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Psiquiatra cobra Hospital de Custódia no Acre

Em entrevista À GAZETA esta semana, o diretor do Hospital de Saúde Mental do Acre (Hosmac), médico psiquiatra José Rosa Paulino, voltou a defender a implantação de um Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico – uma espécie de hospital-presídio – para receber e tratar os indivíduos com transtornos mentais que cometem crimes e são submetidos à medida de segurança de internação.

O psiquiatra utiliza seus vastos conhecimentos na área para tentar provocar uma mudança nesse sentido.

José Rosa Paulino é natural de Juiz de Fora, Minas Gerais, mas está no Acre há 28 anos, 16 dos quais dedicados ao Hosmac. É titulado pela Associação Brasileira de Psiquiatria e um dos responsáveis pelos grandes avanços que a saúde mental vem apresentando no Estado.

Para ele, apesar do esforço de toda equipe, o Hosmac não está preparado para atender pessoas que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não conseguem compreender o caráter ilícito do crime. Por isso, aos olhos da lei são inimputáveis, recebendo tratamento diverso dos criminosos com perfeita saúde mental.  

“O Hospital de Custódia não está proibido nem banido do sistema. Em Porto Alegre ele existe, também existe no Rio de Janeiro e na maioria das cidades brasileiras”, salienta o psiquiatra em atenção ao que estabelece a Lei de Execuções Penais (LEP).

Por esse dispositivo legal, o Hospital de Custódia se equipara em matéria de cuidados e cautelas contra a fuga, ao regime fechado. O que não se pode esperar do superlotado Hosmac.

Suas dependências, além dos indispensáveis equipamentos e medicamentos, devem possuir salas próprias para segurar os internos, principalmente os de periculosidade elevada em virtude das suas condições psíquicas.

A unidade de ‘cela’ deve ser salubre e ter área mínima de seis metros quadrados. O que não se pode esperar do Hosmac, projetado para atender os doentes mentais oriundos de todo o Estado.

“O ideal é que o Hospital de Custódia fosse implantado e tivesse uma equipe multidisciplinar com psiquiatra forense específico”, reforça Paulino. Ele salienta ainda que a Reforma Psiquiatra, produzida por força da Lei 10.216/2001, estabelece que o paciente seja tratado num ambiente adequado à sua condição.

“Se é um paciente que apresenta surto psicótico, hospital psiquiátrico; se o problema não se relaciona à saúde mental, ambulatório ou Centro de Atenção Psicossocial; se foi submetido à medida de segurança de internação, Hospital de Custódia”, exemplifica.

Atualmente, existem no Estado do Acre apenas seis médicos psiquiatras, sendo que apenas um deles é especialista forense e outro está parcialmente impossibilitado de exercer suas funções por força de um acidente que o deixou tetraplégico. Dos seis, um está lotado no município de Cruzeiro do Sul e os demais na Capital.

Dificuldade de diagnóstico favorece psicopatas, alerta médico
A pedido de A GAZETA, Rosa Paulino também fornece esclarecimentos acerca de um assunto bastante discutido na atualidade: o psicopata, indivíduo que apresenta um Transtorno de Personalidade, que se caracteriza por total ausência de sentimento de culpa, de arrependimento ou de remorso pelo que faz de errado.

“São personalidades que sofrem com sua anomalia ou que fazem sofrer a sociedade. Não tem nada a ver com loucura”, esclarece o médico.

Segundo ele, em decorrência da dificuldade de diagnóstico – que ao contrário da doença mental não pode ser definido através de simples exames clínicos – o psicopata acaba passando despercebido, só sendo descoberto após uma série de crimes.

Ele cita como exemplo um cidadão que foi internado no Hosmac a pedido da mãe porque estava com uma idéia fixa de matar a mulher. Internado, tratado e liberado procurou a polícia, o Juizado Especial e a Defensoria Pública e conseguiu convencer a todos que tinha sido internado de forma compulsória e por causa disso não conseguia arrumar emprego.

“Ele conseguiu abrir um processo contra o hospital e fui chamado a todos esses lugares para dar explicações. A história que ele contou era tão convincente, que acreditaram nele. Meses depois, ele encontrou uma enfermeira do Hosmac num local onde trabalhava como pintor e a ameaçou com uma faca, dizendo que ia matá-la caso contasse a alguém que ele tinha passagem pelo Hosmac”, conta o médico.

De acordo com Paulino, diferente do doente mental, que não tem noção do que está fazendo, o psicopata é frio, calculista, mentiroso e dissimulado. Sua principal característica é a indiferença. Muitos são violentos e só visam o interesse próprio.

Estão infiltrados em todos os meios sociais e quando lhe convém dão uma de loucos, apesar de saberem exatamente o que estão fazendo.

Para reconhecê-los é necessário muito conhecimento e sensibilidade, o que faz com que eles transitem normalmente por aí.

Apesar de o transtorno se manifestar geralmente na adolescência ou na terceira década de vida, entre os 20 e 30 anos, o médico observa que alguns indícios podem ser dados ainda na infância.

O exemplo clássico é o da criança que estraçalha o bichinho de estimação sem qualquer sentimento de culpa e ainda se diverte com isso.

A psicopatia é hereditária, portanto, se transmite de pai para filho, mas pode ser agravada em ambiente desfavorável, ambiente familiar desestruturado, condições econômicas desfavoráveis. Não tem cura, mas pode melhorar com o tempo.

A medicina, segundo o médico, ainda não evoluiu em relação ao tema e faltam remédios no mercado para tratar as pessoas que sofrem desse transtorno.
 
LEGISLAÇÃO OMISSA
– A legislação brasileira é omissão em relação aos psicopatas, se referindo expressamente apenas aos doentes mentais, muito embora aqueles não sejam débeis e tampouco apresentem sofrimento emocional.

Isso permite que um psicopata condenado e que não recebeu diagnóstico cumpra prisão misturado com criminosos recuperáveis.

Como esse tipo de indivíduo não aprende com erros passados, punição ou método de ressorcialização, voltará a apresentar os mesmos riscos à sociedade quando deixar a cadeia. 

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