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Ciente da falta de R$ 45 bi à saúde, Câmara deve barrar novo imposto

 Depois de 1,2 mil dias, a Câmara deve concluir, nesta quarta-feira (21), a votação de projeto que impõe gastos mínimos em saúde por parte do governo federal, estados e prefeituras. E, mesmo sabendo que seriam necessários mais R$ 45 bilhões anuais para que o modelo de saúde gratuito e universal previsto na Constituição funcione melhor, os deputados tendem a rejeitar a criação de um imposto destinado ao setor.

 A estimativa de déficit financeiro do Sistema Único de Saúde (SUS) foi apresentada à Câmara nessa terça-feira (20) pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, durante debate no plenário em formato de “comissão geral” – qualquer um pode participar, não só parlamentar. “Vai ser fundamental ter mais financiamento para a saúde”, disse.

 Numa apresentação de 50 minutos, o ministro esforçou-se por mostrar tudo o que o governo tem feito para melhorar a gestão da saúde, algo sempre invocado pelos adversários de um novo imposto como iniciativa que ajudaria a qualificar o SUS. Enfatizou o gigantismo do SUS, com números como a quantidade de procedimentos anuais (3,2 bilhões) ou de transplantes realizados (21 mil, aó perde para os Estados Unidos).

 Citou que pesquisas de opinião costumar revelar que a saúde lidera o ranking de preocupações dos brasileiros – é a área de pior avaliação do governo, embora mais de 70% dos usuários do SUS aprovem-no. Comparou as despesas brasileiras (menores) com a de outros países (maiores).

 Disse ainda que o modelo concebido em 1988 precisa ser reorganizado, porque o Brasil de hoje está muito diferente – é o país cuja população mais envelheceu em 10 anos. “Para dar conta dessa nova realidade, nós precisamos ter uma política que garanta investimentos crescentes”, disse.

 A exposição destinava-se a sensibilizar deputados para a necessidade de contornar a insuficiência financeira do SUS. O sistema precisaria ter um caixa um terço mais polpudo – no ano passado, segundo o ministério, a despesa conjunta de todo o setor público com saúde foi de R$ 138 bilhões.

Estados e municípios
No debate, a posição de Padilha foi endossada e reforçada por dois secretários de saúde que ali estavam a representar, como vice-presidentes, os conselhos estadual e municipal do setor.

“Se não tivermos dinheiro novo, vamos frustrar expectativas”, disse Michele Caputo Neto, secretário no Paraná, estado administrado por partido adversário do ministro, o PSDB. “Tem de melhorar a gestão, mas não tenha dúvida de que, hoje, o ponto central é o subfinanciamento”, disse Gustavo Couto, secretário em Recife, cujo prefeito é petista como Padilha.

 Embora ministro e secretários houvessem defendido mais dinheiro à saúde, tinham usado apenas palavras como “financiamento” ou “subfinanciamento”. Nenhum arriscara-se a pronunciar “imposto” ou “tributo” novo.

 O silêncio foi quebrado pelo economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flavio Castelo Branco, convidado a participar da comissão geral pelo PSDB. “O financiamento à saúde deve se dar com recursos que já existem. Não há necessidade de criar novo tributo ou de elevar tributo já existente”, disse Castelo Branco.

 Ele sustentou a argumentação em duas pesquisas da entidade. A primeiro, encomendada ao Ibope, mostra que, para os brasileiros, a saúde mehora com gestão, não com dinheiro. A segunda, feita pela própria CNI, indica que os industriais reprovam o atual sistema tributário brasileiro.

 Antes mesmo do discurso do economista, assessores da CNI haviam distribuído cópias da pesquisa pelo plenário da Câmara, para deputados e jornalistas, deixando bem clara qual é a posição do setor.

Xadrez político
 Quando chegara, enfim, a hora de líderes partidários e deputados se manifestarem na comissão geral, houve uma unanimidade: a saúde precisa, de fato, de mais dinheiro. Mas o caminho apontado para enfrentar o problema variou de acordo com a posição do orador no xadrez político. Se mais à esquerda ou governista, simpático a imposto novo. Se mais à direita ou na oposição, a favor de combate a desperdício ou desvios.

“Os pobres merecem uma saúde de melhor qualidade (…) Por isso, vamos prosseguir nesse debate e propor uma fonte segura para a saúde”, disse o líder do PT, Paulo Teixeira (SP).

“Se não temos ambiência [sic] para votar a CSS [o imposto novo], temos que avançar sobre outras fontes”, afirmou, em nome do PCdoB, a deputada Jandira Feghali (RJ).

“A doença crônica da saúde brasileira é essa do financiamento”, disse o líder do PSOL, Chico Alencar (RJ).

“Há subfinanciamento da saúde. Mas governar é escolher. Vamos rejeitar a recriação do imposto do cheque”, disse o líder do PSDB, Duarte Nogueira.

“A resposta não é com um novo imposto, é priorizar a saúde pública”, disse o líder do PPS, Rubens Bueno (PR).

“O que temos de fazer é a gestão [melhor] de recursos abundantes [no orçamento]”, disse o líder do bloco PSDB-DEM-PPS, Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).

Um dos partidos que mais pressionam pela votação do projeto engavetado há mais de três anos, o PMDB, que em fórum recente decidiu explorar a bandeira da saúde no ano que vem, exibiu no debate sua conhecida heterogeneidade.

O coordenador da Frente Parlamentar da Saúde, Darcísio Perondi (PMDB-RS), falou como um oposicista. “Dinheiro [no orçamento], tem. É uma questão de escolha governamental.”

Já o deputado e ex-ministro da Saúde Saraiva Felipe (MG), ao discursar em nome da liderança do PMDB, foi mais governista. “Nós precisamos de dinheiro para salvar o SUS”, afirmou.

Pouco antes do fim do debate, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), deu uma entrevista à imprensa para resumir o sentimento médio dos deputados sobre a situação na saúde. “Não há clima para criar imposto para a saúde ou qualquer outra política pública”, disse.

Tendência
Sem clima – ou disposição – para aprovar um imposto novo só para a saúde -, o que a Câmara vai fazer, ao votar a concluir a votação do projeto 1,2 mil dias depois, explica uma autoridade envolvida diretamente nas negociações – é “tirar um peso das costas” e “jogá-lo para o Senado”.

A proposta que deve ter sua votação encerrada na Câmara nesta quarta-feira (21) foi apresentada por um senador, o médico Tião Viana (PT), hoje governador do Acre. O texto original não criava um imposto. A chamada Contribuição Social para a Saúde (CSS), uma espécie de CPMF mas com alíquota de 0,1%, não 0,38%, foi sugerida na Câmara.

O projeto empacou na Câmara, em junho de 2008, quando o DEM pediu para que a CSS merecesse uma votação específica, separada do restante do projeto. É isso que vai acontecer nesta quarta. (Correio do Brasil)

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