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“Eu queria saber por que eles querem tomar minha empresa”

A organização e a tranqüilidade do apartamento em um sofisticado condomínio de Rio Branco não refletem o período turbulento por que passa a vida do casal Rosenilda Matias da Rocha e José Maria Branco. Eles vieram de Cuiabá e, em 2009, resolveram investir na compra de uma empresa instalada no parque do Novo Distrito Industrial, a Eufran Indústria e Comércio de Lâminas Ltda. A unidade deveria beneficiar madeira, produzindo laminados. Até aí, a história não traz nada de excepcional.
Empresa
Segundo o casal, os problemas com a empresa começaram junto com a gestão do atual secretário de Estado de Indústria e Comércio, Edvaldo Magalhães. Em junho deste ano, a Comissão de Política de Incentivos às Atividades Industriais (Copiai) revogou o processo de concessão da Eufran. A notificação, referendando o processo nº 119/2005, é assinada pelo secretário Edvaldo Magalhães e formaliza a decisão da Copiai.

Rose (como prefere ser chamada) e José Maria afirmam que há articulações que eles consideram de ‘natureza política’ para beneficiar a empresa Ouro Verde, vizinha da indústria Eufran no Parque Industrial. O governo argumenta que a empresa não mantém atividade produtiva e que, não teria, por lei, como manter o termo de concessão.

“Os procuradores sabem que o argumento que eles estão usando para defesa é fraudulento”, dispara José Maria Branco, marido e sócio de Rose. “Inclusive, eles pegaram uma declaração de um diretor da Sefaz de que a empresa nunca funcionou nem precariamente”. O casal alega que tem como provar que houve fraude de documentação.

O capital investido, segundo o casal, é de R$ 15 milhões, nos 5,5 mil m² do lote concedido pelo Estado. Durante a entrevista, declarações feitas com calma e em detalhes são entrecortadas por momentos de revolta. Acompanhe os principais trechos.

ENTREVISTA

A GAZETA – Quando vocês adquiriram a empresa Eufran?
Rose – Em 2009. Nesse período, nós tínhamos uma ligação com o pessoal da Secretaria de Floresta, com o Rezende [Carlos Ovídio, mais conhecido como ‘Resende’. Assessor do atual secretário de Floresta]. Uma ligação boa… aí foi só entrar o Edvaldo que mudou o tom.

A GAZETA – Por que a relação mudou?
Rose – Estava tudo tranquilo. Para mim, estava tudo certo. Estávamos investindo, fazendo aterro, fazendo muro. Aí, quando o Edvaldo entrou, por causa da mudança de gestão, aí foi quando eu tive o problema.

A GAZETA – Que tipo de problema?
Rosa – Ele queria que eu voltasse com as atividades de empresa em período de chuva.
José Maria – Eles vão para a televisão e falam que estão incentivando os empresários a investir no Acre. Todas as empresas do parque (nós te mostramos aqui as escrituras)… Todas foram escrituradas… Empresas com um ano e meio a dois anos. Foram escrituradas pra quê? Para ‘levantar dinheiro’ para gerir a empresa junto ao BNDES, Basa. Nós já estamos indo para seis anos e, em vez de incentivar, eles estão tomando.

A GAZETA – Qual o interesse do Governo em não querer que a Eufran esteja em operação?
José Maria – Tomar.

A GAZETA – Mas, com qual finalidade?
Rose – Eu queria saber por que o Edvaldo tomou essa atitude: de publicar… de colocar no Diário Oficial já tomando… que eu tinha trinta dias para desocupar… foi por isso que eu entrei com um mandado de segurança.
José Maria – Os procuradores sabem que o argumento que eles estão usando para defesa é fraudulento. Inclusive, eles pegaram uma declaração de um diretor da Sefaz de que a empresa nunca funcionou nem precariamente. Se eu te mostrar os documentos da própria Sefaz, dos faturamentos da empresa… quer dizer… eles estão fraudando documentos na Justiça… tudo isso com o intuito de quê?

A GAZETA – A senhora buscava o processo desde fevereiro?
Rose – Não. A partir do momento que ele me deu cinco dias para voltar às atividades normais na empresa… no dia 24 de maio ele me deu essa notificação eu fui até ele. Fui lá. Conversar com o Edvaldo. Quando eu cheguei lá, ele disse que não ia se sensibilizar nem com o meu problema de saúde e nem pelo problema da empresa. Só que ele já tinha tomado a decisão.

A GAZETA – A senhora alega que está sendo vítima de uma ‘perseguição política’. Que explicação pode ser feita para esse problema?
Rose – Eu só sei que pode ser por causa do meu cunhado.

A GAZETA – Como é o nome do seu cunhado?
Rose – João Branco [ex-presidente da União Democrática Ruralista no Acre na década de 80. A UDR é o grupo apontado como envolvido no assassinato do líder seringueiro Chico Mendes em 1988]. Por que precisou seis anos e precisou do Tião [Viana, governador do Acre] entrar para me tomar o que é meu?

A GAZETA – Como a Ouro Verde pode estar envolvida nisso?
José Maria – Ele [Mário Santi, proprietário da Ouro Verde] fez o muro dele em cima da divisa. Não respeitou. Aí, nós descobrimos o porquê. Ele já tinha ido no Governo pedindo a metade do nosso terreno. Ele não queria que fizesse o muro porque ele já estava pressionando o governo para tomar. E ele está por detrás disso aí.

A GAZETA – A senhora está disposta a ir até que ponto?
Rose – Até quando tiver Justiça. Eu quero que a Justiça me prove o contrário que justifique ele tomar a empresa. Se aqui não der, eu vou a Brasília. Por que eles colocaram uma fiscalização na minha empresa agora me dando 48 horas para apresentar todo movimento financeiro da empresa? Por que eles não tomaram dos ex-donos?

Magalhães: “quem fraudou documentos foi a empresa Eufran”
O secretário de Indústria e Comércio, Edvaldo Magalhães, assegura que a decisão da Comissão de Política de Incentivos às Atividades Industriais (Copiai) se fundamenta estritamente em critérios técnicos nas avaliações que realiza. Fazem parte da comissão, a Cooperacre (cooperativa de trabalhadores), Sebrae, Federação das Indústrias, Federação da Agricultura, Associação Comercial, Secretaria de Fazenda, Procuradoria Geral do Estado, Senai e Sedict. “Ao governo interessa que todos os empreendimentos do parque industrial funcionem”, afirmou. “As concessões feitas têm cláusulas muito claras e todos que receberam a concessão sabem que concessão vincula a permanência da concessão ao empreendimento estar funcionando”.

Sobre a Eufran Indústria e Comércio de Laminados Ltda., o secretário é categórico. “Esse empreendimento nunca funcionou”. E mais. “Esse empreendimento nunca gerou um único emprego e só tem sentido o Estado fazer concessões seja de áreas ou de incentivos tributários para empreendimentos que gerem pelo menos os empregos e gerem as riquezas necessá-rias que justifiquem as concessões e incentivos fiscais”.

E Magalhães faz um alerta. “Seja esse empreendimento ou qualquer outro dentro do parque que não respeitem as cláusulas terão as concessões canceladas”.

Sobre as supostas manobras políticas feitas pelo governo para beneficiar a empresa Ouro Verde, o secretário faz a seguinte diferenciação. “Sobre isso, há uma contradição”, explica. “A Ouro Verde já tem concessão, já tem área dentro do parque e nem é concorrente direta desta empresa. A Ouro Verde não trabalha com laminados”.
Sobre a acusação feita pelos empresários de que houve fraude de documentos por parte do Governo do Acre, o secretário foi direto. “Dentro do processo está comprovado quem falsificou documentos. Foi a empresa Eufran”.

Ouro Verde diz não se interessar pela área
O empresário Mário Santi, proprietário da Ouro Verde, nega interesse pela área da Eufran. “Eu tenho a minha própria propriedade e não há fundamento algum em supostas manobras para me beneficiar”, afirmou. “Se eu tivesse interesse nessa área, eu teria comprado dos donos anteriores quando eles me ofereceram”.

Santi diz que a oferta foi feita em 2009, ano que o casal Roselinda Rocha e José Maria Branco adquiriram o empreendimento. “Eu não tinha interesse porque eu já tinha uma outra área para expansão da Ouro Verde cedida pelo próprio governo”, detalha. A área da Ouro Verde, que já possui projeto específico de expansão, fica em frente à atual sede e possui 84 de frente por 250 metros de fundo. “A área foi cedida pelo Governo em 2008 ou 2009”, informou. “Eu já investi muito ali e não me interesso por outras áreas”.

A equipe de A GAZETA tentou ouvir o empresário Jandir Santi (citado na denúncia dos donos da Eufran Indústria e Comércio de Laminados Ltda) na sede da Triunfo. A assessoria do empresário informou que ele “estava viajando”.

 

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