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A criminalidade pode aumentar com a Nova Lei n. 12403/2011?

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 As mudanças sempre dão medo. A abolição dos escravos, por exemplo, provocava pavor nas classes dominantes. Difícil era para os aristocratas pernambucanos entenderem que JOAQUIM NABUCO, filho e neto de senhor de engenho, pudesse defender um negro acusado de homicídio contra um branco.

   Nessa defesa que NABUCO faz do negro TOMÁS, relatada na apresentação do livro “A Escravidão”, feita por LEONARDO DANTAS SILVA, o grande brasileiro vai se dando conta da degradação moral que a instituição provocava na formação do povo.  Sem a abolição da escravatura – pensava NABUCO – não seríamos uma Nação civilizada.

   Antes de BECCARIA publicar seu pequeno grande livro “Dos Delitos e Das Penas”, no qual se insurgiu contra a tradição jurídica e a legislação penal de seu tempo, denunciando torturas, julgamentos secretos e outros horrores, como o fez, posteriormente, MICHEL FOUCAULT em “Vigiar e Punir”, não havia justiça; mas vingança contra os acusados.

   O poeta VICTOR HUGO, em discurso que fez no aniversário de cem anos da morte de VOLTAIRE, diz que o filósofo seria um dos maiores homens da humanidade apenas pela defesa do restabelecimento das memórias de CALAS e LA BARRE, vítimas inocentes de erros judiciários praticados com base num direito penal selvagem. Disse o bardo no discurso: “… a proporção, a conveniência, a reserva é a lei suprema da razão”.

   A História do Direito Penal é a História de contínuas abolições das penas. A História do Direito Penal é a História de um largo processo de humanização da repressão. E é bom que assim seja. EVANDRO LINS E SILVA leciona: “a indulgência não é defeito, é virtude, e a consciência caminha no sentido do perdão”.

   A Revolução Francesa consagrou na Declaração dos Direitos do Homem o princípio da inocência: “Art. 9º. Presumindo-se inocente todo homem, até que não tenha sido declarado culpado…”.

   O Código de Processo Penal Brasileiro (Decreto-Lei 3.689/19410), elaborado sob inspiração do fascismo italiano, consagrou o princípio da culpa (art. 310). Quase quarenta anos depois é que, em nossa legislação processual, incorporamos o princípio da inocência (art. 310, parágrafo único do CPP).

   Quando da incorporação do parágrafo único no art. 310 do Código de Processo Penal, no longínquo ano de 1977, consagrando-se o princípio da inocência, os conservadores diziam que nossas prisões agora iam se esvaziar. Não ficava mais ninguém preso. Ledo engano! Os juízes, conservadores na sua maioria, continuaram adotando a presunção de culpa. Fazem até hoje, quando apenas homologam os autos de prisão em flagrante.

   Pela nova lei, não mais se pode abusar da prisão preventiva. Era comum decretar-se prisão preventiva de quem, condenado, não ficaria preso em razão do tamanho da pena. As prisões em flagrantes eram apenas homologadas quando inexistiam os requisitos da prisão preventiva.

   Quanto à prisão preventiva, somente terá cabimento em hipóteses restritas, desde que não caiba nenhuma medida cautelar diversa desta prisão, a saber:

I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II – proibição de acesso ou freqüência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (artigo 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX- monitoração eletrônica.

   Concluindo, a nova lei, sem lugar à dúvida, vai contribuir para o esvaziamento das prisões provisórias desnecessárias. No Estado do Acre, apenas a título de exemplo, verifica-se que 50% (cinqüenta por cento) dos presos que se encontram no sistema penal são presos provisórios que podem, em tese, serem absolvidos, mas, paradoxalmente, estão encarcerados.

   A lei concorre para humanizar a prisão provisória e evitar os abusos. Não há que se temer um aumento da criminalidade. A criminalidade tem outras causas.

*Valdir Perazzo é Defensor Público

Roberto Duarte Júnior é Advogado

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