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ANP está investindo R$ 90 milhões na bacia do Acre

A Amazônia tem riquezas acumuladas ao longo de milhões de anos que a sociedade moderna levará séculos para desvendá-las integralmente. O Acre faz parte deste conjunto de mistérios e bens ocultos, capazes de elevar o seu ritmo de desenvolvimento a um novo patamar. E é justamente enxergando este potencial que a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) está injetando milhões e milhões de reais na elaboração de pesquisas e estudos para a aquisição de dados sísmicos mais completos sobre a bacia do Estado. A grande meta é dar o pontapé inicial na exploração das nossas prováveis riquezas minerais.

De fato, a agência reguladora já aplicou na bacia sedimentar do Acre uma cifra superior a R$ 90 milhões, desde 2007 até os dias atuais. E pretende seguir apostando muitos mais para a efetivação complementar dos estudos em 47% do Estado, mais particularmente a metade do território que abrange a região do Juruá (envolvendo os municípios de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves, Porto Walter e fechando com Ipixuna/AM e Guajará/AM).

A frente de investimentos é preconizada no Plano Plurianual 2007-2014 da ANP.  Tal plano é a engrenagem estratégica principal que move tudo o que é desenvolvido pela agência. Como um ‘trilho’ que conduz o ‘trem’ de ações da paraestatal. E a bacia do Acre (apresentada nela como ‘Madre de Dios’, ou ‘Madre de Deus’) faz parte de um cômodo vagão deste trem.

Ao todo, o Plano Pluri-anual de estudos de Geologia e Geofísica prevê a destinação de cerca R$ 1,8 bilhão em 7 anos para as 25 bacias sedimentares identificadas em todo país. Para a bacia acreana, além dos R$ 90 milhões atualmente já investidos, a agência pretende designar mais de R$ 47,02 milhões nos próximos 3 anos, totalizando R$ 137,02 milhões até 2014.  Tudo para a obtenção dos dados necessários para cumprir, rigorosamente, todos os devidos passos antes de lançar a bacia acreana pra ter sua exploração licitada em blocos nos leilões da ANP.

O montante de recursos dedicado às pesquisas no Acre, inclusive, aparece como uma das maiores cifras da agência. Pra ser mais exato, é a 5ª maior delas, só atrás dos investimentos aplicados para os estudos nas bacias: do Parnaíba (estados do Nordeste, a maior parte na Bahia: R$ 158,81 milhões); do Paraná (litoral do Ceará e do RN: R$ 207,36 milhões); do Paraceis (no Mato Grosso e uma pontinha do sudeste de Rondônia: R$ 224,04 milhões); e, óbvio, a grande campeã de apostas da ANP é a bacia do Pré-Sal de Santos (R$ 500 milhões).


Amarelo mostra zona que a ANP vê como ‘potencial’

Desmembrando os R$ 90 milhões em recursos que a ANP está investindo nos estudos locais geofísicos e geológicos, foram: R$ 3 milhões para fazer a coleta e análise de 2 mil amostras de solo que comprovam a chance real de haver um sistema petrolífero ativo na região (estudo feito em 2008); R$ 26 milhões para executar o Aerolevantamento Gravimétrico (processo concluído em 2010, no qual foram obtidos 26 mil Km lineares de dados geofísicos para localizar as grandes feições da bacia do Acre); e os R$ 53 milhões que estão sendo aplicadas atualmente para a aquisição de 1.000 Km lineares de dados sísmicos. Outro passo que está sendo dado é agora é na recuperação de registros sísmicos obtidos antes de 1998 (R$ 1,6 mi).

Os demais R$ 47 milhões e 20 mil deverão ser usados para finalizar todo este processo.

Mas tantos milhões de investimentos para o quê? O que a ANP espera conseguir debaixo do solo acreano que possa valer tanto à pena? Resposta: gás natural. Com efeito, o mineral, se achado em abundância, pode ser um marco histórico para o desenvolvimento local. Não que a agência menospreze a efetiva exploração de petróleo na região. A reguladora, ao contrário, atua com expectativa de achar amplas reservas de petróleo na bacia sedimentar do Acre (sem contar que, vale ressaltar, o gás natural é achado nas próprias jazidas do petróleo).

Fato é que os estudos sísmicos iniciais e a proximidade com a Bolívia (um dos maiores exportadores mundiais) indicam que as reservas de gás natural na região são mais promissoras do que ter um 1º ciclo do verdadeiro ‘Ouro Negro’ (desta vez, com petróleo e não borracha).

Para que fique mais claro, é preciso conhecer a história toda. O gás natural é uma mistura orgânica de hidrocarbonetos leves encontrados no subsolo (composição à qual o metano prepondera, detendo 70% de seu volume). Dependendo da sua área de origem e qualidade nos processos de produção, condicionamento e transporte, o gás pode ter maior ou menor eficiência energética para, por exemplo, usinas termoelétricas. Ele começou a ser usado no Brasil nos anos 40, após sua descoberta na Bahia. Nas décadas seguintes, reservas do gás surgiram em Alagoas e Sergipe. Na década de 1980, a Bacia de Campos/RJ tomou a frente da produção do mineral do Nordeste e manteve uma hegemonia até o fim dos anos 90.

De fato, o Brasil descobriu um novo mercado com gás natural bom e barato! Em 1999, o Governo Federal concluiu o Gasoduto Brasil-Bolívia, suficiente pra transportar mais de 30 milhões de m³ do solo boliviano (suficiente pra suprir o mercado nacional). Houve então um aumento gradual da demanda do produto no Brasil (particularmente em 2002, quando a União decidiu tirar suas fichas das hidrelétricas em crise e passou a apostar mais no uso do gás nas termoelétricas) e que não conseguiu ser acompanhado pela oferta. A bomba deste desequilíbrio nacional estourou poucos anos atrás, após instabilidades na cadeia do gás natural da Bolívia.

E foi em meio a esta crise (gerada, em vários aspectos, por fatos políticos) que o governo brasileiro decidiu que não poderia ser dependente do mercado boliviano. Nesse sentido, passou a investir de novo, no fim de 2007, de forma maciça na cadeia nacional, atri-buindo à bacia de Santos e à da Bahia como produtoras e, sobretudo, as bacias do Pré-Sal e do Acre como grandes apostas para conseguir revolucionar a produção nacional do gás natural e fomentar uma mega-política de incentivo à sua adoção nas usinas termelétricas.

Em outras palavras, a ANP considera a acreana como uma bacia de fronteira exploratória ainda muito pouco conhecido. Mas os estudos realizados até agora indicam um potencial promissor para a ocorrência de gás natural e de acumulação de hidrocarbonetos. Fatores que estimulam altas expectativas exploratórias. E tão logo terminar o atual levantamento sísmico, a bacia do Acre já deverá ser licitada para exploração pela agência, assim como já é feito com as 2 bacias do Amazonas, que já são sucessos internacionais nos leilões.

Os 10 passos do processo de aquisição de dados sísmicos
Ao contrário do que se vê em filmes e  desenhos animados, para explorar uma área que abriga jazidas de petróleo e outros minerais não basta apenas cavar um buraco profundo no chão, colocar equipamentos e esperar que de lá jorre rios do líquido negro. O processo é bem mais complicado, extenso e dispendioso do que se imagina. Ele exige uma série de cuidados sócio-ambientais, procedimentos meticulosos, trâmites legais e, acima de tudo, uma base sólida de pesquisas, análises, compilação de dados e trabalhos em campo.

Os estudos se situam em 2 disciplinas fundamentais: a geofísica e a geoquímica. Na primeira, a meta é obter a reconstituição das condições ao qual se deu o processo de formação e de acumulação dos hidrocarbonetos naturais (compostos químicos de carbono e hidrogênio que se formam no interior da terra e são trazidos a zonas de baixa pressão para originar gás natural, petróleo, carvão, etc) numa determinada região. Já a parte geofísica é uma medição das propriedades físicas da terra, através da coleta de dados das estruturas das rochas em superfície que, ao serem analisados, revelam se elas são ou não propícias a ter hidrocarbonetos.


Ilustração mostra como funciona sísmica de reflexão; trabalhadores instalam piquetes

Cada uma possui procedimentos específicos. No campo da geofísica, os principais são a magnometria (medição do campo magnético), gravinometria (medida do campo gravitacional) e a sísmica da reflexão com explosivos (neste, é causado um impacto, ou ponto de tiro, pra gerar ondas sísmicas. Com base na trajetória, propagação, intensidade e outros efeitos delas é possível descobrir muito sobre uma área). O Acre detém estudos prévios nos 2 primeiros processos. No entanto, é com a metodologia da sísmica – a mais usada na indústria do petróleo do mundo inteiro – que o ANP submete a bacia do Acre. O momento atual dos estudos, então, é amplo e decisivo para a execução deste método, que consiste em 10 passos básicos:

O primeiro é a mobilização. Nele, a empresa que ganha licitação da agência para fazer o serviço traça frentes de trabalho itinerantes com várias bases na região (zona urbana e rural) e tendo o desafio de usar à infra-estrutura local para a manutenção elementar. O segundo passo é fazer reconhecimento de área, traçando um panorama generalizado e completo sobre o conjunto de características (acesso, quadro epidemiológico, relevo e vegetação, tipos de ecossistemas, porte das cidades, etc). O terceiro é a etapa de obter permissões, ou seja, a empresa estabelece contato pra dialogar com os donos das terras onde se planeja passar as linhas sísmicas, mantendo-se informado sobre todas as fases e efeitos deste processo.

Na seqüência, o quarto ato para a empresa é o de abertura e estaqueamento das picadas, que consiste definir no terreno estudado qual é o ponto da linha sísmica que será fixada o Piquete (pequenas estacas de madeira demarcatórias). Daí, segue-se uma programação completa da linha sísmica e é aí que entra o quinto passo, que é o de processamento topográfico desta linha (localização dos piquetes e demarcação precisa da linha sísmica). O sexto passo é o da sondagem. Definido os pontos da linha, são verificados os melhores locais para se perfurar o solo e instalar os pontos de detonação (PT), por meio de sondas mecânicas/ manuais. Nestes furos, são carregados os explosivos (7º passo) a serem detonados para gerar o movimento sísmico.

O oitavo passo é a de Sismografia, que consiste em espalhar o aparato sismográfico nos seus devidos pontos de registro. A nona fase é, enfim, a da detonação dos explosivos com a aquisição, seguida de processamento, efetivos dos dados da linha. Por fim, obtidos os dados sísmicos, o décimo e último passo é o de recuperação total das áreas afetadas pelo estudo.  Cabe à empresa executora fazer um elaborado trabalho de inspeção, visando identificar todos os danos causados pelos 9 passos anteriores e recuperar 100% da extensão da área. O esforço na recuperação vale tanto para terras da coletividade, quanto para individuais.

Polêmicas ambientais e garantias de uma pesquisa responsável
É neste contexto de conseqüências do estudo de obtenção dos dados sísmicos que chegou a se formar, a nível local, certa resistência de alguns grupos locais. Eles alegam que as pesquisas para obtenção de dados sísmicos e a posterior exploração de jazidas de petróleo geraria fortes impactos ambientais na região. É justamente pra desmembrar tais acusações que a ANP pré-estabelece uma vasta série de medidas atestando a sua responsabilidade sócio-ambiental.


Explosivo especial será usado; gás natural requer grande estrutura de armazenamento; trabalhadores têm EPIs

A priori, os primeiros estudos de reconhecimento especulatório sobre o potencial da bacia do Acre respeitaram todas as leis am-bientais vigentes. Já a entrada dos estudos de dados sísmicos elevou tal zelo ecológico a um novo grau de preciosismo. Por conseguinte, todos os 10 passos da sísmica de reflexão apresentados anteriormente atendem, rigorosamente, um conjuntos de leis específicas em todos os aspectos possíveis à preservação regional.

Os dois primeiros (mobilização e reconhecimento de área) prevêem diversas valorizações e adaptações do/ao meio local. Por exemplo, uso de insumos e materiais locais, alimentos, rede de comunicações, hospedagens, gastos de saúde, reparos elétricos e mecânicos, uso do máximo de mão-de-obra local possível (uma equipe sísmica, para cumprir todos os 10 passos, precisa ter cerca de 400 profissionais, isto é, empregos gerados. E requer muitos gastos, pois precisa montar mais de uma base de operações, na cidade e no campo), etc.

Mais alarmante ainda para os críticos foi à utilização de explosivos para os estudos. No entanto, a ANP ficou responsável por licitar a empresa que assuma o compromisso de usar um tipo de explosivo especial (a base de nitrato de amônia, próprio em regiões florestais) para a bacia acreana. Fora isso, eles seguem todos os padrões exigidos pela legislação que rege o uso legal de explosivos (militar) no tocante a compra, transporte, armazenamento, verificação e detonação. O manuseio deles é feito por técnicos altamente treinados. As equipes também se certificarão que todos os explosivos que forem implantados em algum lugar serão detonados e que a área da explosão será inteiramente recuperada e/ou ressarcida.

A ANP ainda obriga a empresa executora a cumprir licenças ambientais, respeitar as obras de engenharia e os ciclos de produções agrícolas, treinar funcionários regularmente, adotar inúmeras medidas de segurança e emergência perante a execução de suas ações. E, como se não bastasse, ainda criou um plano estratégico exclusivo só pra atuar na região. Trata-se das ‘Diretrizes para a exploração, produção e transporte de óleo e gás na Amazônia. Um documento de 9 páginas contendo centenas de itens específicos para a adaptação de cada pequeno procedimento e investidas a serem feitos na obtenção dos dados locais.    

A Gazeta do Acre: