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“Discurso moralista”

Em razão do último artiguete, sob tema “vidas e atitudes cínicas”, fui acusado e nominado de  escrever “discurso moralista” e estabelecer preceitos morais não mais aceitos, na sua totalidade, no mundo atual. Como sou metido a professor de lógica, respondo aos meus acusadores que não existem quaisquer razões lógicas que obriguem o homem a optar por esta ou aquela forma de vida. Essa premissa faz parte da “essência do conceito kierkegaardiano de escolha”.

Soren Kierkegaard (1813-1855) nos seus famosos “estágios” da existência humana diz que há três opções de estilos de vida que as pessoas podem seguir: o homem estético – busca de prazer, que conduz ao tédio existencial;  o homem ético – cumpridor de deveres, mas perdido na massa; o homem religio-so – vida de fé, mas com angústia e desespero, que levam a individualizar-se. Para Kierkegaard, a pessoa que vive no estágio estético, optou por viver no porão da vida; só que no porão da vida o homem não encontra o sentido verdadeiro para sua existência. A se ver no porão com todas as suas atrações fatais, o homem se debate, na esperança de sair do caos, trevas e desordem, em que está metido. Para tanto, diz o pai do existencialismo, é necessário um ato de vontade, através de uma “decisão” existencial.

Inegavelmente, no mundo de hoje, mais do que na época de Kierkegaard, vivemos o ápice da vida estética. A maioria da população mundial (7 bilhões) está entregue a uma vida desregrada de prazeres, optou por viver à beira do abismo das paixões, isto é: sentimento ou emoção levado a um alto grau de intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão. O mais trágico de tudo é que qualquer indivíduo que ousar reagir contra essa inclinação perversa é nomea-do, na melhor das hipóteses, de falso moralista. Não se concebe mais um modo de vida estético equilibrado, vida de prazeres comedidos, que por si só, se contrapõe, não apenas a dor, mas, sobretudo, o tédio. Não! Queremos viver intensamente as contradições das paixões humanas!!

Esta ponderação não é um confronto entre o antigo e o novo, representado nas figuras de um homem velho e um jovem, como ilustrou o próprio Kierkegaard. A questão é a busca de um equilíbrio entre o estético e o ético, pois neste sentimos a intensidade do dever, de tal modo que a nossa consciência esteja plenamente assegurada da validez do nosso papel de cidadão. O homem velho e o homem novo, independente do seu nível social, devem encarnar o espírito de cidadania; é um cidadão,  antes de qualquer outra função social. Cidadão, para quem não sabe e não consulta dicionários, é a pessoa no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado, ou no desempenho de seus deveres para com este. Ocorre que hoje cidadão é coisa do passado, a própria palavra está em desuso. Hoje o sujeito pensante é o “bicho” o “cara” etc.

O drástico dessa corrida desenfreada rumo às paixões, do corpo e da alma, é a adesão da juventude pelas drogas alucinógenas, levando de roldão milhares de famílias ao fundo do poço ou ao porão da vida, pois, é no plano familiar onde se desenvolve todo um drama de sofrimento e agonia. A questão é de tal modo aviltante que muitos pais chegam a ter medo dos seus filhos. Alguns   pais, em função da opressão insuportável dentro do lar, radi-calizam e matam seus filhos, isso quando não são executados pelos filhos drogados. “Eu não agüentava mais”, disse um sexagenário depois de matar seu próprio filho. Vi, esta semana, em noticiário de TV, que  uma senhora matou o próprio filho dependente de drogas. A atitude destes pais, radicalmente trágica, contraria a própria natureza; são raras as espécies que eliminam seus próprios filhotes. A imprensa que incansavelmente, no seu dia-a-dia deflagra campanhas, denunciando os males oriundos desse inferno chamado narcotráfico, vive também sua impotência face ao avanço inexorável do “mundo das drogas”.

Independente do meu discurso moralista, na contramão dessa nova ordem cultural libertina, o que eu e a maioria da nação brasileira almejamos é que cada pessoa ou indivíduo exerça um ato de vontade, através de uma “decisão” existencial e resista à proliferação do consumo de drogas. Sair desse discurso de cobrar do poder público e tão somente dos governantes, as providências para conter o avanço do tráfico de drogas no Brasil, pois debelar completamente é quase impossível. Todos sabem que, na medida em que o tempo passa, mais aumenta a incidência de consumo de drogas no mundo inteiro.  Só para falar de maconha, esta é a droga ilícita mais popular do mundo, com 144 milhões de usuários. Nada consegue parar essa trajetória maldita que infelicitam milhões de pessoas e que não respeita idade, raça, religião, leis humanas e tudo mais.  

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