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Acreano relata miséria do Haiti


O acreano natural de Sena Madureira, município a 144 quilômetros de Rio Branco, engenheiro agrônomo formado pela Universidade Federal do Acre (Ufac), Reginaldo Silveira, 39, é consultor do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e é um dos responsáveis pela elaboração de um projeto do Governo Federal na área de Segurança Alimentar para o Haiti, país devastado com um terremoto de magnitude 7, às 16h53 de terça-feira (12), hora local – 19h53 de Brasília.

Régis, que mora em Brasília há 5 anos, especializou-se em consultoria de assuntos relacio-nados a agricultura e alimentação. Esteve durante 20 dias na capital haitiana, Porto Príncipe, em fevereiro de 2009, próximo de onde ocorreu o epicentro do terremoto que vitimou cerca de 3,5 milhões de pessoas.

Em sua agenda, estava marcado até terça-feira, 12, o retorno previsto para março deste ano para a ilha caribenha, onde seria apresentado o projeto elaborado por ele e uma equipe do MDA para oferecer uma estratégia de produção agrícola digna e rentável para a população.

A missão foi suspensa temporariamente pela Embaixada do Brasil devido a necessidade urgente de reparos no país, agora em pleno caos.

O Brasil tem várias cooperações com o Haiti, e uma delas se dá na área de agricultura e segurança alimentar, através de uma convênio do Ministério do Desenvolvimento Agrário, o Programa das Nações Unidas (Pnud)  e o Programa de Cooperação Técnica do Governo Federal.

Na missão, fazem parte, além de Regis Silveira, do MDA, representantes da Embrapa, Emater-DF, Ongs, Conab e representantes da Embaixada Brasileira, e através dela foi possível o acreano conhecer de perto a miséria dos haitianos em todos os aspectos.

Precariedade que choca
Reginaldo Silveira está em Rio Branco para fazer um serviço de consultoria e retorna à Brasília na próxima terça-feira, 19. Numa conversa com a reportagem, ele detalha sua visão sobre o Haiti e o sonho de concluir o trabalho realizado em prol da população do país.

“Quando fiquei sabendo do fato estava em casa. Deu-me medo e pensei como tem sido terrível o que aquele povo está passando. Eles vivem numa vida altamente precária e, na área em que sou especialista, o que posso afirmar é que eles têm um sistema de produção miserável e uma insegurança alimentar que beira o desespero. Para se ter idéia, 80% da população do país vive abaixo da linha de pobreza e cerca de 50% das famílias vivem com cerca de R$ 2,00 por dia”, diz.

Ainda sobre agricultura, Silveira afirma que eles (haitianos) não têm noção de organização, de estratégia de plantação, produção, competitividade, tudo isso em decorrência da falta de estrutura, da desorganização e da miséria, que é dominante na região.

“O que pensamos e estamos projetando para ajudar o Haiti é um programa que alie segurança alimentar e organização da produção para trabalhar a estratégia de fortalecimento da agricultura familiar e o serviço de extensão rural, além de pensarmos uma estratégia de comercialização da produção, a exemplo de programas brasileiros como o PAA (Programa de Aquisição de Alimento) e outros”, destaca Reginaldo.

Um mundo caótico
Correndo os riscos de infecção e várias outras enfermidades causadas pela falta de higiene notável em todos os produtos alimentares ofertados nas feiras livres e nos restaurantes populares do Haiti, o engenheiro lembra que conhece vários países pobres, inclusive da África, mas nunca havia se deparado com tamanha precariedade.

“Nesse caso, não há como aproveitar o país para passeios. Você está lá com uma missão de tentar ajudar aquelas pessoas. Tudo lá é precário. O sistema agrícola, escolar, de saúde e há uma disparidade muito alta entre as classes pobres e ricas. Tudo me deixava triste quando eu via as condições de vida daquelas famílias”, retrata ele.

Régis também se mostrou comovido com o sistema de ensino público no Haiti. Segundo ele, devido a carência de escolas e material didático, uma família de 4 filhos deve escolher 1 para ser contemplado com uma vaga. Não há vaga para todos, e os pais devem se conformar com isso.

“Nós pretendemos criar um projeto piloto de alimentação nas escolas através de cantinas e um sistema de armazenamento de produção visando com isso fortalecer a agricultura. Esse trabalho é necessário e emergencial porque eles vivem com fome e chegam a produzir bolinhos de argila para se alimentar”, destaca.

O acreano frisa que o fato dos haitianos terem sido vítimas por anos da ditadura o tráfico de drogas, eles vivem em guerra civil permanentemente. “É um povo muito sofrido. É tanto que eles temem até o mar. Eles não têm contato com o mar por entender que o mar traz muitas desgraças para eles, isso sem contar que as belas praias existentes por lá são privadas e para ter acesso a elas o preço é em média U$ 35,00”.

“Eles precisam de nós”
Perguntado pela reportagem se ele pretende continuar  a missão, Régis disse: “eu preciso voltar porque eles precisam do Brasil, precisam de nós. Eles precisam de ajuda”.
Para concluir, ele ressalta que o Brasil é um país de primeiro mundo e um paraíso se comparado ao Haiti. “Sabemos que no nosso país há muita desigualdade social, como em vários outros. Mas, ver e viver no Haiti é lastimável. O único conforto que senti enquanto estive lá foi o de ver que mesmo nas condições miseráveis em que eles vivem, ainda é possível ver o sorriso no rosto de muitas pessoas. Choca-me a condição humana deles, mas me surpreende a força que existe no sorriso dos haitianos”.

 

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