia-mento da madeira, extraída de áreas de manejo. A transformação da matéria-prima, que há dez anos saía do Estado sem a certificação, em pisos e deques foi acompanhada pelos visitantes.
“Este é um modelo de uma experiência que está dando resultados cada vez melhores”, ressaltou o secretário de Floresta, Carlos Ovídio. O secretário destacou ainda os 150 trabalhadores da fábrica e os 250 manejadores envolvidos com o processo de extração de madeira irão se reunir nos próximos dias para comemorar os números relacionados à safra deste ano.
Foram 25 mil metros cúbicos de madeira retirada das áreas de florestas públicas de manejo comunitário e dos projetos de assentamento. “A fábrica, que já trabalha com a custódia da certificação, pode no ano que vem receber o primeiro certificado de mercado justo”, comemora o secretário.
A fábrica de Pisos Xapuri adotou o modelo econômico Público, Privado e Comunitário (PPC), que garante a participação social no empreendimento. Toda a produção é consumida no mercado brasileiro ou exportada para os Estados Unidos, União Européia e Ásia.
No Bujari, grupo conhece o bem-sucedido modelo de assentamento dos pólos agroflorestais
Após vários anos vivendo em Xapuri e Rio Branco, a agricultora Marilene Pereira Matos decidiu partir para uma nova etapa de sua vida e, junto com os dois filhos e o marido, Artur, foi morar no Pólo Agroflorestal Dom Moacyr, em Bujari, uma iniciativa de assentamento implantada pioneiramente durante a gestão de Jorge Viana como prefeito de Rio Branco e depois levada para vários municípios do Estado. Criado em 2000, o PAB está prestes a completar uma década de sucesso: assentados em módulos de sete hectares, a base da produção é a agricultura familiar em áreas que antes estavam completamente degradadas e foram incorporadas ao processo produtivo.
Visitado ontem, 18, pelos secretários de Meio Ambiente e de Recursos Naturais da Califórnia, o pólo é uma alternativa bem-sucedida aos assentamentos tradicionais. “A renda financeira, por exemplo, chega a ser o triplo”, compara Nilton Cosson, titular da Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (Seaprof), um dos secretários que acompanharam a comitiva californiana. Em três dias de visita, o grupo conheceu a reserva Ashaninka, em Marechal Thaumaturgo; o Seringal Cachoeira e os empreendimentos agroflorestais de Xapuri, pólos e fazendas que conseguiram elevar a produção, recuperar áreas degradadas e reduzir a pressão sobre a floresta a partir das políticas de sustentabilidade do Governo do Estado.
Há quase dez anos Marilene e sua família vêm trabalhando de forma sustentável.
Um dos exemplos é a não utilização de fogo no preparo do solo e a introdução de tecnologias como o cultivo protegido. O dia-a-dia, no entanto, agregou outros conhecimentos acerca de culturas tidas como melindrosas, como o jambu: “ele gosta de água e adubo”, concluiu Marilene, cuja vida mudou radicalmente desde que foi assentada no pólo, onde a renda mensal média passa dos quatro salários mínimos mensais. Com muito trabalho, a família conseguiu montar uma boa estrutura, comprando carros e um mini-trator para a lida diária, além de moto para os serviços mais simples, como comprar alguma coisa na cidade ou levar os jovens para a escola. Há períodos em que pelo menos três pessoas têm de ser contratadas para ajudar a família.
O pólo é realmente uma ilha de produção, um modelo que atendeu as expectativas de pelo menos 60% de seus ocupantes, sendo que uma boa parte deles passou a fazer parte da classe média rural que surgiu no Acre nos últimos anos. A experiência dos pólos agroflorestais foi a resposta mais eficaz encontrada para fazer frente à questão fundiária do Acre, porque garante o uso social da terra com o assentamento de famí-lias de ex-seringueiros e agricultores então excluídos do processo produtivo do Estado, ao mesmo tempo em que é a proposta que permite a geração de emprego e renda.
Atualmente, 14 pólos estão implantados no Estado, distribuídos em 12 municí-pios e beneficiando quase 1.000 famílias. As principais atividades desenvolvidas são a horticultura, piscicultura e os sistemas agroflorestais (SAFs). Apenas em folheosas (verduras e hortaliças) são retirados mensalmente 225 mil maços das mais variadas espécies. “O pólo mudou tudo na nossa vida”, resumiu Marilene. (Agência de Notícias do Acre)