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“Funai tem de apanhar de couro de anta”, diz Kanamaris a assessor acreano da Funai

“A Funai coloca indígena para falar com os indígenas porque não tem coragem de ir nas aldeias. A Funai está usando você contra os índios, parente”. Assim o pajé da aldeia Bananeira, Raimundo Iwi, resumiu a indignação dos Kanamari diante de Francisco Pian-ko, assessor do presidente da Fundação Nacional do Índio – Funai. Pianco é de origem Ashaninka, povo indígena do Acre.

 Ele esteve na aldeia São Luiz, no dia 26/08, participando do IV Encontro de Lideranças Indígenas do Povo Kanamari do Vale do Javari, com a tarefa de dialogar sobre as mudanças resultantes da reestruturação do órgão, iniciada ainda sob o governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva. Pianko comunicou que já está na Casa Civil a proposta de alteração ao decreto 7.056 de 28 de dezembro de 2009 prevendo, entre outras iniciativas, a criação de uma coordenação técnica regional no Vale do Javari.

As mudanças na estrutura da Funai provocaram reações por parte dos indígenas em várias regiões do Amazonas e em outros estados. De acordo com o decreto, à Coordenação Técnica Regional do Vale do Juruá, sediada em Cruzeiro do Sul, no Acre, caberia a assistência aos povos do Vale do Javari e parte dos habitantes de outros municípios do Sudoeste do Amazonas – uma área geograficamente ampla e de difícil acesso em muitas localidades. 

Outra mudança que os indígenas não estão aceitando é a substituição Heródoto Jean, atual coordenador Técnico da Funai em Atalaia do Norte. Francisco Pianco dizia que estava ali para ouvir as lideranças, mas não aceitava o posicionamento delas contrário à mudança da coordenação regional. Enquanto o assunto está sendo discutido em Brasília nestes dias, nas aldeias do Vale do Javari há forte resistência contra a nomeação de um funcionário recém-contratado pelo órgão indigenista a quem as lideranças presentes ao IV encontro dos Kanamari deram lugar na mesa de expositores mas sequer o deixaram falar. 

Os motivos do descontentamento dos indígenas não param por aí. Há denúncias de invasões de pescadores e madeireiros em vários dos rios que cortam a terra indígena, ameaçando até mesmo povos isolados, como os Korubo que em anos passados foram vítimas de muitos massacres. “Antes, somente os homens apareciam nas praias. Hoje, eles vão com a família toda, até com crianças, porque há muito tempo não acontecem conflitos, graças à demarcação da terra”, explicou Fabrício Amorim, coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental do Vale do Javari.

O assessor do presidente da Funai foi muito bem recebido pelos indígenas, mas muito pouco do seu discurso tem novidade para eles. Pianco reforçou a idéia de que o estado brasileiro não sabe ou não quer mesmo dialogar com os povos indígenas. Quer, porém, como se diz popularmente, “empurrar goela abaixo” as ações governamentais – muitas das quais contrárias aos interesses dos indígenas. Por essas e outras o pajé Kanamari sugeriu: “Funai tem que apanhar de couro de anta!”. (Cimi Norte1)

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