A Constituição cidadã, como chamou Ulysses Guimarães ao promulgá-la em 1988, incorporou um avanço importante ao estabelecer em seu Artigo 14 três formas de exercício de democracia direta – plebiscito, referendum e iniciativa popular. Aos poucos estas inovações vão sendo utilizadas no país, vencendo de um lado a resistência daqueles que atuam isoladamente, achando-se donos da vontade popular e, de outro, certa inércia da sociedade que ao eleger seus representantes no parlamento tende a descansar em relação aos próprios interesses.
Diferentemente do plebiscito que antecede e serve de base para a futura Lei, e da iniciativa popular que é a proposição de uma Lei, o referendo é um processo de julgamento da eficácia e da adequação de uma Lei em vigor. Pelo referendo a sociedade pode revogar leis e assim afirma-se acima do legislador, afinal, como diz a própria Constituição, o poder emana do povo.
Foi o que aconteceu, por exemplo, no dia 23 de outubro de 2005, quando o eleitorado brasileiro respondeu, através da urna eletrônica, se o comércio de armas e munições devia continuar existindo no país ou, ao contrário, se esse comércio devia acabar. A proibição do comércio de armas já constava no Estatuto do Desarmamento (lei 10.826/2003), mas somente com o referendo esse ponto da lei teria validade.
É o que acontecerá em 3 de outubro de 2010 no Acre, quando o eleitorado responderá se o horário antecipado em uma hora por uma Lei de autoria do senador Tião Viana continuará vigorando ou não.
Em democracias mais consolidadas a participação direta da população em processos legislativos é comum. Juntamente com as eleições que levaram Barack Obama ao poder nos Estados Unidos, os eleitores votaram 163 referendos. Na Califórnia, por exemplo, foi autorizada a criação do maior centro de pesquisas de células-tronco do mundo.
O referendo que acontecerá no Acre em outubro próximo é o primeiro ocorrido no Brasil em nível estadual (os outros dois foram em nível na-cional). Mais uma vez os acreanos darão ao país um verdadeiro exemplo de democracia e dirão nas urnas o que pensam e o que sentem em relação à modificação do seu ritmo de vida, decorrente da mudança de horário que aconteceu sem nenhuma razão defensável. Definitivamente, o acreano não aceita imposições.
O exercício da democracia direta é um fortíssimo elemento de estímulo à participação da sociedade. É também um processo educativo à medida que põe em debate questões que dizem respeito ao seu dia-a-dia e que pela postura autoritária de determinados políticos são tratadas desrespeitosamente de cima para baixo. No caso acreano não é demais dizer que em 2010 a hora é do povo.