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Às vésperas de deixar governo, Binho avalia gestão e comemora a aprovação de 62%

Prestes a completar seus quatro anos à frente de um governo, que ele define com a marca “com todos e para todos”, Binho Marques avalia, nesta entrevista exclusiva À GAZETA, as principais estratégias e ações de sua gestão. O que foi planejado, onde o governo conseguiu chegar e ainda o que deixou de ser concretizado. O governador também analisa falhas pes-soais e de equipe, fala sobre equívocos seus, da imprensa e da sociedade sobre o seu modo de gerir e de agir e, numa autocrítica honesta e tranqüila, aponta o que poderia ter feito diferente. Binho deixa o governo com aprovação popular de 62%, segundo pesquisa Ibope divulgada esta semana.
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Binho Marques: Desafios e ações de um Governo para todos
TEXTOS:
  MAÍRA MARTINELLO  E SILVÂNIA PINHEIRO
FOTOS: SÉRGIO VALE
DIAGRAMAÇÃO: DIM
Ele discorre com facilidade sobre estatísticas, padrões, planejamento e estratégias e logo deixa explícita a sua habilida de técnica para gerenciar normas e tarefas, delegar poderes e colocar em prática metodologias e sistemas. Basta pouco tempo de conversa com o governador do Acre, Binho Marques, para identificar o perfil de um gestor rigoroso, com enorme capacidade intelectual e uma “quase obsessão” por encontrar uma razão, uma lógica de funcionamento para tudo. 

Sempre discreto, tímido (por autodefinição) e, inicialmente, até avesso a entrevistas e aparições públicas, Binho também deixa claro, de cara, a dificuldade que tem de se fazer compreender, falha que ele próprio admite: “Eu não me comunico muito bem, tenho essa fragilidade.(…) Acho que não fui um bom garoto propaganda do meu governo”, avalia.

A feição, à primeira vista, fria, distante ou pouco simpática se torna, contudo, incoerente com o que se vê e o que se ouve ao longo de uma conversa um pouco mais demorada com o governador do Acre. O sorriso e os gestos continuam contidos e o tom de voz, baixo e quase sempre no mesmo compasso, mas o olhar de Binho é emotivo, e o conteúdo da sua fala, passional, ao descrever cada ação, cada conquista e mesmo os próprios erros, nestes últimos quatro anos à frente do Governo do Estado.

Em diversos momentos, o pragmatismo do competente gestor, com títulos de pós-graduação, MBA e mestrado concedidos por conceituadas instituições do país, perde lugar para as utopias de um jovem moldado pelos ideais libertários de justiça e solidariedade, que começou a vida política no movimento estudantil, filiado ao Partido Revolucionário Comunista, e, pouco mais tarde, uniu-se a Chico Mendes para levar educação fundamental a famílias de seringueiros no interior do Acre.

Em meio à descrição e à quantificação de dados técnicos, números e feitos do Governo, Binho expõe sempre as teorias, mais do que isso, as ideologias, inspirações e motivações dele e deste grupo que permanece à frente do Estado, há 12 anos.

“Todos nós viemos do movimento social e, para mim, o que há de mais importante é que guardamos os mesmos sonhos daquela época. Mudamos na forma, não acreditamos no mesmo modo de fazer algumas coisas. Por exemplo: eu participei de organizações clandestinas, não acreditava em Deus, acreditava na luta armada… Hoje, acredito em Deus e não acredito na luta armada. Mas já acreditava na construção de uma sociedade justa. Como diria Caetano, ‘a gente sempre quis muito, mesmo que parecêssemos ser modestos’. Queríamos e, com toda certeza, ainda queremos mais. Muito é muito pouco”, teoriza.

Impossível conhecer melhor o Binho e não se admirar (mesmo que você não concorde) com suas fortes convicções de luta e transformação social e com seus projetos de inclusão e desenvolvimento econômico sustentável. Nitidamente, ele crê no que fala e no que faz e, sim, acredita que conseguiu cumprir o desafio de dar continuidade ao projeto popular representado pelo Governo da Floresta.

Prestes a completar seus quatro anos à frente de um Governo, que ele define com a marca “com todos e para todos”, Binho Marques avalia, nesta entrevista exclusiva À GAZETA, as principais estratégias e ações de sua gestão. O que foi planejado, onde conseguiu chegar e ainda o que deixou de ser concretizado. O governador também analisa falhas pessoais e de equipe, fala sobre equívocos seus, da imprensa e da sociedade sobre o seu modo de gerir e de agir e, numa autocrítica honesta e tranqüila, aponta o que poderia ter feito diferente. Confira nas páginas seguintes.

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PERFIL
Nome completo:
Arnóbio Marques de Almeida Júnior

Idade: 48 anos, completados dia 29 de outubro.

Em família: Filho do engenheiro agronômo Arnóbio Marques de Almeida e da professora Clélia Fecury Marques de Almeida. É casado há 21 anos com a jornalista Simony Maria Malveira D´Avila. Tem dois filhos: Gabriel Fecury DÁvila Almeida e Maria Clara DÁvila Almeida.

Formação acadêmica: Graduado em História pela Universidade Federal do Acre, com MBA em Formação Geral e Desenvolvimento de Executivos em Administração obtido na Universidade Corporativa Banco do Brasil/FIA da Universidade de São Paulo e Mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Principais funções: Após concluir o curso de graduação na Ufac, iniciou um trabalho com Chico Mendes nos Seringais de Xapuri, através do Projeto Seringueiro, um grande projeto de educação, saúde e desenvolvimento econômico comunitário, que chegou a administrar uma rede alternativa de 40 escolas, 12 postos de saúde e a cooperativa agroextrativista de Xapuri. Todo esse trabalho foi realizado pelo Centro dos Trabalhadores da Amazônia – CTA, do qual foi presidente por quatro anos. Trabalhou dois anos com a CESE, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço, que financia projetos sociais de organizações da sociedade civil no Brasil inteiro, com prioridade para o Norte e Nordeste. Foi secretário de educação de Rio Branco na gestão Jorge Viana e consultor do Unicef para assessorar secretários de educação das capitais da Amazônia. Foi secretário de Estado de Educação nos oito anos no Governo Jorge Viana, sendo que, nos últimos quatro anos, acumulou as funções de vice-governador e secretário de Desenvolvimento Humano e Inclusão Social.  Foi eleito governador do Acre para o mandato 2007-2010.

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‘Acre, o melhor lugar para se viver na Amazônia’
Logo no início do mandato, Binho Marques se lançou ao desafio de fazer do Acre o melhor lugar para se viver na Amazônia até 2010, visando consolidar o projeto iniciado em 1999 por Jorge Viana. Sua visão de futuro foi repetida inúmeras vezes, quase como um mantra, durante toda a gestão, e recriminada ou incompreendida, em outras tantas, por seus críticos, opositores e, em alguns momentos, também pela população.

Mas, para Binho, o Acre é sim, hoje, o melhor lugar para se viver na Amazônia. E ele justifica por que:

“Para mim, o Acre o melhor pra se viver seria o Acre com a capacidade de garantir serviços básicos para todos, com qualidade e as melhores oportunidades de investimento, numa economia de base florestal sustentável e com maior distribuição de renda e maior participação de todos. E eu acredito que nós cumprimos essa missão. Hoje, nós temos sistemas de Educação, de Saúde e de Segurança que me permitem dizer isso. Porque conseguimos realmente montar um sistema em funcionamento em cada uma dessas áreas. Isso não significa dizer que não temos problemas. Temos muito. Mas conseguimos preparar as unidades públicas para cumprir seus objetivos. Do ponto de vista da gestão, posso afirmar que o Acre tem hoje uma condição diferente dos outros Estados do país”, defende.

87% dos acreanos estão satisfeitos em morar no Acre, diz Ibope
Neste mês de dezembro, o Governo encomendou uma pesquisa quantitativa junto ao Ibope, com o objetivo de fazer um balanço dos quatro anos de gestão. Os resultados, de muitas formas, confirmam a opinião do governador, uma vez que apontam o alto grau de satisfação dos acreanos com o lugar em que vivem.

De acordo com a pesquisa, 62% dos entrevistados consideram a gestão de Binho ótima e boa – com uma avaliação ainda maior no Vale do Juruá, enquanto 30% a consideram regular.  52% dos entrevistados atribuíram notas entre 8 e 10 ao Governo – também com destaque para os moradores do Vale do Juruá  – e  20% deram nota 7.

Sobre o nível de satisfação dos acreanos com sua vida e com o Estado onde moram, os números também são animadores para Binho:  87% das pessoas estão satisfeitas / muito satisfeitas com sua vida atual, e 77% dos entrevistados avaliam que a situação do Acre melhorou desde que Binho Marques assumiu o Governo. Apenas 18% consideram que o Estado ficou igual.

A aprovação do governador coloca Binho Marques no patamar dos governadores mais bem avaliados do País:  77% dos pesquisados aprovam a maneira como ele administrou o Acre.

Para 70% dos acreanos, Binho inspira confiança; 43% consideram que ele cumpriu tudo / a maioria do que prometeu na campanha eleitoral, enquanto 44% avaliam que ele cumpriu parte do prometido.

De acordo com o Ibope, Binho é querido por 74% da população, numa proporção relativamente igual em todo o Estado (um pouco mais em Rio Branco) e admirado por 41% dos pesquisados – com certo destaque na faixa etária 25-29 anos; inspira simpatia em 35% e esperança em 33%.

Entre as características que o descrevem, destacam-se: inteligência (39%), competência (33%), sendo que 32% o consideram um homem trabalhador e com boas idéias.
Para os entrevistados, a Educação é a área na qual o Governo tem seu melhor desempenho.  Esta é a opinião de 49% dos entrevistados – considerados os três primeiros lugares nas preferências – com destaque significativo no Vale do Juruá onde alcança 77% das menções.

A Saúde ainda foi considerada a área de maior desafio para o Estado: 44% dos entrevistados consideram o setor na qual a população enfrenta os maiores problemas.  33% identificam nessa área o pior desempenho do Governo.

Segundo as pesquisas qualitativas, as queixas concentram-se no atendimento, seja nas postos de saúde (municípios), na demora para marcação de consultas e exames na Fundhacre e na demora para atendimento, entrega de exames laboratoriais e número insuficientes de médicos nas UPAs.

Por outro lado, as pesquisas indicam que a população de Rio Branco reconhece positivamente o investimento e a estruturação que vêm sendo feitos no sistema de saúde pública e tem ótima avaliação das UPAs, feitas as ressalvas no atendimento.

“Com todos e para todos”, causa simples, porém complexa
O Governo da Floresta, como ficou conhecido nesse período de 12 anos, teve como missão criar as bases para uma economia de baixo carbono e de alta inclusão social. Ao terceiro Governo, o de Binho, coube consolidar este processo, direcionando as ações para uma gestão mais ‘cirúrgica’, refinada, focada em três eixos: garantir os serviços básicos de qualidade para todos; consolidar as bases de uma economia florestal limpa, justa e competitiva; e empoderar as comunidades, promovendo as múltiplas possibilidades de autogoverno.

A tradução do discurso é muito simples e, para quem conhece um pouco da trajetória política de Binho, não poderia ser diferente: a prioridade foi colocar o cidadão no centro das ações, subordinar o poder ao interesse público, de modo a garantir serviços básicos de qualidade para todos.

Em outras palavras: concentrar esforços naquilo que é essencial para garantir a equidade. O princípio justificava o slogan “com todos e para todos”. Essa era, para ele, a responsabilidade direta e maior do seu Governo.

Na visão administrativa do governador, não existe desenvolvimento se não existirem as condições básicas de sobrevivência para a população. “Eu acredito que o desenvolvimento econômico acontece se os serviços básicos forem assegurados, principalmente a educação, que, para mim, é o motor da economia. O que está acontecendo no Acre é que não estamos esperando explodir uma economia de grande PIB para depois garantir os serviços básicos às comunidades. Precisamos, primeiro, garantir os serviços básicos para que a população não somente assista esse crescimento, mas também faça parte dele”, reforça Binho.

Desafios
O ousado projeto de executar oito anos de Governo em quatro, “com todos e para todos”, exigiu um padrão de planejamento rigoroso, sem espaço para pausas ou improvisos. A causa era simples, mas a concretização, complexa.

Binho explica que exigiu de si mesmo e de sua equipe as competências de planejamento estratégico, disciplina, compromisso ético e rigor técnico, o que, para alguns, principalmente, no início, pode ter forjado a imagem de um Governo centralizador. A necessidade de fazer muito, e em todas as áreas, também pode ter dificultado o entendimento do projeto. Mas, para ele, era preciso fazer, renovar.

“Planejamos ações grandiosas e profundos e foi preciso foco e determinação para conseguir finalizá-los. Então, muitas vezes, ‘no meio do caminho’, fomos alvo de críticas e reclamações, mas não podíamos ‘arredar o pé’, desviar do nosso foco. Era preciso vencer a tempestade e continuar no mesmo rumo, porque sempre soubemos aonde iríamos chegar. Como em outras épocas de nossas vidas, exercemos a ‘paciência histórica’ para seguir em frente e saber que os resultados iriam aparecer. Como estão aparecendo agora”, destaca o governador.

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VEJA MAIS DETALHES DA PESQUISA IBOPE
 Educação é a área na qual o governo tem seu melhor desempenho
* Esta é a opinião de 49% dos entrevistados – considerados os três primeiros lugares nas preferências – com destaque significativo no Vale do Juruá onde alcança 77% das menções.

* Segurança Pública, Calçamento e Pavimentação de Ruas e Estradas concentram entre 22% e 30% das menções

* Saúde, Moradia e Cultura recebem entre 13% e 17% das menções

Saúde permanece como o principal desafio para o Estado: 44% dos entrevistados consideram a área na qual a população enfrenta os maiores problemas

*  33% dos entrevistados identificam nessa área o pior desempenho do governo
 
*  Entre as demais áreas apresentadas (18 no total), os problemas aparecem dispersos com menções entre 0 e 5 %), exceto  Drogas (10%), Emprego (9%) e Segurança Pública (7%).  

  Realizações por áreas: lembranças espontâneas

* Na educação a valorização dos professores é o aspecto mais lembrado, com 33% das menções

*  Informatização das escolas (destaque em Rio Branco), projeto Poronga, reforma e construção de escolas (destaque no Juruá) recebem entre 21 a 25% das menções

* UPA é o destaque da Saúde com 41% das menções

* Os hospitais do Câncer, do Juruá e a Maternidade Bárbara Heliodora têm 23% das menções e o SAMU é lembrado por 18%

*  Na Segurança Pública, é o aumento do efetivo que recebe mais menções (31%)

*   Compra de novas viaturas equipamentos: 27%

* Maior policiamento: nas ruas (26%) e nos bairros (23%) – destaque para Juruá, com + de 10 pontos de diferença da média

*   Formação de policiais: 21%

*  Compra do helicóptero e ação territorial: 14% e 11%, respectivamente
 
  Realizações do Governo: lembrança estimulada

*   BR-364 é a obra maior número de menções: 56% e as pontes recebem 45% das menções, com destaque para moradores do Vale do Juruá (77% e 66%)

*   A 4ª ponte é lembrada por 66% dos moradores de Rio Branco (45% no Estado)

*   Construção da Biblioteca Pública: 27% (RB)

*   Reconstrução da Fundhacre: 17% (RB)

*   Urbanização das avenidas Ceará e Pernambuco: 12% (RB)

*   Asfaltamento dos ramais é mencionado por 14% dos habitantes dos Vales do Acre e do Juruá

*   Obras de urbanização, construção de parques e pavimentação de ruas recebem de 10% a 12% das menções

Reforma na Gestão
No complexo processo de descentralizar, agilizar, padronizar e automatizar, o Governo realizou uma sofisticada reforma da gestão no Estado, que culminou, entre outras ações, com o projeto Floresta Digital, o novo portal do Governo, a inauguração das primeiras Centrais de Serviço Público e a disponibilização de totens de auto-atendimento e interatividade do cidadão com o Governo.

Além da modernização do atendimento ao público, foi desenvolvido o Sistema de Monitoramento – SIM -, possibilitando o acompanhamento da execução físico-financeira de todas as ações da administração em tempo real. É possível obter informações precisas sobre o andamento de cada obra e projeto, assim como é capaz de oferecer uma visão do todo, com montagem de relatórios e gráficos, além de um sistema de alerta para eventuais atrasos nos cronogramas de execução.

O Estado investiu alto em tecnologia, modernização e desenvolvimento de sistemas, e agora começa a colher os frutos, como o Acre-compras, que tornou o Estado uma referência na gestão, especialmente quando o assunto é economia, agilidade, transparência e qualidade nas compras públicas.

Secretariado com autonomia
A grande autonomia dada à equipe de secretários, por vezes criticada pela oposição e mesmo por aliados políticos, foi, para Binho, uma das medidas imprescindíveis para garantir a execução mais ágil e eficiente dos planos e obras propostos pelo Governo.

Na sua gestão, os secretários ficaram mais fortalecidos para resolver diretamente as demandas de suas pastas e, conseqüentemente, das comunidades, com menos dependência da agenda e dos despachos do governador.

“O secretário não precisava me pedir autorização para executar alguma coisa. Ele tinha autonomia para fazer, mas, se fizesse errado, iria arcar com as conseqüências. Nenhum secretário teria perdão se agisse de maneira errada, tanto é que eu nunca tive medo de demitir secretários. Eu avalio que a gente só conseguiu fazer tanta coisa porque os secretários tiveram essa autonomia”, analisa Binho.

Sobre as críticas à escolha do secretariado, o governador sai em defesa do grupo e assume as responsabilidades pelas falhas.

“Desde criança, eu sou atento aos governos, às escolhas das pessoas para ocupar cargos de gestão. E eu acho que essa é a melhor equipe que o Acre já teve. Isso não significa que não tenhamos cometido falhas. Cometemos muitas, mas é uma equipe muito preparada. Eu tive liberdade pra escolher cada secretário e sou muito grato aos partidos da Frente porque não tive pressão para isso. Então, os erros que a equipe cometeu foram culpa minha porque fui eu que os escolhi. Algumas pessoas eu não encontrei antes. Essa equipe que finaliza, infelizmente, não foi a mesma equipe que começou. Se eu tivesse tido mais tempo, tenho certeza de que a gente teria feito muito mais”, avalia.

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“Fizemos um Governo de oito anos em quatro”, comemora Binho
Ao final destes quatro  anos, talvez ainda seja cedo para mensurar os impactos da gestão de Binho Marques sobre a história política, social e econômica do Acre. Apesar de o Governo ter se proposto, desde o início, à missão principal aparentemente simples – de garantir o “básico para todos” ­-, o modo de fazer e de conduzir o projeto foi sempre muito complexo, tendo em vista os desafios impostos por um Estado pobre como o Acre, ainda sem condições de atender aos anseios de todos.

Continuar e, mais do que isso, renovar o forte projeto popular de Governo de Jorge Viana, com inúmeras realizações e aprovação altíssima da população, foi, sem dúvida, uma grande responsabilidade para Binho Marques.

Próprio de seu estilo discreto, mas dinâmico, Binho trabalhou ativamente, mas um pouco que silenciosamente, nos mais diversos campos sociais, econômicos e culturais do Estado, de modo a garantir o funcionamento sistêmico de todos os setores.

“Fomos um Governo que tinha que fazer de tudo. Por isso, é um governo difícil de se traduzir e de se entender. Costuma-se rotular os governos como aquele da estrada, o outro da Educação, mas o nosso, embora não tenha tido uma única marca, é uma síntese dos demais da Frente Popular do Acre. Atuamos em todas as áreas. Tivemos que fazer de tudo, para todos”, analisa ele.

Ao final destes quatro anos, a forma e o conteúdo dos planos e ações do Governo Binho começam a aparecer com mais clareza para a população, mas, de fato, pode ser que os resultados práticos e mais profundos só possam ser bem sentidos e avaliados com o decorrer do tempo.

Neste final de mandato não dá para negar, entretanto, que os números, dados e projetos finalizados apontam para muitos feitos, por vezes, surpreendentes.

Na soma de 12 anos de Governo da Frente Popular do Acre (FPA), o Acre contabiliza cerca de R$ 5,5 bilhões de investimentos.  Deste total, mais de R$ 3,5 bilhões foram captados e investidos nos últimos quatro anos. Binho não apenas deu continuidade a uma política ousada de captação de recursos iniciada por Jorge Viana, como encerra seu Governo comemorando um dos mais expressivos crescimentos no PIB per capita do Acre, que se posiciona entre os Estados que mais cresceram na Amazônia. O alto valor dos investimentos é facilmente representado no volume de obras e projetos entregues pelo governador.

“Todas essas obras podem passar a impressão de que o nosso Governo se preocupou mais com a infraestrutura. Mas o nosso maior investimento foi nas pessoas. Mantivemos os altos investimentos na Educação e ainda multiplicamos por três os investimentos na Saúde e por quatro os investimentos na Segurança”, reforça ele.
Confira, a seguir, alguns dos destaques da gestão de Binho.

SAÚDE
A Saúde é apontada, na pesquisa Ibope, como um dos gargalos do Governo. As queixas concentram-se no atendimento  nos postos de saúde (municípios), na demora para marcação de consultas e exames na Fundhacre e na demora para atendimento, entrega de exames laboratoriais e número insuficientes de médicos nas UPAs.

Binho reconhece que muito ainda há de ser concretizado, mas destaca um conjunto de ações que, somadas, possibilitou uma reforma em todo o sistema de Saúde do Acre, que criou as bases para uma nova etapa a ser consolidada pelo Governo de Tião Viana.

As obras de construção, adequação e reformas de hospitais, centros de saúde e Unidades de Pronto Atendimento, como as UPAs do Tucumã e do Segundo Distrito, foram as bases para a estruturação do novo modelo. Com a entrada em funcionamento do novo Hospital das Clínicas, na antiga Fundação Hospitalar; a conclusão do Hospital de Urgência Emergência de Rio Branco e do Instituto de Trauma-ortopedia; e com a finalização dos hospitais regionais de Tarauacá, Assis Brasil, Senador Guiomard e o Hospital Materno Infantil de Cruzeiro do Sul, o governador afirma que Acre terá um sistema de saúde integrado e pronto para um atendimento de qualidade aos cidadãos.

SEGURANÇA
Após o enfrentamento do Esquadrão da Morte pelo Governo de Jorge Viana, coube ao Governo de Binho a tarefa de modelar e colocar em prática um sistema de segurança integrado e inteligente, que pudesse responder aos novos desafios de um Acre mais populoso, com fronteiras abertas e com a herança de uma geração que nasceu num tempo em que faltavam escolas e sobravam as opções de marginalidade.

Binho enfrentou muitas críticas neste setor, durante toda a gestão, muitas delas realmente fundamentadas nos reflexos de crimes bárbaros que o Estado vivenciou nos últimos anos. O governador concorda que o Acre vive uma época de problemas e muitos desafios e que, inevitavelmente, tornou-se porta de entrada de armas e drogas devido à tríplice fronteira.

Ele rebate, entretanto, as afirmações de que o Estado vive o seu pior momento na Segurança, relatando estatísticas: “Atualmente, o Sistema de Segurança do Acre tem um dos índices mais elevados de elucidação de crimes – 85% para casos de homicídio. O Acre também é o Estado que mais prende. Proporcionalmente, temos a maior população carcerária do país. Agora que começamos a colher os frutos do investimento na Educação, das políticas sociais, da geração de emprego e renda, da habitação e das ZAPs, esperamos ter fechado a torneira do crime para as próximas gerações”, idealiza.

O aprimoramento da política de combate ao crime e proteção à vida exigiu fortes investimentos em aparelhamento e pessoal, mas principalmente, profundas mudanças na gestão e na cultura das instituições da área de Segurança. Obras, equipamentos, quantidade e qualidade de pessoal, tudo foi meticulosamente estudado, definido e executado dentro da capacidade do Estado, de modo a estruturar um sistema de segurança integrado e inteligente.

EDUCAÇÃO
Em praticamente todos os discursos e projetos de Binho, a Educação parece sempre ser citada com mais realce e paixão do que as demais áreas. E, mesmo sem se dar conta, o governador deixa claro por que: “Para mim, a Educação é o motor da nova economia que queremos, é a vanguarda da nova sociedade”, defende.

Em seu Governo, não poderia ser diferente. Binho deu continuidade ao projeto desenvolvido como secretário de Educação de Jorge Viana e garantiu atenção especial à área, construindo e reformando inúmeras escolas, contratando e investindo na formação de professores da rede pública e, mais do que isso, integrando iniciativas que garantissem a fusão da educação escolar, desenvolvimento e resgate cultural e comunicação.

A Floresta Digital, um dos mais audaciosos projetos do Governo, fez do Acre um lugar onde o acesso à internet é direito básico. O programa, que garante internet livre em todas as cidades do Acre, abre um universo infinito de possibilidades, sobretudo, para as novas gerações.

Entre outras conquistas, o Governo Binho comemora o reordenamento da rede de escolas e a construção e reforma de instituições de ensino em todos os municípios, dentro de um padrão definido para cada modalidade e nível escolar. Em um único ano, foram construídas mais de 100 salas de aula para colocar todas as crianças de seis anos na escola, de uma só vez.

Em 2008, o Acre foi o 1º colocado no País em inclusão de alunos especiais nas salas de aula comuns. Entre outras medidas de destaque, a gestão escolar e as escolas também passaram a gerenciar recursos com autonomia a partir de seus próprios planos.

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INFRAESTRUTURA
Binho Marques levou à risca o slogan “com todos e para todos” e realizou grandes mudanças estruturais no aspecto urbano e de infraestrutura da cidade. O número é surpreendente: 845 obras relevantes.

Novos hospitais, praças, escolas, delegacias, postos e aeroportos, sedes de secretarias, estádio de futebol, mercados, centros sócioeducativos, pelotões florestais, centros de educação especiais e permanentes, silos graneleiros, bibliotecas públicas, pontes, avenidas, alargamento de ruas, pistas de pouso, centros de estudo, além da revitalização de prédios históricos, como o Casarão e o Cine Teatro Recreio.

Neste hall de construções, constam ainda a o Complexo Viário de Rio Branco – Av. Amadeo Barbosa, a 4ª ponte e a pavimentação da tão sonhada BR-364, interligando definitivamente os vales do Acre e Juruá.

Embora o inverno rigoroso de 2009 tenha adiado a entrega da obra (que era prevista para o final de 2010), a conclusão da estrada, que tira do isolamento milhares de famílias acreanas, está garantida, já que todas as pontes estão praticamente prontas, e a pavimentação de todos os seus trechos está 90% concluída. Em 2011, cabe ao futuro governador Tião Viana tratar da conclusão dos 10% restantes, realizando um sonho que, há décadas, a população acreana anseia ver concretizado.

Ainda na Infraestrutura, o Governo Binho executou o maior programa de habitação do Acre, com a construção de 10 mil casas populares. Ao concluir seu mandato, Binho terá entregue mais de 2.500 casas e deixará em construção mais 7.500 moradias.

O Governo também se dedicou muito às obras de urbanização, como a Zona de Atendimento Prioritário (ZAP) Chico Mendes – ZAP 1 – uma região de Rio Branco que teve início com ocupações irregulares. Sua área central era um fundo de vale divisor de bacias, onde o esgoto corria a céu aberto. Mas, com organização comunitária e “ferramentas” de inclusão social, se transformou em conjuntos habitacionais, do Programa Minha Morada, e o Parque Urbano Vale do Açaí, símbolo dos grandes investimentos que alicerçam e consolidam o conceito de ZAP naquela área. A urbanização do parque de 1,4 quilômetro beneficia, hoje, diretamente 20,5 mil pessoas.

Com apoio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Governo rasgou ruas, construiu estações de tratamento de água e esgoto, cavou poços e distribuiu caixas d’água para tornar o saneamento básico em uma realidade de todos.

PRODUÇÃO E ECONOMIA
O Governo Binho investiu fortemente na modernização e ampliação da produção, com destaque para a consolidação das fábricas de processamento de madeira, a indústria de preservativos instalada em Xapuri – que já fornece 100 milhões de unidades/ano para o Ministério da Saúde -, a indústria de abate de aves – que já abastece o mercado local com 12 toneladas de frango por dia – e as agroindústrias para a produção familiar espalhadas em todo o Estado.

Dentro da visão de uma economia sustentável, limpa, justa e competitiva, Binho deu ainda um passo importante no sentido de inserir o Acre no promissor mercado de carbono e remuneração por serviços ambientais.

Ao participar da Conferência do Clima em Copenhagen, o Acre marcou posição na agenda mundial de Meio Ambiente, sendo o único Estado do Brasil que aprovou e sancionou uma Lei de criação do SISA, um objeto da cooperação assinado com os estados da Califórnia, nos Estados Unidos e de Chiapas, no México.

“O Acre é atrativo porque tem um marco regulatório invejável, tem um zoneamento ecológico e econômico que orienta o investidor nos mínimos detalhes, seja para se fixar numa região mais propícia à indústria de base florestal, seja para a exploração da agroindústria. E a criação da Zona de Processamento para a Exportação – ZPE, sem dúvida, traz um elemento a mais de atratividade para os investidores”, analisa o governador.

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‘Eu gostaria de ter tido tempo para conversar mais’
Técnico ou político, pragmático ou utópico, libertário ou autoritário, tímido ou antipático… O governador do Acre, Binho Marques, como qualquer outro governante, foi, muitas vezes, alvo de críticas por parte da imprensa, do funcionalismo público, da população, da oposição e até mesmo de seus aliados políticos, durante os últimos quatro anos.

Poucas vezes, entretanto, pareceu se preocupar em desmentir ou esclarecer qualquer tipo de classificação a sua personalidade ou ao seu modo de conduzir as ações de Governo. A impressão que dava é que Binho não fazia realmente questão de ser visto como o personagem principal de sua administração. Preferia o papel de ator coadjuvante, o que nem sempre é bem compreendido numa sociedade com o hábito de exaltar a vaidade e as conquistas individuais de seus líderes. A figura, de certo modo, pouco carismática do governador talvez tenha, de fato, contribuído para criar uma espécie de “muro” entre tudo que foi realizado no Governo (e os números e obras apontam, sem dúvida, para grandes feitos) e o que foi dito e divulgado.

Binho reconhece a falha: “Não é porque sou humilde, não. Sou vaidoso como todo mundo. O problema é que eu não tenho jeito pra comunicação”. Na opinião do governador, essa pode ser apontada como a principal “carência” da sua gestão. “Uma falha mais minha”, ele faz questão de dizer. “Eu não me comunico muito bem, tenho essa fragilidade”.
Confira os principais trechos da entrevista:

A GAZETA – Na sua visão, quais as principais conquistas do seu Governo?
BINHO MARQUES
– Como governador, lancei-me ao desafio de fazer um governo menor e uma sociedade maior, mais fortalecida. Ao mesmo tempo, fazer um Governo de oito anos em quatro, com serviços público de qualidade para todos; economia de base florestal limpa, justa e competitiva; e maior empoderamento comunitário, com descentralização do poder e das ações do Estado. Graças a Deus, chego ao final do meu mandato com absoluta certeza de que avançamos em todas as dimensões, com resultados expressivos em todas as áreas.

Nosso Governo aprofundou as mudanças iniciadas por Jorge Viana, realizou milhares de pequenas obras e intensificou as ações nas grandes obras estruturantes. Ousamos criar e iniciar o maior programa habitacional do Estado, com a construção de 10 mil casas para quem mais precisa; construímos, ampliamos e reformamos todas as instalações da Saúde, Educação e Segurança; investimos forte na modernização e ampliação da produção. Sem contar os imensos investimentos em obras de infraestrutura, como as ações do PAC e as obras de urbanização em Rio Branco, Cruzeiro do Sul e na maioria dos municípios. Também foi no nosso Governo que as obras da BR-364 mais avançaram.

Entregaremos todas as pontes praticamente prontas e a pavimentação com pelo menos 90% concluída, restando cerca de 10% para o governador Tião Viana finalizar em 2011.
Todas essas obras podem passar a impressão de que o nosso Governo se preocupou mais com a infraestrutura. Mas o nosso maior investimento foi nas pessoas. Mantivemos os altos investimentos na Educação e ainda multiplicamos por três os investimentos na Saúde e por quatro os investimentos na Segurança.

O que posso dizer é que sou imensamente feliz por todos os resultados que conquistamos nesses quatro anos. Os números das realizações não deixam dúvidas de que conseguimos dar conta de realizar um Governo de oito anos em quatro.

AGAZETA – O senhor consegue definir uma “marca” para este Governo?
BINHO MARQUES
– Acho difícil definir uma única marca, porque nosso Governo tem muitas marcas. No Brasil, os Governos costumam ser caracterizados pela bola da vez. Estabelecem uma prioridade e focam somente naquele objetivo. Acredito que fomos um Governo equilibrado, tanto do ponto de vista financeiro e institucional quanto do ponto de vista de ter conseguido dar atenção a todas as áreas simultaneamente. Demos tratamento justo aos municípios e procuramos desenvolver políticas de Estado que terão continuidades e serão aprofundadas nas futuras administrações. Talvez, se tivesse que sintetizar todas as ações do nosso Governo numa única marca, acho que optaria por algo como um Governo que trabalhou com todos e para todos, com equilíbrio e responsabilidade fiscal e social, preparando as bases para o Acre do futuro.

A GAZETA – E o que o senhor considera a principal falha da sua gestão?
BINHO MARQUES
– Foi a falta de conversa. Uma falha mais minha porque eu tenho esse problema de comunicação. Eu não me comunico muito bem, tenho essa fragilidade. Acho que essa foi a grande falta do meu Governo. A gente teve excessos de muitas coisas boas, muitas realizações, e carências de outras, claro. E eu acho que essa falta de comunicação foi a minha grande carência.

A GAZETA – Faltou conversa com quem? Com a mídia, com a população, com a equipe?
BINHO MARQUES
– Acredito que, principalmente, com a população. Um dos nossos principais focos era promover um Governo que valorizasse a liberdade, a democracia, a participação popular, mas alguns projetos chegaram prontos e acabados para população. Essa é a autocrítica que eu faço. Apesar dos grandes esforços e recursos investidos para fazer o melhor, não deu tempo de dialogar tanto com as comunidades. E quando a gente conversa, o projeto fica muito melhor. Nosso Governo tinha a proposta de realizar oito anos em quatro. E o volume de obras mostra isso. Por outro lado, esse volume de realizações nos fez ser um Governo apressado. A gente fica feliz porque fez muita obra, mas reconheço que fizemos de maneira apressada.  Então, eu gostaria de ter tido tempo para conversar mais.

A GAZETA – Na sua visão, quais serão os grandes desafios de Tião Viana? Que conselho você daria ele?
BINHO MARQUES
– Cada gestão tem seus próprios desafios, que são específicos daquele momento. O Jorge Viana pegou o Estado destruído, com os setores todos falidos e o empresariado impossibilitado sequer de disputar uma licitação. Oito anos depois, peguei o Estado infinitamente melhor, mas com outros desafios que a gente teve que enfrentar com coragem e ousadia, resultando no Estado que vamos entregar ao Tião Viana. Ele vai enfrentar o desafio da industrialização, da consolidação e fortalecimento da ZPE, de produzir, não só para o mercado interno, mas para a exportação. O meu Governo gastou muita energia para garantir um funcionamento sistêmico de todos os setores que será de grande relevância para o sucesso do Governo Tião Viana.

Mas ele terá outros desafios pela frente, porque o Acre continua sendo um Estado pobre e não tem a menor condição de atender aos anseios de todos ao mesmo tempo. Veja que, em 1999, quando Jorge Viana assumiu o Governo, a folha de pagamento era de R$ 22 milhões. Oito anos depois, recebi um a folha de pagamento de R$ 66 milhões. Agora, em 31 de dezembro de 2010, vou entregar ao governador Tião Viana uma folha de pagamento de R$ 106 milhões, o que, por si só, já se constitui num grande desafio para qualquer governo. O Tião Viana vai receber um Estado melhor do que quando eu recebi do Jorge Viana, mas ao mesmo tempo ele vai receber uma gestão muito mais complexa, com cada setor funcionando com sistemas independentes e articulados entre si. Eu diria que, exatamente por isso, o Tião terá desafios ainda maiores para os próximos quatro anos.

A GAZETA – E o conselho?
BINHO MARQUES
– Bom, o Tião não precisa de conselhos, mas se fosse para dar um conselho ao Tião, a palavra principal seria essa: conversar.  Conversar mais com a população, principalmente nas obras. Eu tive um problema de tempo também. Talvez tenha sido um erro estratégico fazer tanto em tão pouco tempo. Porque o volume de obras, de certa forma, tornou impossível a conversa. Não que não tenha tido conversa. Em algumas áreas, a conversa foi ótima. Por exemplo, na quarta ponte. Ali, teve muito diálogo, participei de várias audiências públicas com o pessoal do 6 de Agosto. A quarta ponte mudou muito nesse período. Por isso que a liberdade é importante, porque quem está vivendo o problema sabe muito mais do que quem está no gabinete. A gente mexeu com 330 famílias e não teve reclamação. A alegria do povo foi impressionante.

A GAZETA – E um exemplo no qual a conversa não aconteceu e o resultado não foi positivo?
BINHO MARQUES
– (Pausa para pensar) No caso das Zonas de Atendimento Prioritário, as ZAPs, um dos projetos mais caros.  O projeto chegou pronto e causou muito choque. Conceitualmente, era um projeto muito legal, mas que não aconteceu, na prática, como eu queria. O resultado, de forma geral, foi bom, mas poderia ter sido muito melhor se a população participasse mais. Quando, nesses lugares, entramos com as máquinas pesadas, sem a conversa, pode ter certeza de que lá a gente perdeu a eleição. Foi onde a gente mais investiu, mas causou também muito desgaste para população. Foi feito de uma maneira tão apressada que pode ter sido desrespeitoso com quem mora ali. Isso causou irritação.

A GAZETA – Em determinados momentos, houve também um estranhamento seu com a mídia local. Aquela declaração, por exemplo, de que “a imprensa do Acre tem muita quantidade e pouca qualidade” gerou polêmicas e reforçou essa idéia de um governador antipático… O senhor se arrepende de algo?
BINHO MARQUES
– É, realmente houve esses momentos que geraram um certo choque…Mas, olha, eu continuo achando isso (risos). Muita gente na imprensa reclama da falta de liberdade, mas eu não consigo enxergar isso. Acredito que todo mundo consegue sobreviver com seu próprio pensamento. Eu nunca telefonei para nenhum jornalista pra tirar alguma coisa de um jornal ou televisão. Eu ligo para discutir o fato e também para reclamar, mas de erros de informação, de algo que foi dito e que não é verdade, mas não reclamo de críticas a mim. Se sair uma coisa me criticando, eu agradeço. Quando a TV Acre, por exemplo, no começo do Governo, mostrou uma fila enorme pra fazer tomografia na Fundação, eu fiquei chocado com aquilo, eu não sabia que estava naquela situação. E eu agradeci mesmo porque não queria que aquilo continuasse acontecendo. Mas eu nunca reclamei de uma crítica justa ao governo, pelo contrário. O problema é que alguns jornalistas se escondem por trás dessa história da falta de liberdade pra não fazer um bom trabalho. Mas nunca generalizei. Eu sempre valorizei os trabalhos e os jornalistas que considero bons. No começo do Governo, eu não lia jornal, não. Mas, depois, comecei a ler porque descobri que, muita coisa do Estado, eu enxergava através dos jornais. Então, a imprensa me ajuda muito. Só que tem algumas pessoas que acham ruim elogiar. Acham que estão se desvalorizando se elogiar. Eu tenho dificuldade de entender isso porque, quando gosto de uma coisa, eu viro tiete, eu bato palmas mesmo.

A GAZETA – Mas o senhor acha que a sua relação com a imprensa poderia ter sido diferente?
BINHO MARQUES
-Não, não poderia ter sido diferente, porque cada um tem a sua personalidade, e essa é a minha. Eu não poderia ser diferente do que eu sou. Eu acho que é uma falha “de fábrica” (risos). Infelizmente, o Acre teve esse governador que tem esse perfil na comunicação. É um defeito meu, e eu tentei o que foi possível para minimizar isso. Mas não é nenhuma aversão à imprensa, de jeito nenhum… É timidez mesmo. E não é porque sou humilde, não. Sou vaidoso como todo mundo. O problema é que eu não tenho jeito pra coisa… Não consigo traduzir completamente tudo que penso e faço. Acho que não sou um bom “garoto propaganda” do governo.

A GAZETA -Quais os planos daqui em diante. O senhor continua a colaborar no Governo de Tião Viana ou voltará para os estudos, como já havia planejado antes?
BINHO MARQUES
-É, sigo agora para fazer meu doutorado. Esses continuam sendo os meus planos. Entrarei como aluno especial na UNB, e o projeto no qual vou me dedicar é sobre o Governo da Floresta, esses últimos 12 anos. Vou avaliar o que a gente acertou e o que a gente errou.  Chegaram a me convidar para ser pesquisador, mas, nesse momento, eu quero mesmo é aprender, não quero ensinar nada…(risos) Como eu tenho mestrado, recebi o convite para dar aula, mas o que eu quero muito agora é tirar as lições desse Governo. Esse vai ser o meu projeto. E vou estudar inglês, porque isso eu nunca tive tempo de estudar.

A GAZETA – O senhor considera então que, nesta etapa do Governo da Frente Popular, cumpriu o seu papel?
BINHO MARQUES
– Cumpri. E me sinto bem realizado e feliz por estar entregando na mão do Tião. Porque ele tem muito, em quantidade e qualidade, daquilo que eu não tenho, que é a capacidade de conversar. O Tião entra agora com a sua personalidade, com a sua equipe. Eu não estou dando nenhum palpite na equipe dele. E eu tenho convicção de que ele vai receber um Estado com sistemas eficientes de gestão na Saúde, na Segurança e na Educação e não vai ter que se preocupar com a preparação da base desses aspectos. Ele vai garantir a manutenção, o aprimoramento desses sistemas e agora vai poder se dedicar aquilo que é muito o perfil dele, que é o foco humanitário. O Tião não pode ver ninguém sofrendo, que ele quer ajudar. Vamos começar outro momento, e essa renovação é importante.

A GAZETA – Uma mensagem para o povo do Acre nestes últimos dois dias como governador?
BINHO MARQUES
-Graças a Deus e ao povo do Acre, tive a imensa honra e alegria de ser governador do nosso Estado. Acho que foi um dos melhores presentes da minha vida. Agradeço às pessoas que me incentivaram, que me paravam na rua para agradecer, sem nenhum interesse, sem pedir nada em troca e também as que me criticaram, que me fizeram enxergar de outro modo. Eu fui muito bem acolhido pela população do Acre, que é muito solidária. Tive o apoio de muitas pessoas e das principais instituições, e tudo o que tenho a dizer agora é muito obrigado. Agora vamos viver um novo momento. É hora de renovar os nossos sonhos. Feliz 2011 para todos!

“Meu Governo foi, sim, político”
Binho teve sua figura e sua forma de gestão rotuladas ainda na campanha eleitoral de 2006. “Binho é técnico, não é político”, foi uma das frases muito popularizadas por jornalistas e também opositores da Frente Popular do Acre, talvez com o objetivo de, na época, comparar e contrapor a imagem do então candidato à figura popular e carismática de Jorge Viana.

Nem mesmo as eleições vencidas, no primeiro turno, com 53% dos votos, e um nível de aceitação do Governo sempre acima de 60% (somando-se as avaliações de “ótimo e “bom”) foram suficientes para minimizar o mito criado em torno da personalidade “técnica”, metódica e, aparentemente, indiferente à imprensa atribuída ao atual governador.
Hoje, com argumentos de, sim, um bom político, Binho dispensa os estigmas e se manifesta sobre um dos rótulos mais famosos colocados em seu modo de gestão.

“Como esse Governo foi muito dedicado à gestão, a garantir o serviço básico a todos, ele ganhou uma marca que eu acho que não é muito correta, que é de falar que não foi um Governo político. Eu discordo disso, porque acho que se tem uma marca desse Governo é que ele foi, sim, muito político, no sentido de que, para desenvolver o trabalho, toda equipe foi buscar muito fundo nas raízes de todos nós, nesse movimento que nos trouxe até aqui. Como tivemos uma dedicação muito grande em encontrar uma lógica para as coisas, em planejar, discutir demais, acho que nos tornamos mesmo um Governo meio antipático, que se confunde em não ser um Governo político”, explica ele.

Questionado se sente incomodado ou “injustiçado” com a fama de “não político”, o governador sorri e, tranqüilo, continua com uma auto-análise:

 “Não, eu não me sinto injustiçado, porque acho que dei motivos para as pessoas pensarem dessa forma. Talvez pelo meu modo de ser e de me expressar. Mas eu gostaria que as pessoas entendessem que esse foi um Governo político no sentido mais amplo de política, que não é só essa questão eleitoral, partidária, embora eu seja militante antigo do PT. Eu entendo que o meu Governo foi político porque nosso propósito original é político, uma política de transformação social. Esse Governo tem um profundo compromisso político de construir uma sociedade melhor, que, pra gente, é causa de vida. Ao final do meu mandato, completaremos um esforço grande para cumprir o objetivo de um Acre com todos e para todos. Essa é o nosso ideal político”, destaca.

As críticas
Taxado algumas vezes de autoritário, perseguidor ou centralizador, o governador faz questão de exemplificar e explicar a liberdade dada em sua administração e, ao mesmo tempo, as regras que precisaram ser adotadas para se não acabar, ao menos minimizar muitos vícios enraizados na cultura do Estado. Tudo, segundo ele, com o objetivo de priorizar o cidadão como centro do Governo.

“A avaliação que eu faço, que é suspeita, claro, porque eu não quero ser taxado como um governador centralizador, é que o Acre é um Estado com muitos vícios. Um lugar que passou por todo tipo de condição política e social, que levou a vícios do clientelismo. Muitas pessoas não estavam acostumadas a regras, mas, para ser justo, correto e democrático, é preciso ter regras. Então, quando as regras foram colocadas, foram entendidas como minhas e não como uma regra da sociedade. Essas mudanças fizeram com que esse Governo se tornasse, aos olhos de alguns, altamente perseguidor, centralizador e antipático. Fomos extremamente rigorosos, metódicos, chatos mesmo, mas o objetivo era esse de garantir a equidade”.

Sobre as acusações de autoritarismo, o governador diz que “dói” ouvir declarações de que não valorizou a liberdade já que, segundo ele, a nova sociedade na qual acredita e pela qual luta tem a essência no ideal de liberdade.

“Essa obsessão por descentralizar recursos, por dar autonomia à equipe e à sociedade, de forma geral, sempre foi muito forte na minha gestão. Esse é um Governo que ficou com a ‘cara’ de centralizador, mas, ao mesmo tempo, é um governo que, quando se olha no espelho, se vê como um Governo que foi extremamente descentralizador. O princípio da liberdade foi o princípio desse Governo”, defende ele.

 

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