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Derrocada moral

No Iluminismo, acreditava-se que a idade da superstição e da barbárie estava a ser progressivamente substituída pela ciência e pela razão, atribuindo-se à história uma linha evolutiva de caráter moral. Triste engano, pois nem mesmo aquela “educação” moral de inculcar nas pessoas o medo às conseqüências da não observância da lei, não surte mais efeito. Corremos o risco de destruir a moral. Ou pior, estamos presenciando a derrocada da moral.

O pouco que resta, atualmente, de integridade moral entre os homens, notadamente no campo dos “bons costumes”  é remanescente da moral advinda da igreja, da família e da escola, que tinham um código moral unificador e que davam à conduta humana a maioria das regras do jogo da vida. Graças à iniciação, imitação ou instrução, transmitida pela igreja, pelos pais e pelos professores, a herança mental de grupo ou comunidades passou de geração a geração e chegou até nós, como instrumento que elevou o homem acima da pura animalidade.

Tem gente, por aí, que ojeriza o termo “bons costumes”. Outros consideram anacrônico, atrasado esse negócio de “bons costumes”. Além do mais, a maioria mal sabe, pois não consulta o Aurélio, que “bons costumes” é  atitude ou valor social consagrado pela tradição e que se impõe aos indivíduos do grupo e se transmite através de gerações. Assim, lá e cá ou cá e lá, deixam de lado os bons costumes de, por exemplo,  saber que quando terminam os meus direitos, começam os do meu vizinho. Coisa simples, não é!

Num passado bem recente, aproximadamente duas décadas, isto é, praticamente ontem, este escrevi-nhador proclamava com toda convicção que o brasileiro era a pessoa mais honesta do mundo. O argumento se embasava ou embasava-se no simples fato de grande parte do povo, neste país, trabalhar trinta dias para receber um salário mínimo. O tempo passou velozmente e, presentemente, difícil é encontrar algum indivíduo, especialmente jovem que queira trabalha por um salário mínimo mensal. O que aconteceu? A resposta é simples: É fácil, atualmente, ganhar dinheiro com negócios ilícitos. Negócios sujos. Uma “parada” aqui outra acolá! Essa atitude ilícita, em relação ao nosso próximo é mesmo um mistério, um enigma para o pensamento.

Com o desaparecimento destes valores, alguns até questionados à luz de teorias sem qualquer senso ético, passamos a viver uma derrocada moral. Como se não bastassem os desastres geológico e as profundas mudanças climáticas, bem como as epidemias quase incontroláveis, que assolam o mundo aqui e ali; Como se não bastassem à exaustão da terra madre que somados a escassez de recursos naturais, derivados do petróleo e de outras  matérias-primas tornam a vida nossa de cada dia mais difícil. Alem de todos esses tsunamis temos que viver com a decadência mental e moral causada, especialmente, pelo mundo urbano cujo carro-chefe é: a desordenada vida sexual; o consumismo exagerado e; a entrega globalizada da juventude as drogas alucinógenas.

 O jovem dos tempos pós-modernos é portal do crime. Todos os dias surgem dos quatro cantos do mundo, relatos lamentáveis sobre: homicí-dios, assaltos à mão armada, lesões corporais e tráfico de drogas envolvendo diretamente crianças e adolescentes. Na realidade só estou reverberando um clamor geral no que toca o assunto da delinqüência juvenil, da prostituição e exploração de crianças e adolescentes. O que se configura, se providências não forem tomadas, numa derrocada moral, pois se constata por pesquisa de toda ordem que hoje no Brasil, 99% dos crimes são praticados ou têm os adolescentes e jovens como protagonistas.

Alguém pode contra-argumentar que, além de eu ser repetitivo, sou também pessimista e  anacrônico. Que a minha visão é no mínimo esclerosada ou obsessiva. Que sou um teorista do tipo “imprensa marrom”. Afinal, o mundo está ótimo. Vamos até promover a Copa do Mundo de 2014.   

Reconheço que não tenho o otimismo de alguns políticos locais que, em dias passados, ultimaram esforços junto às autoridades mor deste país, com o fim de tornar Rio Branco subsede da próxima Copa do Mundo. Enquanto isso o nosso aeroporto está completamente sucateado. Trata-se, contudo, de uma questão de prioridade. Também, não estou entre os que “acham” que tudo vai bem como querem e proclamam os diversos apóstolos religiosos do presente século, pródigos em fazer uso da pedagogia da promessa.  Por outro lado, não tenho capacidade  ilusionista de transformar aquilo que é voraz, que subverte ou consome que corrói e destrói no melhor dos mundos, violência e destruição em argumento filosófico, matança em litígio e derrocada moral em paraíso. Mesmo porque, já dizia, há 1.900 anos,  o geógrafo Estrabão:  “Lidando com uma multidão de mulheres e homens, massa promíscua, o filósofo não consegue influenciá-los pela razão”. Nem mesmo um estudioso de filosofia por longos 45 anos, como este velho escrevinhador, que deveria viver tranqüilo e indiferente aos preconceitos e convenções sociais, resiste a essa derrocada moral.

 

* Pesquisador Bibliográfico em Humanidades. E-mail: assisprof@yahoo.com.br

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