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Governo usará mercado de carbono para evitar ‘pecuarização’ da BR-364

O Palácio Rio Branco terá no futuro mercado de carbono sua principal aposta para evitar que as margens da Rodovia BR-364, sentido Cruzeiro do Sul, sofram o mesmo processo de “pecuarização” pelo qual passaram todas as áreas localizadas ao longo das estradas na Amazônia. Até hoje pouco impactada pelo agronegócio por conta do isolamento, essa região do Acre tende a seguir o mesmo modelo de desenvolvimento das décadas passadas, caso nenhuma política diferenciada seja aplicada.

E é essa a proposta do PSA-Carbono. A sigla inicial tem por significado Pagamento por Serviços Ambientais.  Em consulta popular desde setembro do ano passado, o projeto é uma das partes da política de valorização ambiental do governo, que tem como foco premiar os produtores rurais que substituam os tradicionais métodos de cultivo e adotem práticas sustentáveis.

O PSA-Carbono tem definido seis áreas prioritárias consideradas de risco elevado de desmatamento. Mais de 80% delas estão às margens da BR-364, que tem previsão de pavimentação concluída até o final do ano que vem. “Essas são áreas de criticidade de desmatamento caso não haja governança”, diz o secretário Eufram Amaral (Meio Ambiente).

Para ele, se não houver políticas específicas para a região, não restam dúvidas de que o Vale do Purus e do Juruá terão destinos semelhantes ao do Alto e Baixo Acre, que, juntos, concentram 72% de todo o desmatamento do Estado. Para que a pecuária não se expanda rumo à outra ponta do território, o governo terá que oferecer alternativas rentáveis às famílias que hoje vivem às margens da rodovia.

O objetivo é usar as atuais áreas já desmatadas para manter e incrementar a pequena agricultura com novas tecnologias, e usar a floresta como uma fonte de matéria-prima que pode resultar em lucros para os produtores. É a chamada atividade agroflorestal. De acordo com Amaral, não haverá a abertura de ramais nas propriedades para evitar o avanço da agropecuária.

É a partir dessa relação entre o aproveitamento da área de plantio (sem precisar novos desmates) com a retirada sustentável de bens florestais que entrará o mercado de carbono. “Se o agricultor não desmata, não queima e não polui rios ou igarapés, ele reduz suas emissões de gases poluentes e retém o carbono”, ressalta o secretário. “Os agricultores vão ser cultivadores de carbono, ou a ‘carbonocultura’”. 

Amaral dá outro exemplo: “suponhamos que se de um hectare de floresta que deixa de ser desmatado eu reter 100 toneladas de CO2 (dióxido de carbono), então o produtor pode ‘comercializar’ essa quantia”. Essa prática é um dos princípios do REDD (Redução de Emissão por Desmatamento e Degradação). “Pode-se colocar essa redução no mercado e ter crédito de carbono”.

Mas esse mercado verde ainda emperra na falta de um sistema regulatório. Atualmente, o crédito de carbono é adotado por grandes empresas ou governos de países desenvolvidos interessados em “indenizar” o Planeta por suas práticas poluentes outrora. O Acre poderá ser competitivo não somente pela diminuição de suas emissões, como pelo estoque de carbono proporcio-nado pela cobertura florestal que chega a 88% do território.

O Estado já prepara seu marco legal para entrar no mercado de carbono mundial. A implementação do PSA-Carbono nas seis áreas prioritárias terá um custo total de R$ 485 milhões. O governo espera ter os recursos a partir de colaborações de Brasília, de países desenvolvidos e de multinacionais interessadas no investimento.

Os frutos financeiros do carbono   
As seis áreas prioritárias dessa fase inicial do projeto somam 5,8 milhões de hectares. Elas correspondem por 50% das faixas de terra classificadas como de alto e extremo risco de desmatamento pelos próximos 10 anos. Caso as políticas para a região sejam bem-sucedidas, mais de 62 milhões de toneladas de CO2 deixarão de ser liberados na atmosfera até 2020, somente nessas áreas.

Estudos realizados por especialistas da Ufac (Universidade Federal do Acre) trazem uma estimativa de o estoque médio de carbono por hectare naquela região do Estado seja de 123 toneladas. Já a concentração de CO2 é de 451 toneladas.

Em todo o Acre, espera-se que a redução das emissões chegue a 133 milhões de CO2 nessa década. Tendo como referência a atual cotação da tonelada de carbono no mercado (US$ 5) o governo estima receber mais de US$ 300 milhões, ou pouco mais de R$ 600 milhões. Esse valor é referente só as seis áreas prioritárias do PSA-Carbono.

Como explica Eufram Amaral, esses recursos nem sempre vão chegar ao produtor em espécie. O objetivo é fomentar toda a cadeia econômica da atividade agroflorestal para garantir a competitividade do Acre nesse futuro lucrativo e atrativo mercado mundial de carbono. “Esse dinheiro poderá chegar em forma de assistência técnica, compra de maquinários, compra antecipada e mudas para alternar o cultivo ou reflorestamento”, diz o secretário.

Após seis meses de consultas públicas, o PSA-Carbono agora precisa passar pelos trâmites burocráticos para efetivamente sair do papel.  O primeiro passo é elaborar o marco regulatório estadual. Para aferir e garantir as reais reduções acreanas, o Estado contará com uma instituição independente: a Fundação Getúlio Vargas. A proposta, segundo Amaral, é que até o final do ano as primeiras negociações de carbono sejam realizadas na Bolsa de Valores de São Paulo e de Chicago (EUA). .

 

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