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Não há glória sem suor e sem disciplina

O debate sobre os aprovados no processo seletivo da Ufac para ingresso na instituição em 2012, com base nas notas do Enem 2011, tomou conta das redes sociais durante toda a semana que passou. As informações da Ufac dão conta de que 76% dos aprovados são acreanos, nascidos ou residentes no Acre, o que perfaz 1.560 das 2.050 vagas. É um número expressivo. A SEE está procedendo com o cruzamento de dados dos aprovados com os dados dos nossos alunos para informar a todos quantos daqueles são egressos de escolas públicas.

A par das estatísticas, li muitas reflexões empíricas afirmando que os estudantes acreanos foram prejudicados em virtude do aumento da concorrência decorrente da adoção do Enem, sobretudo nos cursos de maior procura, tais como Medicina, Direito e Engenharia. Fundados em tal premissa, alguns defenderam a volta do antigo vestibular, maculado por um histórico de fraudes, provas mal elaboradas, problemas na correção e ausência de coesão/previsibilidade quanto à linha de abordagem na elaboração das questões a cada ano. Outros defendem a criação de uma universidade estadual, como forma de ampliar o acesso de acreanos ao ensino superior, cujos custos de implantação e manutenção drenariam os recursos hoje destinados à educação básica, obrigação constitucional dos Estados Federados, ao contrário do ensino superior, cuja atribuição recai sobre a União Federal e a iniciativa privada.

Acredito que toda reflexão é válida. Contudo, cursos concorridos como a Medicina, por exemplo, sempre apresentaram baixos índices de acreanos aprovados, mesmo antes do Enem. O problema, portanto, não é a adesão ou não ao Enem, pelo contrário: a matriz de avaliação do Enem é mais próxima da matriz de capacidades (habilidades e competências) e objetivos de aprendizagem adotada no currículo do Ensino Médio da rede pública. Uma avaliação que guarda relação de convergência com o currículo e seus respectivos componentes e conteúdos e, por conseguinte, com o trabalho cotidiano do professor das escolas públicas em sala de aula, traz vantagem tanto aos alunos acreanos quanto aos alunos de outros lugares.

A concorrência aumenta com a adoção do Enem? Sim, é verdade. A maioria dos alunos aprovados nos cursos mais concorridos são sim oriundos de outros estados, mas não das escolas públicas: são, em sua maioria, alunos egressos de escolas privadas e cursinho preparatórios cujas mensalidades custam, em média, mais de R$ 1.000,00. São alunos que estudam de 4 a 6 horas diárias além do período em que permanecem na escola ou no cursinho. E são alunos que, em sua imensa maioria, estão na sua 2ª, 3ª ou 4ª tentativa de ingressar em uma universidade pública.

O que é mesmo relevante nesse debate, portanto, nos remete ao que preceitua nossa Constituição Federal: que a educação é dever do estado e da família. O Estado, como mantenedor da rede pública de educação básica, tem a sua responsabilidade e tem procurado fazer a sua parte, adotando soluções cirúrgicas para cada um dos gargalos e pontos de estrangulamento cuja resolução importe em melhoria da qualidade do ensino; os diretores de escolas e suas equipes, na condição de gestores, também têm suas responsabilidades e se dedicam para cumprilas; os professores, na condição de responsáveis pelos conteúdos curriculares, também tem suas obrigações e igualmente se esforçam para dar conta dessa missão. Os pais também têm sua parcela de contribuição e a maioria, acredito, faz o que está ao seu alcance. Contudo, a responsabilidade maior sempre foi e sempre será do próprio aluno. O chamado “fator aluno” é preponderante em toda e qualquer avaliação. Nossos alunos são guerreiros, esforçados, dedicados, mas isso não é a realidade da maioria. É preciso desenvolver a cultura da dedicação extremada ao estudo, do esforço recompensado: não há glória sem suor e sem disciplina.

Os dados e indicadores de acesso, permanência e sucesso da educação do Acre dos últimos anos são bastante animadores. Ampliamos o número de matrículas a cada ano, sendo 4.300 novas vagas só no ano de 2011, em um total de 155 mil alunos, sendo que destes, 11.000 já são considerados alunos de tempo integral; radicalizamos a política de valorização profissional, tanto na questão salarial quanto na formação dos nossos profissionais, com aumento de 20% nos salários entre 2011 e 2012 e a marca de 94% de professores que concluíram nível superior ao longo de 13 anos, com capacitação de 5.000 professores em jornadas de formação continuada só no ano de 2011; implantamos uma rede de reforço escolar e apoio pedagógico no contra-turno, para atendimento de mais de 7.500 alunos em dificuldades nos estudos, só no ano que passou; adotamos uma grande agenda de inovações na educação, que contou com a inclusão digital de alunos e professores do 3º ano do ensino médio, por intermédio da distribuição de 8.873 netbooks, implantação do Desafio On-Line e das Olimpíadas de Jogos Digitais e Educação (OJE); reformulamos o ensino de línguas estrangeiras com a criação do Centro e dos Núcleos de Estudos de Línguas (CEL e NELs); e, por fim, reduzimos o índice de analfabetismo entre a população acima de 15 anos em 8 pontos percentuais, caindo de 25,4% no ano de 2000 para 16,4% em 2010, segundo dados do IBGE.

Essas e outras medidas foram essenciais para que obtivéssemos um crescimento de mais de 5% no desempenho de proficiência em Língua Portuguesa e Matemática dos alunos de 95% das escolas avaliadas por nosso Sistema Estadual de Avaliação da Aprendizagem Escolar, o Seape, realizado no Acre desde o ano de 2009 e que, em 2011, avaliou 36.990 alunos do 3º, 5º e 9º ano do ensino fundamental e 3º ano do ensino médio, das redes municipais e da rede estadual. E para que estejamos classificados na 10º posição nos anos iniciais do ensino fundamental; 4ª posição nos anos finais do ensino fundamental; e 7ª posição no ensino médio, considerando o ranking de todos os Estados brasileiros no IDEB 2009.

Não quero dizer com isso – e nunca afirmei tal coisa – que não há o que ser melhorado no tocante às dimensões estratégicas da política educacional do nosso Acre, sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Educação e Esporte e toda a sua rede de escolas públicas. Há que se avançar a cada ano na valorização profissional, na melhoria da infraestrutura e da gestão escolar, no aperfeiçoamento do currículo, na utilização dos resultados das avaliações externas de larga escala como orientadores do planejamento pedagógico anual de nossas escolas, no aperfeiçoamento do regime de colaboração existente entre o Estado e seus municípios e no fortalecimento e ampliação da educação integral, só para citar os pontos mais importantes. Tudo isso resultará, como efetivamente tem resultado ano-após-ano, em melhorias gradativas na qualidade da oferta e na equidade do atendimento da educação pública do Acre. E certamente, ao cabo de cada ano, teremos uma quantidade cada vez maior de alunos oriundos de escolas públicas ingressando em instituições de ensino superior.

* Daniel Queiroz de Sant’Ana é secretário de Estado de Educação.

 

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