Inicialmente, deixo claro que não estou aqui pra defender “marginal” ou “bandido”, como assim o povo denomina os presos.
Após engolir a seco inúmeros episódios ocorridos no sistema prisional acreano e aparatos policiais do Estado do Acre, não deu mais pra degustar essa. Na edição de domingo/segunda (02.01.2010) de A GAZETA a manchete de capa é: Iapen diz que padrasto que estuprou e matou a enteada em Sena Madureira se suicida dentro do presídio “Antonio Amaro”. Entretanto, o IML declara que a causa da morte foi traumatismo craniano, em decorrência de um enorme corte encontrado no couro cabeludo e marcas de espancamento. Está lá no jornal, não com essas palavras, claro.
É importante frisar que o preso não caiu de nenhum penhasco, logo, alguém fez aquilo. Como fizeram com outros presos, p. ex. no caso do Moisés, estuprador e assassino da menina Jéssica – que se suicidou de joelhos dobrados, justamente na hora em que faltou energia -, dentre outras barbaridades em que se apressam pra dizer que foi suicídio quando os próprios laudos oficiais dizem o contrário.
Não quero aqui julgar antecipadamente ninguém, mas essas barbaridades, chamadas de “suicídios” recorrentes, já que a nossa Lei Maior não prevê pena de morte, têm que acabar, sob pena de vermos o retorno da Lei de Talião, a famosa do “dente por dente e olho por olho”. A Idade Média já passou.
Caros leitores, não vivemos mais sob o império de uma Ditadura não, durante a qual o jornalista (Vladimir Herzog) também se “suicidou”, dentre inúmeros outros. Alguém tem que fazer alguma coisa. É o Estado que se responsabilizou para guardar e proteger o preso, até o seu julgamento, que está permitindo que tais fatos horrendos ocorram no sistema prisional. Por exemplo, a família do Martiniano não se conforma até hoje com o seu “suicídio”. Também é dever do Estado evitar o suicídio.
Ademais, isso tem uma enorme conta além da humana, social e cultural, que é a econômica. E somos nós, toda a população do Estado do Acre, quem vai pagar pelos delitos e desmandos dos seus servidores públicos, quer sejam dolosos ou culposos. E essa conta é muito cara, são milhões de reais em condenações que poderão advir dos processos de indenização por danos materiais e morais, movidos pelas famílias dos mortos no sistema prisional ou delegacias ou quartéis etc. Essa conta eu não desejo pagar, por isso exijo desde já a sua extinção.
Eu, como cidadão acreano e Agente, também, do Estado conclamo a todas as autoridades competentes e sociedade civil organizada a exigir o devido esclarecimento dessas “cartas marcadas”, e a punição exemplar de todos os envolvidos, tudo de acordo com as Leis vigentes deste país. Do contrário, vamos ter que nos conformar também quando inocentes estiverem tomando esse mesmo caminho nefasto. E não podemos reclamar de que somos um Estado primitivo.
* Afonso Braña Muniz
é juiz de Direito