X

Safra perdida em seringais de Rio Branco agrava situação de trabalhadores ribeirinhos

Por não ter terras regularizadas e sem a referência do calendário de produção formulado pela Embrapa, agricultores familiares não têm acesso a seguro-agrícola.  Ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, assegura que dará um “tratamento diferenciado”, mas não detalha de que forma isso será feito. Os problemas dos ribeirinhos ainda nem começaram. Quando as águas baixarem, a produção será refeita. Farinha e banana são dois produtos que devem ter alta nos preços quando acabar o atual estoque. O que deve ocorrer em menos de um ano. A promessa ministerial não afasta o drama dos trabalhadores que têm o sofrimento amenizado pelo trabalho em parceria do Governo do Acre e da Prefeitura de Rio Branco por meio da Secretaria de Agricultura e Florestas. Ao receber sacolões, muitos agricultores agradecem, mas não conseguem esconder certo constrangimento.
Ramal do Belo Jardim, no Seringal Catuaba, virou um rio. No mínimo um ano para começar a reverter prejuízo
Em todo Estado, os prejuízos com as cheias dos rios Acre, Purus e Iaco já ultrapassam R$ 22,8 milhões. Só em Rio Branco, um relatório preliminar da prefeitura estima em R$ 12,4 milhões os prejuízos relacionados à agricultura familiar e ribeirinha.

Os números foram apresentados aos ministros da Integração Nacional, Fernando Bezerra, e das Cidades, Aguinaldo Ribeiro, durante visita aos pontos mais críticos da Capital na última quinta-feira.

A mudança na rotina e as perspectivas do prejuízo para as famílias ribeirinhas no curto e médio prazos esboçam um cenário dramático à agricultura familiar da região.

Nos seringais e projetos de assentamento como o Catuaba, Extrema, Água Preta, Barro Alto, Liberdade, Limoeiro, Quixadá, Oriente, Panorama Ribeirinho, Bagaço, Moreno Maia impressiona o nervosismo presente no dia a dia da comunidade.

Famílias inteiras se esforçam para salvar a macaxeira que ainda é possível ser transformada em farinha puba, a única modalidade de farinha possível de ser feita agora. A farinha puba é mais amarelada, grossa, fermentada e suporta maior quantidade de água durante o processo de feitio.
Acostumados a produzir o que comem, agricultores recebem sacolões da prefeitura
Outra dificuldade encontrada pelos ribeirinhos tem relação com a falta de eletricidade. Praticamente todos já adotaram a energia elétrica do programa de eletrificação rural Luz para Todos como um insumo importante durante o processo produtivo.

Por medida de segurança, a Eletrobras interrompeu o fornecimento de energia elétrica no Seringal Catuaba, região com aproximadamente 80 famílias. Em todas as casas, a reclamação é uma só: por que interromperam a energia? Além de comprometer parte do processo de produção de farinha, a falta de energia elétrica impede a retirada da água dos poços artesianos.

Resultado: muitas famílias estão, inclusive, sem água potável para beber. As explicações sobre os motivos do desligamento da energia elétrica e o apoio no transporte de mantimentos são feitos pelo dedicado presidente da Associação dos Produtores do Catuaba, Cícero Medeiros Brandão, o Pita. “Áreas que nós não imaginávamos que iria alagar, alagaram. O Catuaba está debaixo d’água”.
Depressão piora os problemas dos ribeirinhos

Ribeirinhos não têm acesso ao seguro agrícola
Com as plantações perdidas por causa da enchente, os agricultores familiares e ribeirinhos poderiam acessar o seguro agrícola. Mas, eles não têm acesso por questões burocráticas.

O Governo Federal criou barreiras para o acesso ao seguro agrícola com a intenção de beneficiar os agricultores que mais precisam. São duas as principais exigências para o acesso ao seguro agrícola: ter a terra regularizada (título definitivo) e respeitar o calendário agrícola ainda não elaborado pela Embrapa para os trabalhadores agricultores da região.

“Sem esses dois fatores respeitados, em tese, não há como ter acesso ao seguro agrícola”, explica o secretário de Agricultura e Florestas de Rio Branco, Mário Jorge Fadel.
Plantações inteiras de banana e macaxeira foram perdidas. Piscicultura também teve perda total em muitas comunidades. Governo Federal promete apoio
“Uma alternativa que estamos pensando é mostrar ao Governo Federal que os ribeirinhos podem ter um tratamento semelhante aos pescadores, com o seguro-defeso”. Para Fadel, isso daria maior segurança ao agricultor ribeirinho que teria como garantir a subsistência da família enquanto se reestrutura dos efeitos das enchentes periódicas.

A ideia de Fadel se fundamenta na seguinte situação: para os ribeirinhos atingidos pela alagação, o trabalho de recuperação será feito sem nenhum dinheiro em caixa. Como garantir alimento para a família? Compra de material? Insumos?

“Se não houver, de fato, um tratamento diferenciado, a situa-ção para essas famílias ficará mais preocupante do que já está”, afirma Fadel. O secretário também afirma que essa enchente de 2012 obriga o poder público e os trabalhadores a tomarem uma nova postura em relação ao processo produtivo.

O ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, garantiu tratamento diferenciado para os agricultores ribeirinhos. “Vamos acionar o seguro agrícola às famílias atingidas em função da gravidade da situação aqui no Acre”, assegurou Bezerra.

Mudança de culturas
“Ter as margens alagadas é algo bom para a agricultura. Mas, o que nós temos que rever são as culturas que nós estamos plantando nas margens”, afirmou o secretário Fadel. Culturas como macaxeira, banana e outras espécies frutíferas não devem ser plantadas às margens dos rios. “Nós temos que plantar culturas de ciclo produtivo curto”.

Feijão e melancia são os dois exemplos imediatos quando se fala em “culturas de ciclo curto”. O desafio as secretarias de Agricultura e Florestas de Rio Branco é fazer com que o ribeirinho deixe de plantar macaxeira em beira de rio.

“Acho difícil”, opina o presidente da Associação dos Produtores do Catuaba, Cícero Medeiros de Brandão, o Pita. “Nós já temos uma base produtiva mais ampla do que a macaxeira”.

Um dos fatores que faz com que a macaxeira seja atrativa ao ribeirinho é a rentabilidade. A Secretaria de Agricultura e Floresta de Rio Branco avalia que 20 sacos da macaxeira com 50 quilos rende até R$ 1,2 mil, distribuídos na comercialização de pelos menos seis produtos (farinha; tucupi; goma; beiju; pé de moleque; coloral).

Preços pós-enchente
A Safra estima que haverá alta de preços da farinha e da banana em menos de um ano. Como aplicar benefícios oficiais com objetivo de garantir uma política de preços na pós-enchente é outro desafio que a Safra tem que responder de forma imediata.

Nesse momento, o atravessador já está de olho nos possíveis fornecedores localizados em regiões mais altas e não atingidas pela enchente. Técnicos da Safra devem intervir para que o agricultor não atingido segure o produto em estoque e não venda ao atravessador, enquanto emergencialmente reestrutura o plantio da nova safra. A ideia é minimizar o impacto da enchente no preço dos produtos.

“A lógica do atravessador é comprar por um preço baixo e vender com o máximo de lucro possível, enquanto nós trabalhamos para que o agricultor receba o preço justo pelo produto”, diferencia o secretário de Agricultura e Florestas de Rio Branco, Mário Jorge Fadel.

Novo ribeirinho

O poder público implantou mudanças estruturantes nos seringais próximos a Rio Branco. Quando uma tonelada beneficiada de farinha pode gerar até R$ 1,2 mil pelas contas oficiais, outra relação fica estabelecida: o ribeirinho, atualmente, busca a produção em escala.

Aquela imagem romântica (e não menos sofrida) do ribeirinho que produzia para garantir a subsistência praticamente não existe mais nas imediações de Rio Branco. Os aparelhos de Estado como energia elétrica, escolas, assistência técnica mudaram as referências da base de produção do trabalhador das beiras de rio.

Programas de piscicultura ampliam as bases de produção e elevam a renda. O consumo de bens duráveis. O acesso à informação e às diversas formas de publicidade por meio da televisão vai moldando uma nova cultura nos seringais próximos à Capital.

Política para ribeirinhos
A Safra considera que os agricultores do Vale do Juruá já têm uma “política para ribeirinhos” mais eficaz. Talvez isso responda, em parte, pelo fato de o Juruá ser uma região que produz feijão de maneira quase ininterrupta.


Marceneiros contabilizam prejuízos causados com a cheia do Rio Acre

RUTEMBERG CRISPIM
A cheia do Rio Acre trouxe muitos prejuízos para milhares de pessoas que tiveram que deixar suas casas, perderam móveis e estão nos abrigos ou residências de familiares e amigos. Os prejuízos em Rio Branco e em outros municípios são incalculáveis.
Bernardino: maquinário e madeira perdida pela cheia do Rio Acre
Para alguns marceneiros a situação é ainda pior. Além de atingir suas casas, as águas atingiram também as marcenarias, danificando máquinas e outros equipamentos, impedindo que continuem trabalhando.

Os marceneiros trabalhavam para concluir a encomenda de carteiras, mesas e armários da Secretaria de Estado de Educação (SEE). Agora, em meio aos prejuízos, eles aguardam as águas baixarem para voltar ao trabalho.
“Já perdi quatro máquinas e a madeira que estava no pátio vai ficar toda encharcada, sem falar da madeira, que está toda encharcada. Como estamos parados, não sei como vamos conseguir dinheiro para pagar os trabalhadores, que dependem desse trabalho para o sustento de suas famílias”, lamenta o marceneiro Francisco Bernardino.  

Servidores da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio, Serviços, Ciência e Tecnologia (Sedict), estão visitando as marcena-rias e verificando a situação dos empreendimentos.

A intenção é oferecer ajuda aos marceneiros, que desde o ano passado foram contemplados com o Programa de Apoio e Fortalecimento do setor Moveleiro. De acordo com as primeiras informações, marcenarias em Rio Branco, Sena Madureira, Brasileia, Plácido de Castro e Xapuri, foram atingidas pelas águas.

O primeiro levantamento revela que mais de 30 marcenarias, só em Rio Branco e Brasileia, estão paradas. Em algumas, a água está praticamente no telhado. A situação piora devido o acúmulo de pó de serra.
Com os incentivos do Governo do Estado, muitos marceneiros investiram na compra de novos equipamentos e contrataram novos trabalhadores. Animados com as compras governamentais, eles chegaram a comprar madeira para ficar no estoque.

Alguns conseguiram retirar equipamentos e madeiras, mas outros, confiando que as águas não chegariam às suas marcenarias, deixaram o maquinário, produtos e outros materiais nos empreendimentos. Resultado: perderam praticamente tudo.

A Sedict, através do Pólo Moveleiro, já anunciou apoio total aos marceneiros que tiveram as marcenarias atingidas pelas águas. Uma equipe de servidores vai acompanhar de perto cada empreendimento, contabilizando os prejuízos e buscando alternativas para ajudar os marceneiros.

O secretário Edvaldo Magalhães vai pessoalmente visitar os empreendimentos e conversar com os marceneiros. “Nós somos agradecidos por tudo que o Governo do Estado tem feito por nós. Sabemos da dedicação do secretário Edvaldo Magalhães e, agora, mais do que nunca, vamos precisar de mais ajudar”, disse Bernadino.

Piscicultores também ficam no prejuízo com a enchente
Piscicultores de todo Estado também amargam o sabor dos prejuízos. Empolgados com o complexo de piscicultura, que está sendo construído pelo Governo do Estado na BR 364, sentido Rio Branco/Porto Velho, alguns fizeram grandes investimentos na construção de tanques e na compra de equipamentos para melhorar a produção.

As águas do Rio Acre e de igarapés invadiram as propriedades e levaram os peixes. Em Rio Branco e em outros municípios muitos piscicultores estão no prejuízo. Milhares de peixes foram levados pelas águas.

A expectativa do Governo do Estado era que a produção de peixes aumentasse consideravelmente este ano, mas com os prejuízos da enchente, a expectativa é que a produção seja prejudicada.

O clima era tão favorável, que as obras do frigorífico do Complexo de Piscicultura de Rio Branco foram adiantadas. Tudo porque com apoio do Governo do Estado, os produtores estavam fazendo vários investimentos e a expectativa era de uma produção considerável para 2012.

Mesmo antes de contabilizar os prejuízos e do fim da enchente, o Governo do Estado já estuda uma forma de fazer novos investimentos no setor. A intenção é buscar uma alternativa para que os piscicultores possam continuar investindo e melhorando o processo de criação.

Enquanto o Centro de Reprodução de Alevinos, que será construído no Complexo de Piscicultura não fica pronto, o governo estuda uma forma de melhorar o acesso dos piscicultores aos alevinos.

Essa seria uma forma de incentivar e ajudar os piscicultores de todo Estado. “Nós vamos precisar muito de ajuda. Perdemos praticamente toda nossa produção. Fizemos investimentos e agora não temos outra alternativa. Esperamos pelo apoio das nossas autoridades”, disse o piscicultor, Cícero Medeiros.
Rio Iquiri também surpreendeu e quase invade área do Complexo de Piscicultura

Produção comprometida
Para se ter uma ideia dos prejuízos para os marceneiros, o Governo do Estado, assinou contratos que representam mais de R$ 5 milhões em compras diretas de marcenarias acreanas.

Algumas marcenarias já trabalhavam com a finalização de alguns produtos. Mesas, carteiras e armários ficaram debaixo d’água. A esperança dos marceneiros é que o nível das águas baixe o mais rápido possível para que possam voltar ao trabalho.

“Nossa esperança agora é que a situação volte ao normal para que possamos voltar ao trabalho. Temos que continuar nossa produção, pois temos nossos compromissos e precisamos garantir o sustento das nossas famílias”, explica o marceneiro João Feitosa.

Para evitar mais prejuízos, marceneiros estão utilizando marcenarias de amigos para continuar produzindo.

Categories: Acre Economia
A Gazeta do Acre: