“Toda expressão formal e sensível da personalidade de um homem é imagem para o Direito. A idéia de imagem não se restringe, portanto, à representação do aspecto visual da pessoa pela arte da pintura, da escultura, do desenho, da fotografia, da figuração caricata ou decorativa, da reprodução em manequins e máscaras”. O entendimento do Desembargador paulista Walter Moraes concorreu para decisão inédita na 1ª Vara da Fazenda Pública, cuja titular é a Juíza de Direito Maria Penha Nascimento, relativa ao direito à imagem.
A ação de indenização por dano material resultou em condenação do Estado do Acre e do Município de Rio Branco por uso indevido de imagem em publicidade oficial. Dessa forma, a juíza julgou procedente o pedido, condenando os réus ao pagamento de R$ 6.000 para cada autora, a ser acrescido de correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e juros de mora de 12% ao ano.
O caso
Trata-se de pedido ajuizado por Derdela da Silva Lima (mãe), Melissa da Silva Araújo, Michele da Silva Araújo e Miréa da Silva Araújo (filhas). Em 2008, Derdela Lima foi abordada em sua residência por servidores do Estado e do Município, que estavam vistoriando e fotografando obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Um deles teria se oferecido para fotografar a família da autora, com a promessa de que, tão logo fosse relevado o filme, entregaria de presente.
Para surpresa das requerentes, ao serem convocadas para participar de reunião na Associação de Moradores do bairro Palheiral, se depararam com sua fotografia estampada em um convite do Governo do Estado do Acre e do Município de Rio Branco (veja abaixo o conteúdo do informe publicitário).
“O governador Binho Marques e o prefeito Raimundo Angelim convidam para a Solenidade de Lançamento das Ações Sociais, Saneamento Ambiental, Habitação e Urbanização nas Zonas de Atendimento Prioritário ZAP. Um importante investimento do Governo do Estado e Prefeitura de Rio Branco para levar cidadania aos moradores da região que compreende os bairros Chico Mendes, Palheiral – Igarapé Maternidade, Conquista, Igarapé Fundo e Santa Inês, com apoio do Governo Federal, através do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC.”
De acordo com os autos (processo nº 001.08.018791-0), o fato causou gozação por parte dos presentes, revolta, constrangimento, angústia e tristeza às autoras que, em momento algum, autorizaram a divulgação de sua imagem, utilizada em um convite distribuído em toda cidade.
Em sua defesa, tanto o Estado do Acre quanto o Município de Rio Branco alegaram que o funcionário foi autorizado pela família a tirar a fotografia, a qual não foi utilizada para fins ilícitos, mas sim informativos e enaltecedores da sociedade. No entanto, a magistrada entendeu que o cerne da questão não é a autorização ou não da fotografia, mas sim se ela foi utilizada para malferir o direito à imagem, o que de fato ocorreu.
A sentença
Segundo a sentença (veja aqui na íntegra), as autoras aparecem em publicidade oficial como pessoas carentes que seriam beneficiárias de obras executadas para levar cidadania a moradores de regiões deficitárias de políticas públicas.
Nesse caso, houve exploração dos aspectos fisionômicos, como também dos atributos sociais das autoras, de modo desautorizada. Além disso, houve ampla divulgação dessa imagem, na medida em que o convite indica como local do evento o Teatro Plácido de Castro, prédio com capacidade para centenas de pessoas.
A Juíza Maria Penha destacou a importância do caráter pedagógico da decisão. “A indenização fixada tem a finalidade de reparar o dano à imagem e punir o infrator, servindo a decisão, ademais, como meio de educação para o exercício e o respeito aos direitos, esclarecendo as pessoas sobre a proteção constitucional de sua imagem, notadamente quando violada pelo próprio ente estatal; este, a exemplo das instituições privadas, deve ficar atento para que seus atos não violem a imagem de particulares, protegida, repita-se, constitucionalmente”, explicou.
A decisão está fundamentada no art. 5º, incisos V, X e XXVIII da Constituição Federal, os quais asseguram que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Maria Penha reforça sua decisão, com as palavras de Walter Moraes: “… a imagem é obviamente inalienável, intransferível, inexpropriável, irrenunciável, porque tudo isso significa privação de um bem essencial”. (Agência TJ/AC)