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Agonia da água

Tens um tempinho para ou vir minha história? Meu nome é igarapé, entre tantos sou um dos caçulas do Rio Acre, mas, ainda sem nome. Se bem que eu poderia me chamar “Águas do Campo”.  Eu, ainda criança, vejam o que fizeram comigo?  Uma maldade que até hoje ecoa nos palcos da pecuária, a perder de vista em seus campos. Corro num leito pouco raso e estreito, rodeado por uma rala gramínea marcada por pegadas de animais.

Minha água percorre cambaleando num leito sinuoso, e sobre o qual repousa um fundo irregular. Derribaram a mata ci-liar que protegia meu leito e a minha água, que antes era cristalina. Agora, assisto as margens desmoronar nos declives ladeirentos sobre meu leito, causado pela ação dos processos erosivos, em terra morta. Eu, Águas do Campo, habito apenas  o passado perdido entre as recordações e o tempo que não vivi. Implorei, chorei por muitos dias que me deixassem viver, crescer e produzir os frutos e flores do teu jardim, foi inútil. Não fui ouvido, nem mesmo,  por aqueles que deverim proteger o meio ambiente e a água da vida.

Meu triste e solitário grito de dor, infelizmente não repercutiu suficientemente para abrir as grossas e encoraçadas paredes que cercam os defensores dos ecossistemas aquáticos. Na cauda do meu grito, escrevi uma carta regada à lágrimas para dizer que me deixaram “nú”, sem uma árvore, um arbusto qualquer. Meu leito solitário foi abandonado às intemperes: o sol, a chuva e ao vento; o pisoteio do gado, ao derrame de substâncias poluidoras, tantos males!

Ainda assim, vejo passar sobre minhas margens, caravanas de ambientalistas com discursos aguçados, bem na ponta da língua, mas que se dissipa entre a intenção e a prática ambiental. Enquanto isso, Eu, o igarapé, faço tudo para que entendam, que minha vida, ainda respira por um fio.

Antes, quando meu leito e as margens eram protegidos pelas florestas nativa, havia água em abundância, variadas espécie de peixes, animais, pássaros e abelhas vivendo em harmonia, os homens me chamavam de ecossistema aquático. Agora, ocultam-me no eterno silêncio da incompreensão e da razão. 

 

 

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