Cerca de 500 pessoas participaram da vernissage da artista plástica Christina Oiticica, ontem, em Estocolmo, na Suécia. A mostra Amazônia traz na sua essência o espírito acreano. Os quadros foram enterrados em 2004, em vá-rios lugares do Juruá, onde permaneceram durante quase dois anos. “Quis mostrar a força da natureza interferindo na minha obra”, conta a artista brasileira, casada com o escritor Paulo Coelho.
Christina, que atualmente mora entre Paris, na França, e Genebra, na Suíça, explica por que resolveu levar os quadros ao Acre. “Quis realizar essa mostra porque um curador da Eslovênia sugeriu que fizesse algo sobre a Amazônia por ser um tema que desperta grande interesse ao público europeu. Mas tinha a consciência de que teria que me preparar para a empreitada. Para penetrar na floresta amazônica é preciso pedir permissão. Mas com a ajuda de amigos consegui passar 15 dias conhecendo lugares incríveis na floresta onde enterrei as telas. Quando fomos buscá-los, entre as 18 que deixei na terra, só havia perdido uma devido à cheia do Rio Môa. As marcas da terra, as raízes, as folhas impregnaram os traços e as formas se ajustaram numa composição mágica”, entusiasma-se.
Durante a exposição Amazônia, que fica até o final de maio, no Hotel Diplomat, em Estocolmo, um vídeo sobre os métodos utilizados no processo da obra está sendo mostrado. Cenas dos rios Moa e Juruá se misturam a personagens cotidianos da vida da região interiorana do Acre. Um dos pontos altos é o laboratório de pintura que Christina fez com as mulheres katuquinas, no Rio Campinas. Nas aldeias da etnia, a artista distribuiu pincéis e tintas e as índias foram trabalhando cima das telas. “A interferência dos traços delas deram um colorido especial aos quadros. A pureza e a espontaneidade na convivência com as katuquinas é algo que jamais vou esquecer. Mas um pouco desse amor desse povo da floresta está nas telas que tenho mostrado em muitos lugares do mundo”, diz ela.
Na verdade o processo de deixar a natureza interferir na sua obra começou no final dos anos 90. “Estava pintando, em San Martin, nos Pirineus franceses, quando uma folha trazida pelo vento caiu em cima da tela. Num primeiro momento fiquei muito estressada porque a folha colou na tela e poderia estragar a pintura. Aquilo parecia um problema porque o meu estúdio estava cercado de árvores. Mas depois refletindo melhor deduzi que a natureza é poderosa e pode interferir em qualquer coisa. Resolvi aprofundar a experiência de interferência da natureza na minha obra enterrando meus quadros em lugares significativos. Nos Pirineus, no Caminho de Santiago, na Amazônia e no Japão”, revela a artista que irá, em breve, fazer uma experiência similar em Xangai, na China.
Festa badalada
Durante a abertura da exposição Amazônia suecos e brasileiros puderam apreciar com curiosidade o trabalho de Christina. Personalidades célebres como o cirurgião plástico Ivo Pintanguy, o escritor e acadêmico da Academia Brasileira de Letras, Arnaldo Niskier, o presidente da Fundação Gilberto Freyre, Gilberto Freyre Neto, o advogado, neto de Miguel Arraes, Antonio Campos, o presidente da Wolkswagen, Antonio Cortes, entre outros deram um tom especial de celebração a mostra.
A acreana Tereza Lund-gruen, que mora há 14 anos em Estocolmo, também compareceu à vernissage. Ela ficou visivelmente emocionada ao ver os quadros e o vídeo com fortes referências as terras Ayquiri. “A gente tem que se adaptar ao lugar onde vivemos. Muitos brasileiros vêm morar na Europa e ficam vivendo de memórias dos lugares de onde vieram. Eu não sou assim, mas tenho muito orgulho de ser do Acre. Me adaptei a vida na Suécia e fico muito feliz em poder ver uma mostra artística tão importante como essa com tantas referências a minha terra”, disse ela, numa noite em que os termômetros marcavam 8 graus negativos na capital sueca.