Rio Branco possui uma estrutura invejável quanto ao tratamento dado ao seu lixo. Desde o recolhimento até o transporte e destinação final, a cidade tem esquemas efi-cientes, suporte técnico de primeira linha e equipes altamente engajadas. Elementos mais do que suficientes para comportar uma forte cadeia econômica de reaproveitamento do lixo e tornar a Capital um pólo regional do setor, atraindo até indústrias internacionais de reciclagem. Contudo, todo este aparato não consegue atingir o máximo do seu potencial. Muitas vezes, é até desperdiçado diante da falta de participação de um parceiro essencial neste processo: a população da cidade.
Para mudar esta realidade, a ONG WWF (World Wildlife Fund – “Fundo Mundial da Natureza”) do Brasil escolheu a capital acreana, Pirinópolis/GO, Natal/ RN, Caxias do Sul/RS e Belo Horizonte/MG – dentre as 5.565 que existem no Brasil – como as 5 cidades modelos para instalar um programa piloto de incentivo ao consumo consciente e potencialização na reciclagem de resíduos sólidos.
De forma mais clara, o projeto serve como um ‘óculos’ para fazer a população destes 5 lugares ‘enxergarem’ as reais vantagens (sócio-ambientais e financeiras) de se apostar na ‘Indústria do Lixo’ como uma geradora de renda e empregos, em cima de materiais que antes seriam jogados fora.
Intitulado Programa de Educação para Sociedades Sustentáveis da WWF/Brasil, a iniciativa visa fortalecer Rio Branco e as outras 4 cidades em locais exemplares na destinação do seu lixo, dentro de 5 anos.
De acordo com o coordenador da ação, Fábio Cidrin, este prazo pode ser estendido para mais tempo e para mais cidades, conforme o sucesso no cumprimento das metas atuais. Todo este projeto, na verdade, é uma ramificação de um ato maior da WWF e seus parceiros, focado em transformar as 5 cidades e áreas rurais dos entornos de 14 micro-bacias hidrográficas brasileiras em grandes centros disseminadores do desenvolvimento sustentável.
O programa começou a sair do papel em 2010, tendo sua fase inicial voltada ao estudo de seleção das ‘cidades modelos’ e como traçar ações efetivas nelas. A partir deste ano, o coordenador da empreitada, Fábio Cidrin, explica que as equipes já vão partir pra campo e aplicar in loco os estudos técnicos e as campanhas de conscientização comunitárias.
Inclusive, ele próprio esteve com um grupo em Rio Branco nesta última semana, de terça a quinta, com a missão de elaborar o plano de trabalho local. E será justamente em cima deste planejamento que sairão as estratégias específicas para fazer a cidade progredir como uma ‘consumidora consciente’. Um progresso centrado não só na sua já ultramoderna estrutura, mas principalmente no uso que é feito deste suporte e no envolvimento em torno dele.
Como fazer isso?
Para atingir este nível de avanço, a WWF/Brasil promoverá uma série de medidas para fortificar a rede de coleta e destinação dos resíduos sólidos de Rio Branco.
Dentre elas, Fábio Cidrin destaca a qualificação da coleta seletiva, a organização estratégica dos catadores de materiais recicláveis, o compartilhamento de processos de reaproveitamento de materiais e a troca de experiências para o desenvolvimento de políticas públicas na área. Porém, ele mesmo admite que todas estas atividades não valerão nada caso a população local não entre nesta luta. Por isso, a organização também realizará sucessivas campanhas de conscientização, a fim de criar novos comportamentos de se tratar o lixo.
Mas como é possível mudar hábitos arraizados há anos na cultura das pessoas para torná-las mais parceiras deste trabalho? Para Fábio Cidrin, responder tais perguntas é um dos grandes desafios do Programa de Educação para Sociedades Sustentáveis. Segundo ele, para convocar a população a se engajar neste processo de mudança é preciso, antes de tudo, achar os caminhos para fazer com que cada indivíduo enquanto cidadão descubra, no seu dia-a-dia, o potencial econômico que pode render tudo aquilo que ele chama de ‘lixo’.
“Todos nós geramos toneladas e toneladas de resíduos. Isso é um fato imutável. Portanto, o que nós devemos assumir daqui pra frente é a responsabilidade por todo este lixo que nós produzimos. Sem o trato adequado, ele vai se tornar um grande mal para o ambiente que nos cerca. Mas com os processamentos certos, como a separação em casa dos lixos sólidos (papel, plástico, vidro, metal, etc) e dos orgânicos (alimentos, restos de comidas, líquidos, etc), este mesmo lixo pode vir a se tornar a fonte de renda de alguém”, prega o especialista.
Economia à parte, outro lado que o ambientalista defende que a população deve se atentar é quanto aos benefícios sociais do programa. A seu ver, é preciso ter em mente que ao se implantar uma rede sólida de reciclagem também estarão sendo geradas várias oportunidades de inclusão para grupos marginalizados, trabalhadores pouco qualificados e camadas sociais de baixa renda. Tudo isso só durante as investidas necessárias para solidificar tal processo.
O terceiro, e mais evidente, foco deste tripé do convencimento popular é o compromisso assumido com a preservação ecológica da cidade. Conforme Fábio Cidrin, para fundar a nova ‘Educação para o Consumo’ em Rio Branco, é preciso que as pessoas comecem a tomar atitudes diferenciadas, tais como evitar o consumo excessivo e o desperdício.
“Eu sempre comparo esta mudança no comportamento à Lei do Cinto de Segurança. Quando a lei se tornou obrigatória, muitos sentiram o impacto e começaram a usar o cinto. Com o passar do tempo, a fiscalização ficou mais leve, e mesmo assim as pessoas continuaram a usar porque aprenderam que o cinto é importante. Nossa intenção é conseguir criar um impacto parecido, que motive as pessoas a verem a importância de reaproveitar o lixo”.
PARCEIROS
E para garantir que toda esta atuação seja concretizada, a ONG contará com vários aliados. De origem, a empreitada é uma parceria sólida e pioneira da WWF/Brasil com o Banco do Brasil (BB), a Fundação Banco do Brasil (FBB) e a Agência Nacional das Águas (ANA). A nível local, recebe amplo apoio multi-setorial da Prefeitura de Rio Branco e do Governo do Estado, pela Semeia, Safra, Seme, Coordenação de Economia Solidária, Sema e Seaprof. Sem contar com os apoiadores que ela ainda deve buscar.
“Para incitar nas pessoas esta reflexão sobre o descarte consciente, a idéia do programa é mobilizar tanto o poder público, quanto os diversos setores privados e da sociedade civil, organizada ou não. Desde a indústria, o comércio, as escolas e as igrejas até as entidades trabalhistas e associações, todos têm o seu papel neste compromisso. Este é um trabalho que, para dar certo, precisa do envolvimento de todos os elos da sociedade”, prega Fábio.
Os motivos que levaram a escolha de Rio Branco
A seleção das cidades foi feita mediante critérios altamente rigorosos. Afinal de contas, a WWF/Brasil não poderia desperdiçar todas as fichas apostando em lugares que não indicassem que o programa piloto poderia dar certo. Sendo assim, foi esquematizado que cada 1 das 5 regiões do país seria beneficiada com uma cidade, replicadora das idéias incorporadas pelo projeto. As cidades também deviam seguir portes e características bem distintas, no sentido de provar que a iniciativa tem capacidade pra se adaptar a qualquer tipo de circunstância local.
Desta forma, a disposição das 5 cidades selecionadas ficou assim planejada: Rio Branco (Região Norte, porte médio); Belo Horizonte (Sudeste, porte de metrópole), Natal (Nordeste, porte grande), Caxias do Sul (Sul, porte médio) e Pirinópolis (Centro-oeste, porte pequeno).
Como condições básicas, todas elas também deveriam ter uma estrutura já consolidada no tocante ao processamento dado aos seus resíduos sólidos, logística de transporte suficiente para coletar todo o seu lixo despejado, equipes bem definidas, iniciativas próprias nesse sentido e, sobretudo, ter a disposição no poder público para fazer com que o uso de tais aparatos seja cada vez melhor. Todos requisitos que atendiam perfeitamente as normas impostas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), regulamentada no final do ano passado.
Outro fator determinante para a escolha das cidades foram suas predisposições para repassar aos municípios da sua região os resultados positivos que o programa venha a lhe render. A vontade de descobrir novas técnicas e recursos de reciclagem e tratamento de lixo, a boa receptividade ao programa, a localização geográfica estratégica e a valorização generalizada ações de cunho sócio-ambiental também foram itens que contribuíram para a escolha final.
Após a visita realizada nesta última semana, o coordenador Fábio Cidrin pôde constatar em Rio Branco a maioria destes pré-requisitos. Na avaliação do grupo que veio com Cidrin, a capital acreana tem forte apelo à limpeza de seus espaços públicos, veículos de coleta e um efetivos de coletores mais do que suficiente para realizar a devida captação do lixo nas ruas. Além disso, possui uma unidade de tratamento para resíduos sólidos (a Utre) dotada de acomodações e equipamentos de ponta, pra executar os mais sofisticados processamentos.
“Tudo isso garante a cidade o suporte para instalar um serviço muito eficaz e abrangente de coleta seletiva. A gestão pública tem uma marca de atuação já muito avançada nesta área. Inclusive, com uma organização muito bem definida. Eu acredito que o nosso maior desafio por aqui será mesmo o de mobilizar a população local a abrir os olhos pra este vasto potencial que a cidade já oferece. E que ainda não está sendo nem 50% explorado”, avalia Fábio Cidrin.
Quais ganhos reais que o programa pode trazer para a Capital do Acre
Tão marcante quanto receber um projeto pioneiro com o selo de preservação da WWF/ Brasil são os inúmeros benefícios que ele deve gerar à capital acreana. Além de toda a respeitada publicidade no cenário nacional, o programa serve como uma espécie de ‘preparador’ para solidificar ainda mais a cadeia produtiva da reciclagem do lixo de Rio Branco, ao mesmo tempo em que transparece as conquistas sócio-ambientais atingidas neste processo.
Em outras palavras, isso significa: mais lucros sendo gerados para a economia regional, mais empregos sendo criados para tirar pais de família da amargura do desemprego, mais impostos sendo recolhidos para se converter em investimentos na região, além da maior atratividade de investidores de fora (até internacionais, em particular, após a abertura completa da Estrada do Pacífico e da ZPE) para ampliar as proporções e a concorrência desta cadeia produtiva.
“Outra vantagem dos avanços na cadeia é a extensão de produtos e serviços que ela tem a oferecer. Ora, muitas empresas do Acre (lojas, supermercados, hotéis, etc) ainda importam sacolas plásticas, caixas de papelão e embalagens personalizadas de vários lugares do país, quando já deveria haver várias boas produtoras especializadas nestes segmentos aqui mesmo”, diz Fábio Cidrin.
E tudo isso sem mencionar os gastos poupados pelo poder público na eliminação destes resíduos sólidos. Para suprir aquilo que a população muitas vezes se omite em fazer quando se trata de lixo, o orçamento de Rio Branco tem de se esvair em milhões com o pagamento de energia, gasolina pra transporte do lixo (25 Km de viagens), compra de aparelhos de fora, etc. Milhões que poderiam estar sendo destinadas a outras áreas mais carentes do município.
Um bom exemplo de correção do curso destes recuros públicos, cita Fábio Citrin, está na Utre. Conforme dados expostos por ele, a unidade hoje capta cerca de 190 toneladas de lixo por dia (muito devido ao uso descontrolado da população da cidade), o que a faz ter uma vida útil de em torno de 10 anos. Com a adoção do programa, a meta vai ser diminuir este montante de resíduos em 50% (pra menos de 100t/dia). “Isso vai fazer com que a Utre demore muito mais para se desgastar. Poderia ter vida útil de, quem sabe, até 50 anos. E se assim o fosse, o governo pouparia milhões ao não construir novas unidades” especula o especialista.
Cinco coisas que você pode fazer para ajudar neste trabalho:
1 – Faça a separação dos lixos sólidos (metais, papel, papelão, vidro, plásticos, tecidos, fibras, resinas, porcelanas, borracha, etc) com os dos orgânicos (restos de comida, cascas de frutas, sementes, rações, cascas de ovos, líquidos, alimentos estragados, etc ). A mistura entre os dois é o que impede que 60% dos materiais da cidade sejam reciclados;
2 – Evite o acúmulo de materiais descartáveis sempre que possível Exemplo: deixe de pegar a sacola plástica em pequenas compras;
3 – Quando adquiridas, tente reaproveitar as embalagens ao máximo antes de substituí-las por novos produtos. Exemplo: prefira comprar requeijão em embalagens de vidro para depois usá-la como copo, ao invés de comprar numa de plástico para depois jogá-la fora;
4- Nunca acumule grandes quantidades de lixo em casa;
5- Não contribua para a sujeira de espaços públicos. Sempre jogue o lixo na lixeira;