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Ministério Público no interior: suas dificuldades e conquistas

O Ministério Público teve seu primeiro conceito criado em 1609, ainda no período colo-nial brasileiro, mas ganhou seu atual status na Constituição de 1988. Nestes 22 anos, os promotores de Justiça vêm desempenhando a principal função, a de fiscalizar o cumprimento da lei, garantir a plena igualdade – principalmente dos menos favorecidos -, e, entre muitas outras, zelar pelos direitos da sociedade.
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No interior do Acre, a situa-ção difere bem da Capital, onde cada setor (Meio Ambiente, Infância e Juventude, Crime Organizado, e outros) tem sua Promotoria de Justiça específica. Em determinadas situações, o promotor de Justiça chega a ser responsável por todas as áreas de atuação do órgão, por falta de membros no município. Esta é apenas uma das muitas dificuldades de um Estado pobre em um país de dimensões continentais.

A situação do Ministério Público vem melhorando ao longo dos anos, entretanto é preciso ainda uma longa jornada para, por exemplo, cada comarca acreana ter o número de promotores de Justiça ideal. Em alguns casos, o promotor de Justiça precisa atuar em dois municípios, tendo em vista que o quadro reduzido de membros inviabiliza a presença contínua do Ministério Público nas comarcas mais isoladas. Algumas vezes influenciada pelo baixo índice populacional ou outros fatores.

Nestes casos específicos, estes membros do Parquet se transformam em profissionais itinerantes. Precisando se deslocar de um município para outro, fazendo plantões periodicamente, tudo para que a sociedade não fique sem um representante legal, sem a proteção que lhe é devida.

Atualmente, o Acre tem 20 promotores de Justiça no interior. Em algumas regiões, o promotor de Justiça é responsável por dois municípios.

Em recente pesquisa, o Ministério Público foi o 4º órgão de maior credibilidade, atrás apenas da Polícia Federal, Forças Armadas e Corpo de Bombeiros. Coincidência ou não três órgãos que, para a sociedade, servem para a segurança dela. A confiança no trabalho desenvolvido pelo MP o deixou à frente da Imprensa, Governo Federal, Assembléia, Câmara, políticos, Procon, entre outros.

Em um dos municípios de maior dificuldade, influenciada principalmente pela falta de estrutura e certo desinteresse do Poder Executivo local, é em Manoel Urbano. Ruas esburacadas, sistema de coleta de lixo caótico, lixão em área urbana e sem qualquer cuidado, entre outros problemas colocam o promotor de Justiça, Flávio Busabe, a um verdadeiro desdobramento para “provocar” as autoridades competentes para a sociedade não ficar privada de seus direitos básicos. “O promotor mo-rando na Comarca sente os problemas de perto… de toda ordem. Seja do lixo, do abatedouro, de menores (abuso sexual) e outras, muitas outras”, afirmou Flávio.

Antes sem promotor de Justiça, a Comarca ganhou o primeiro no dia 3 de outubro de 2009, juntamente com outros municípios, através do concurso público promovido pela Procuradoria-Geral da Justiça, efetivando 22 novos membros do Parquet. Cada um desses novos promotores de Justiça precisa exercer a profissão por dois anos para, então, serem realmente efetivados no quadro do MP, mas o certo é que todos chegaram querendo mostrar trabalho.

 Ampac realiza visitas no interior para conhecer melhor a realidade dos associados
Porter8O Ministério Público do Estado do Acre, na gestão do Procurador-Geral, Sammy Barbosa, efetivou 22 novos promotores de Justiça, a maioria deles no interior. Esta atitude do MP promoveu a celeridade de processos e direitos da sociedade em vários municípios.

Todos os novos Promotores de Justiça filiaram-se à sua associação, no caso a Ampac – Associação do Ministério Público do Estado do Acre – atualmente presidida pelo promotor de Justiça, Ricardo Coelho de Carvalho. Na sua campanha para o triênio do mandato, Ricardo garantiu que iria conhecer in loco a realidade de cada um deles e é o que vem fazendo nos últimos dois meses, tendo passado por Plácido de Castro, Xapuri, Senador Guiomard, Sena Madureira, Manoel Urbano, Tarauacá, Feijó e ontem foi a vez de Brasiléia e Epitaciolândia. Resta apenas Cruzeiro do Sul, o que deve ocorrer no começo do ano.

“É importante ir ao encontro de nossos colegas associados, visitar, trocar experiên-cias, sugestões, para que possamos ter uma dimensão de como melhor servir as causas institucionais e associativas à frente da Presidência da Ampac”, ressalta o promotor.

Caso haja em alguma Comarca a necessidade de intervenção da Ampac para contribuir com o associado, Dr. Ricardo Coelho ressaltou que a entidade fará sua obrigação. “Diante das reivindicações, das situações que necessitem de uma ação interventiva, tanto da Ampac, do Conselho Deliberativo da Fempac, bem como da Procuradoria-Geral de Justiça, nós iremos fazer gestões e executar as ações no sentido de tentar adequar as atividades destes órgãos, conforme o caso, às necessidades levantadas com os nossos membros no interior”, garante.

Defesa dos direitos da sociedade em pauta
Em várias comarcas, os promotores de Justiça atuam para influenciar na execução das polícias públicas pelas autoridades executivas locais ou mesmo externas do município no intuito de melhorar a qualidade de vida. Um desses casos pode ser notado em Xapuri, cartão postal acreano, simbolizando a defesa ao meio ambiente, porém é comum a saída dos moradores para continuar os estudos em outras cidades.

Diana Soraia Pimentel, promotora de Justiça local vem negociando com a Universidade Federal do Acre para abrir turmas diariamente e não semanal, como vem ocorrendo. “O que temos em Xapuri é um Curso Modular à Distância e nem mesmo é à noite, nem diário, apenas semanal. Para ter uma graduação a sociedade tem que sair do município e ir para Brasiléia”, lamenta, enfatizando que existe até mesmo um abaixo assinado no sentido de trazer cursos.

A Promotoria de Justiça também vem trabalhando para que algumas áreas recebam o projeto federal Luz Para Todos, pois existem colocações que tiveram apenas partes das residências com energia (Ramal do Pimenteira e do Bosque, entre outros), melhorar o atendimento na área de saúde e exigir material necessário neste setor, melhorar o atendimento no banco local. “Também venho conversando com a Dra. Alessandra (Garcia Marques), na área do Direito do Consumidor, pois o interior precisa melhorar muito”, concluiu.

Rios ligando sociedades isoladas à Justiça
A esperança para milhares de acrea-nos é que o asfaltamento das BR’s possa melhorar o isolamento de várias comunidades e até mesmo cidades. No período de chuvas, justamente a que estamos, o principal elo de ligação de várias comunidades com as cidades são os rios ou no lombo de um animal, demorando dias para chegar nas “colocações”.

O promotor de Justiça de Feijó, Bernardo Fiterman Albano, pretende firmar uma parceria com o Judiciário e levar a Justiça até o povo, ou seja, subir o rio para realizar os trabalhos dificultados pela precariedade de acesso. “Neste período de inverno temos uma grande dificuldade para intimar pessoas, vítimas e testemunhas para comparecer, por isso resolvemos inverter, levando esse projeto piloto, com as audiências, para os seringais”, explicou Bernardo.

A intenção do promotor de Justiça é esperar o rio subir um pouco mais para começar os trabalhos pelas comunidades do Paraná do Ouro, um dia subindo o Rio Envira. “Vamos chegar num ponto estratégico e realizar as audiências neste local. Isso vai trazer uma celeridade na aplicação da lei nos locais mais distantes”, disse o Promotor de Justiça, lembrando que Feijó tem em torno de 40 mil habitantes, grande parte fora da zona urbana.

Segundo Bernardo, a idéia surgiu principalmente pela dificuldade que o Oficial de Justiça tinha para se deslocar para intimar as partes envolvidas. “Quando o Oficial alegava ‘dificuldade de acesso’, nós tentávamos mais uma vez via rádio, que muitas vezes acabava também frustrada”, disse. “Se o Estado não consegue chegar nesses locais para intimar essa pessoa, eu não tenho como cobrar que ela se desloque para cá”, lamenta.

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Preservação do jovem é prioridade no MP
Uma preocupação que se nota nas Promotorias de Justiça do interior é o cuidado com o menor, seja como infrator ou como vítima. Essas mesmas promotorias de justiça vem trabalhando para que o número de delitos, que vem aumentando nos últimos anos, possam diminuir.
Em Manoel Urbano, o promotor de Justiça local vem recebendo denúncias de abusos de menores. “O abuso de menores, entre outros problemas, estão sendo averiguados e estão sendo investigados”, disse Flávio Bussab. “O mais importante é que estamos tomando conhecimento através das denúncias da própria sociedade, ou seja, ela está envolvida na solução deste problema”, ressalta.

Durante a visita da reportagem, foi detectada a presença de um “lixão” dentro do perímetro urbano. Gases, sem saber com exatidão qual o perigo que representava para os transeuntes, surgiam constantemente entre um monte e outro. “São várias frentes que temos que trabalhar, mas já chamamos as autoridades locais para tratar deste assunto também”, disse.

Em Feijó, o Promotor de Justiça enfatiza que a Infância e Juventude local é um grande problema, tanto na qualidade de vítima, quanto na qualidade de infrator. “É preciso monitorar o menor depois que ele sai do Centro Sócio Educativo, pois geralmente ele retorna para o meio ambiente que gerou aquela transgressão, por isso estamos fazendo esse controle”, explicou Bernardo.

Para Nicole Gonzales e Elia-ne Kinishita, promotoras de Tarauacá, o trabalho com os menores está sendo acompanhado principalmente no “berço da sociedade”, nas escolas. As duas Promotoras de Justiça fazem um trabalho de acompanhamento da presença dos estudantes nos colégios, contando com a colaboração dos diretores e professores, conseguindo aumentar a presença nas salas de aulas.

“Estamos fazendo blitz à noite para verificação de venda de bebida para menores, fizemos reuniões com diretores de escolas, estamos acompanhando a presença dos estudantes nas salas de aulas e quando isso não ocorre fazemos um convite para os pais, no intuito de uma orientação da necessidade da freqüência das crianças e adolescentes às escolas e da responsabilidade deles”, afirmou Nicole, sobre o trabalho que vem realizando com Eliane.

Mudanças também foram sentidas na chegada da promotora de Justiça de Xapuri, Diana Pimentel. “Faltava escola pública para o ensino fundamental. Alguns alunos andavam 4h para chegar na escola, alguns não estudavam, pois não tinha sequência de série para os alunos e isso é direito das crianças, mas estamos conversando com a (secretaria) Educação e existe um projeto específico para os alunos”, citou.

Opção de lazer – O que se percebe é a total falta de opção de lazer para os adolescentes de Manoel Urbano. Por esse motivo é que a juíza Cenise Mota Cardoso, juntamente com vários órgãos, entre eles a Promotoria de Justiça, pretende reativar um galpão do Centro Cultural do Governo e promover cinema para os jovens da comunidade.

“Nosso primeiro alvo são os adolescentes de 12 a 18 anos, claro que também iremos prestigiar as crianças, mas tudo passo a passo”, disse Cenise. As sessões, iniciando todos os sábados, serão de filmes brasileiros, até mesmo pela maior facilidade de adquirir seus direitos de reprodução nas salas de cinema.

Aplicação no trabalho
Em algumas comarcas ou municípios é comum um Promotor (a) de Justiça acumular áreas em mais de uma localidade. Exemplo disso é a promotora de Acrelândia, Dulce Helena de Freitas, responsável por algumas áreas – Infância e Juventude, Eleitoral, Cível, Criminal – e entre elas a de Meio Ambiente, respondendo pelo Alto Acre.

“A maior dificuldade é que as vezes choca um pouco essas pautas de audiência, sendo preciso a colaboração dos outros colegas para auxiliar”, confessa a promotora. O Alto Acre corresponde a Capixaba, Xapuri, Brasiléia, Assis Brasil, além de Epitaciolândia. “Pela área de Meio Ambiente preciso ficar me deslocando bastante para outras comarcas”, concluiu.

A promotora de Justiça de Sena Madureira, Vanessa Muniz, a exemplo de vários outros do cargo, compartilha da dificuldade de deslocamento, pois responde também pelo município de Santa Rosa.

A sociedade tem “fé” nas atitudes dos Promotores de Justiça
Considerado um dos órgãos de maior credibilidade, muitas vezes o Ministério Público tem suas funções confundidas pela sociedade.

“Muitas vezes é caso de polícia, mas como existe o controle externo da atividade policial por nossa parte, o cidadão vêem ao MP dizendo que por aqui é mais rápido”, ressalta a Promotora de Justiça Criminal de Senador Guiomard, Laura Cristina de Almeida Miranda.

E a promotora conclui: “a sociedade deve esperar do MP uma instituição que preze muito pela população, lute por seus direitos, afinal o MP forte é uma sociedade forte, onde o MP não é atuante, é tolhido, quem sofre com isso é a sociedade”.

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