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Depois de 9 meses, índios desmontam o acampamento da sede da Funasa

Tudo começou no dia 3 de novembro do ano passado. Insatisfeitos com o tratamento dado pela administração da Casa do Índio (Casai), pacientes procuraram líderes indígenas para reclamar. Eram dezenas de mortos nas aldeias, surtos de tuberculose e malária, ambiente de internação insalubre e cirurgias que eram agendadas, mas não aconte-ciam. Um retrato de muito, mas muito descaso com a Saúde Indígena. Depois de 9 meses de intensa mobilização e lutas, aconteceu o I Fórum de Saúde Indígena. As mudanças ocorreram e finalmente havia chegado a hora de voltar para as aldeias.

Entre os avanços mais significativos, estão à reforma e ampliação da casa de passagem, que deve acontecer nos próximos meses. Neste período, os pacientes serão transferidos para outro prédio. A nova Casai deverá ter instalações adequadas e condizentes com as tradições e cultura dos povos indígenas. “Estamos em processo de licitação da nova sede. Ainda em setembro, sairemos deste prédio”, anunciou o administrador interino do lugar, Antônio Pereira Lira.

Quanto à demora nas cirurgias, o problema foi resolvido. O governador Tião Viana, segundo a própria organização do movimento, determinou e foi criada no Hospital das Clínicas (antiga Fundhacre) a Gerência de Atenção Espe-cial aos Povos Indígenas (Gasepi). O setor recebe as demandas e as encaminha para a resolutividade. Tudo dentro da programação e diretrizes do SUS. “Resolvemos todas as demandas represadas e estamos, junto com os líderes indígenas, fazendo planejamentos para melhorar a atenção nos casos de média e alta complexidade”, disse o coordenador do setor, Aélico Alves Pereira Neto.

Neste período de ‘turbulência e jogos de interesses’, tanto o movimento indígena quanto os gestores públicos, somados a personalidades políticas, não conseguiam entrar em um acordo. Apenas com a intervenção do Ministério Público Federal (MPF), da Polícia Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU), o movimento indígena reivindicatório conseguiu avançar em busca de uma saúde humanizada.

União e ressurgimento do movimento indígena
Após um longo período de descrédito e apatia, o demorado acampamento fez ressurgir o movimento indígena no Acre. A organização, que ficou conhecida como Movimento Indígena Unificado (MIU), agora tem assento nos principais fóruns deliberativos dos órgãos ordenadores das despesas e dos formuladores de políticas públicas. “Isso se consegue com pressão e controle social”, observa o presidente da Federação dos Povos Huni Kui do Acre (Fephac), Ninawá Huni Kui.

Figuram, ainda, como entidades do MIU a Organização das Mulheres do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia (Sitoakari), a das Comunidades Agroextrativistas Jaminawás (Ocaerj), a dos Povos Apurinãs e Jamamady de Boca do Acre (Opiajabam), a dos Povos Indígenas do Vale do Envira (Opire), a dos Povos Indígenas do Rio Tarauacá (Opitar) e da Comissão de Articulação dos Povos Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia .

“Nada aconteceu de graça. Se não, vejamos: fechamento da Funasa e Casai, passeatas pelas ruas e em frente ao gabinete do governador, encontros em Brasília, audiências públicas, encontros e reuniões nas comunidades (aldeias), denúncias e cobrança nos órgãos de controle, audiências com gestores estaduais, municipais e federais, além do protesto do próprio acampamento”, enumerou o principal líder do MIU, Ninawá Huni Kui.

Prevaleceu o bom senso, DIZ Osvaldo Leal
O ex-secretário estadual de Saúde, Osvaldo Leal, que atualmente responde pela pasta em Rio Branco, disse que o fim do protesto demonstra o ‘bom senso’ do movimento. “Mesmo com certa ‘radicalidade’, o protesto é justo, legítimo e representativo”, disse ele, deixando a entender que houve excessos dos líderes indígenas. Em sua opinião, as políticas de atenção à Saúde Indígena são complexas e precisam ser mais flexíveis e resolutivas.

“O antigo sistema, da forma que foi estruturado no SUS, parece que foi concebido para não funcionar. Agora que a Saúde Indígena não é mais administrada pela Funasa, podemos perceber avanços na desburocratização e controle social”, enfatizou Leal. As atribuições, agora, são da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), diretamente ligada ao Ministério da Saúde (MS). 

A Sesai foi criada para coor-denar e executar o processo de gestão do subsistema de atenção à Saúde Indígena em todo território nacional. O órgão tem como missão principal  a proteção, a promoção e a recuperação da saúde dos povos indígenas e exercer a gestão, bem como orientar o desenvolvimento das ações de atenção integral à Saúde Indígena e de educação em saúde segundo as peculiaridades, o perfil e a condição sanitária de cada Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei). Desta última feita em consonância com as políticas e programas do SUS.

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