“Estamos aqui em uma guerra”. Foi com essa frase que o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) resumiu as reações que se seguiram à frase carregada de preconceitos que ele despejou contra a cantora Preta Gil, no programa jornalístico-humorístico CQC (TV Bandeirantes), na segunda-feira (28). A declaração, racista e homofóbica, resultou em diversas representações contra ele por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Câmara. E vindas das mais variadas correntes sociais. Além do deputado e ex-ministro da Igualdade Racial Edson Santos (PT-RJ), cerca de 20 outros parlamentares e até a Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ) protocolaram pedido de cassação contra Bolsonaro.
“Se o seu filho se apaixonasse por uma negra, o que você faria?”, pergunta a cantora e compositora Preta Gil, filha do artista e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil, no quadro “O povo quer saber”, do CQC. “Preta, eu não vou discutir promiscuidade com quer que seja. Eu não corro esse risco e meus filhos são muito bem educados. E não viveram em ambientes como, lamentavelmente, é o teu”, respondeu Bolsonaro.
Ao final do quadro, Marcelo Tas, apresentador do CQC, antecipou o clima que seria instalado a partir das declarações agressivas de Bolsonaro. “Caraca! Eu prefiro acreditar que Bolsonaro não entendeu a pergunta da nossa querida Preta Gil”, exclamou o jornalista, entre os incrédulos Rafael Bastos e Marco Luque, com quem divide a bancada do programa.
Pegando carona na deixa de Marcelo Tas, Bolsonaro defendeu-se dizendo que, de fato, não tinha entendido a pergunta de Preta Gil. Disse ter pensado que a indagação era sobre como reagiria se tivesse um filho homossexual. Ou seja: saiu do racismo para revelar uma violenta homofobia. Não diminuiu o grau das reações contra ele. Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, porém, Bolsonaro demonstra não estar muito preocupado nem envergonhado com o que disse. Ao contrário, ele parece mesmo se divertir com a polêmica.
“Estamos aqui em uma guerra, não é? Se eu me comportar como um cordeirinho aqui dentro [Bolsonaro estava no Planalto, mas falava do “mundo da política”]… Não é do meu estilo, não é da minha formação civil e militar. Eu sou um combatente aqui dentro. Se um dia eu der um tiro errado, eu vou pagar por causa daquele tiro”, declarou o deputado, durante o velório do ex-vice-presidente da República José Alencar, morto nesta terça-feira (29). Na ocasião, Bolsonaro se inspirou em suas épocas de casamata e classificou como “brilhante” o período de ditadura militar que acometeu o Brasil entre 1964 e 1985.
“Está na cara que o pessoal que é homossexual – que nós temos dentro do Congresso – e o pessoal ideologicamente de esquerda, que não gosta de mim dada a minha posição de defender o brilhante período que tivemos de 64 a 85, vai me criticar”, argumentou.
A entrevista não durou mais do que 10 minutos. Pouco antes, dezenas de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas se aglomeravam em volta de Bolsonaro. Sozinho e encaminhando-se para a saída do Palácio do Planalto, o deputado, então, deu a seguinte entrevista ao site:
Congresso em Foco – Como o senhor encara a morte de José Alencar? E como é comparecer ao velório do ex-vice-presidente em meio a tanta polêmica?
Jair Bolsonaro – Vim render minhas homenagens ao nosso querido José Alencar. Foi o único ministro da Defesa nos últimos 10 que apresentou um projeto de interesse dos integrantes das Forças Armadas – ele regulamentou a questão do nosso auxílio invalidez. Os militares sofrem de problemas de saúde semelhantes ao que ele estava sofrendo. Ele foi o único a apresentar projeto. Todos os outros passaram, usaram isso aqui como trampolim para alguma coisa, e as nossas Forças Armadas perderam, em todos os aspectos, ao longo desse tempo.
Tinha uma boa relação com o ex-vice-presidente?
Tive um contato com ele muito bom. Ele até lacrimejava os olhos quando falava que tinha sido soldado de Tiro de Guerra. Era uma pessoa muito afável. Viajei algumas vezes com ele de avião, ele me convidou, a serviço. Gostei muito dele, e ele tinha um carinho muito grande com a gente [militares]. Em que pese ele não ter tido conhecimento – e ele até dizia pra mim – da questão das Forças Armadas, como um todo, naquele momento.
José Alencar questionava a alta de juros, contrapondo-se a um elemento crucial da política econômica do governo Lula. Já Michel Temer prefere a discrição, a atuação nos bastidores. Qual estilo o senhor prefere?
Todo mundo sabe que o vice-presidente pouco apita, não é? Eu não posso falar o que eu gostaria que o Michel Temer fizesse, que ele iria falar que gostaria que eu fizesse outra coisa dentro da Câmara, entendeu? Pôxa, eu acredito em Deus, e peço que Deus ilumine essas pessoas. Nós sabemos que o PMDB é um partido grande e importante. Sabemos como o PMDB age na política.
O PMDB ajuda ou atrapalha a presidenta Dilma?
Sabemos o passado da presidenta – um passado que não é recomendável para qualquer cidadão brasileiro. Se ela fosse uma mulher que tivesse vivido na Itália, estaria presa, como está o pessoal da Brigada Vermelha [movimento extremista de esquerda originado na Itália dos anos 1960] até hoje. Mas, já que ela está presidente, pôxa, que ela pense no Brasil como um todo, e não em nichos eleitorais – como ela fez agora, aumentando o Bolsa Família. Isso interessa pra ela, porque é um grande curral eleitoral.
O episódio da Preta Gil moveu mais representações contra o senhor no Conselho de Ética. Já são três as…
Pode ser 30, não tem problema nenhum. Vejo com bons olhos, porque essas coisas não podem ficar escondidas. Têm de ser colocadas para fora, debatidas, para que se chegue a uma conclusão junto a pessoas de bom senso. Está na cara que o pessoal que é homossexual que nós temos dentro do Congresso e o pessoal
ideologicamente de esquerda, que não gosta de mim dada a minha posição de defender o brilhante período que tivemos de 64 a 85, vai me criticar. E nós vamos colocar isso da forma como aconteceu. E tenho certeza até de que, na próxima segunda-feira agora [4 de abril], a própria equipe do CQC vai trazer mais alguma coisa e nós vamos esclarecer isso. Até porque o próprio Marcelo Tas falou: ‘Eu acho que o deputado não entendeu a pergunta’.
Não se sente ameaçado?
Não, de jeito nenhum. Estamos aqui em uma guerra, não é? Se eu me comportar como um cordeirinho aqui … Não é do meu estilo, não é da minha formação civil e militar. Eu sou um combatente aqui dentro. Se um dia eu der um tiro errado, eu vou pagar por causa daquele tiro…
Vai ser alvejado?
Vou ser é fuzilado… (risos; neste momento, um fotógrafo começou a disparar flashes e registrar a presença do deputado) Olha aí, já estão me metralhando… (Congresso em Foco)