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Caixa Econômica Loteada

Helder CaldeiraVocê acha mesmo que a Caixa Econômica Federal é um banco estatal, uma instituição financeira pública com patrimônio próprio e autonomia administrativa? Em que planeta você vive? Hoje, a CEF é uma capitania que pertence, de porteira fechada, ao PT e ao PMDB. Os dois principais partidos do governo federal controlam os principais cargos de diretoria da instituição e estão se engalfinhando por mais poder dentro do banco. Nesse ínterim, descobre-se que Caixa está no centro de suspeitíssimas transações financeiras que podem causar um prejuízo de R$ 1 bilhão aos cofres públicos, ou seja, ao bolso do contribuinte brasileiro.

A suspeita de fraude na Caixa veio a público no último domingo, em denúncia do jornal Folha de São Paulo, assinada pelos jornalistas Natuza Nery, Dimmi Amora e Rubens Valente. Segundo os dados sigilosos que a Folha teve acesso, uma corretora carioca chamada Gestora de Recebíveis Tetto vendeu títulos da dívida pública brasileira de baixo ou nenhum valor por preços muito acima do valor de mercado. Entre os compradores estão várias empresas, outros bancos, investidores e até o estatal Postalis, fundo de previdência dos funcionários dos Correios. As negociatas foram realizadas entre setembro de 2008 e agosto de 2009, período em que o sistema de informática responsável pela emissão e fiscalização desses títulos ficou fora do ar.

Esse misterioso e impressionante apagão no sistema de informática da Caixa, que só voltou a funcionar em fevereiro de 2011 (ou seja, foram 2 anos e 5 meses fora do ar!), é o fator principal que pode ter permitido a suposta fraude. O sistema é responsável por avaliar e conferir o real valor dos papéis da dívida pública oferecidos no mercado. Dessa forma, a denúncia afirma que a Tetto comercializou títulos com valores inverídicos. Em outras palavras, vendeu gato por lebre. Como esses títulos são garantidos pela União, os cofres públicos terão que devolver cerca de R$ 1 bilhão aos compradores ludibriados. Em suma, somos nós quem vamos pagar a conta!

Por sua vez, a Tetto afirma que não cometeu nenhuma fraude e que obedece às autoridades da Caixa e que os créditos só foram emitidos mediante informações do próprio banco estatal. Mas chama atenção um imbróglio partidário envolvido: durante todo esse período onde teria acontecido a fraude, tanto o setor responsável pelo sistema de informática da Caixa que estava “apagado”, quanto o fundo de previdência Postalis dos Correios, eram controlados pelo PMDB. E mais: o acesso aos documentos sigilosos das investigações dessa negociata bilionária, que permitiram a matéria da Folha de São Paulo, foi concedido justamente no momento em que o PT tentava tirar do “partidão” o controle dos investimentos com FGTS na administração da Caixa Econômica Federal. Ou seja, isso fedeu ao famigerado “fogo-amigo”.

É a própria Folha de São Paulo, em matéria assinada por Valdo Cruz e Andréia Sadi, dois dias antes da matéria-denúncia, quem revela a existência de um perigoso atrito entre líderes dos PMDB e do PT na disputa pelo posto-chave de controle do FI-FGTS, um fundo de investimentos formado com recursos do FGTS e que tem cerca de R$ 19 bilhões aplicados em empresas com projetos de infraestrutura, como estradas, portos, aeroportos e hidrelétricas. O cargo em questão, no Conselho Curador do FGTS, é ocupado pelo vice-presidente de Fundos e Loterias da Caixa, uma indicação peemedebista. Como seu mandato no conselho chegou ao fim, deu-se a querela entre os dois maiores partidos pelo preenchimento da vaga. Já diz a máxima mamateira: em política, não existem espaços desocupados.

A ocupação desses cargos de diretoria na Caixa envolve tanto dinheiro e tantos interesses que líderes peemedebistas ameaçaram retaliar a presidente Dilma Rousseff em votações importantes no Congresso Nacional. Um dos maiores desesperos do Palácio do Planalto era que o PMDB decidisse colocar sua bancada em apoio ao reajuste salarial reivindicado pelo Poder Judiciário e que pode causar um insuportável impacto no orçamento de 2012. Para mostrar o tamanho do seu cacife na Justiça brasileira e pressionar a presidente da República, na semana passada bastou um pedido especial dos líderes peemedebistas ao presidente do STF, ministro Cezar Peluso, e o Supremo liberou a posse do senador Jader Barbalho (PMDB-PA), barrado pela Lei da Ficha Limpa e com processo que aguardava julgamento dos nobilíssimos togados.

Como, ao que tudo indica, o PMDB é tão forte que manda até no Supremo, a cúpula política da presidente Dilma agiu rapidamente para renovar o mandato do vice-presidente de Fundos e Loterias no Conselho Curador do FGTS. Mas, até que isso ficasse decidido politicamente, uma “turma” vazou a documentação sigilosa sobre a suposta fraude de R$ 1 bilhão no banco estatal. Esse é o resultado da ilha da fantasia que virou Brasília, transformando a administração pública num punhado de apaniguados desqualificados e sem qualquer compromisso com a ética e com a responsabilidade funcional. Não seria diferente nos bancos. Hoje temos uma Caixa Econômica completamente loteada.

Escritor, Jornalista Político, Palestrante e Conferencista

www.heldercaldeira.com.brhelder@heldercaldeira.com.br“>helder@heldercaldeira.com.br

*Autor do livro “A 1ª PRESIDENTA”, primeira obra publicada no Brasil com a análise da trajetória da presidente Dilma Rousseff e que já está entre os livros mais vendidos do país em 2011.

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