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“Homem, doente de si mesmo”

Neste artigo dou continuidade às minhas meditações, indagando a mim mesmo, das causas de tantas misérias na vida dos homens, enquanto ente. Hoje me volto para os reais motivos dessa “competição” entre os povos, entre as nações e entre o meu próximo e eu, mesmo aquele mais próximo, nas mínimas coisas. Por quê?

Thomas Hobbes (1588-1679), empirista inglês, tentou explicar o comportamento dos homens, ao afirmar que os mesmos tendiam naturalmente para o prazer, bem como para comportamentos egoístas que visavam sujeitar os outros.  Esse tipo de atitude, segundo Hobbes, transformava os homens em “lobos uns dos outros”. Essa atitude, também, era o fator responsável pelas  guerras e pelos conflitos, situações prejudiciais a todos. Para Hobbes, essa porfia não tem cunho de irracio-nalidade, já que as criaturas irracionais são incapazes de distinguir entre injuria e dano, entre ter e não ter. Às criaturas irracionais, basta que estejam satisfeitas para nunca se ofenderem, ou criarem disputas, com seus semelhantes. Os apetites das formigas, por exemplo, são todos conformes e levam a um bem comum que em nada difere de seu bem particular. Já os homens, se encontram por natureza num estado de guerra universal em razão das paixões que os dominam. Assim essa guerra não passa pelos animais irracionais, é uma pugna própria de quem pensa, de quem cogita, diria René Descartes. 

Mas, por que esse negócio de ganhar e perder; ser o melhor e o mais destacado, em alguma atividade existencial, mesmo nas disputas esportivas? Essa é uma interrogação de  inculcar a mais prevenida das mentes humanas. Trata-se de uma competição desgraçada: no esporte; na ciência propriamente dita, nos meios eclesiásticos, na escola e, até, na família entre irmãos de sangue. No entanto, é na política que essa desonestidade, com bafo de perversidade, se agiganta em seu grau mais elevado. É aqui, nessa atividade pública que essa atitude extremamente egoísta e desonesta, produto da busca desenfreada do homem pelo poder (prazer) e realização pessoal desmedidos, nem que para isso tenha que esfolar, nessa corrida louca, o seu semelhante, se faz presente de forma aguda; aliás, já diziam os antigos, bom político é aquele que vende a própria mãe para se eleger. É um estado de guerra que faz com que os homens se movam  pelo desejo de adquirir bens, poder e prestígio (Hobbes). É a destruição do homem pelo homem, que no dizer de Nietzsche (Genealogia da Moral), é a maior e mais inquietante de todas as doenças, da qual a humanidade ainda hoje não está curada, o homem, doença do homem, doente de si mesmo.

Contudo, que o homem deve fazer para sair dessa encruzilhada macabra em que está metido? Desse estado totalmente insuportável, diz Hobbes, os homens só podem sair por meio da reflexão sobre sua miséria, usando a razão para construir um Estado, corpo artificial destinado a garantir  a segurança de todos.

A propósito a filosofia antiga (Cinismo) nos diz que nem a posse das riquezas, nem a abundância das coisas, nem a obtenção de cargos ou o poder produzem a felicidade e a bem-aventurança; produzem-na a ausência de dores, a moderação nos afetos e a disposição de espírito que se mantenha nos limites impostos pela natureza (Epicuro).

Procede, também, o alerta para as empresas lobbystas de quaisquer níveis, que estão aí para desenvolverem batalhas de mercado, comandam “esquemas de fraudes” entre outras atividades ilícitas, numa competição que só cheira a roubalheira.

Do mesmo modo, talvez de forma mais aviltante, os partidos políticos, quase sem exceção, deste mundo pós-moderno, com  linha “ideológica” extremamente pragmática, pois que seus mais dignos representantes, loucos por poder e protegidos pela memória curta do povão, têm corroborado, notadamente, pela parceria promíscua com algumas empresas, com essa porfia desonesta, fomentando rivalidade entre as siglas, na busca desenfreada pelo poder, uma vez que são presas fáceis da cooptação advinda do mandatário mor.

Por tudo que temos visto, lido e ouvido na atual corrida ao poder público, mesmo debaixo dos rigores da Justiça Eleitoral,  só nos resta parafrasear Michel Onfray: “Em face dessa realidade doentia, a salvação passa pela revolta”.

* Francisco Assis dos Santos é professor e pesquisador  bibliográfico em Filosofia e Ciências da Religião.E-mail: assisprof@yahoo.com.br

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