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Breve reflexão sobre política e poder ( I)

Maria Lúcia de Arruda Aranha, no seu livro (antigo) Introdução à Filosofia, destinados a jovens e adultos do ensino médio, diz que múltiplos são os caminhos, se quisermos estabelecer a relação entre política e poder; entre força e violência; entre autoridade e coerção e persuasão; entre Estado e governo, etc. Por isso, diz-nos ela, é complicado tratar de política “em geral”. É preciso delimitar as áreas de discussão e situar as respostas historicamente.
“O conceito moderno de política está estreitamente ligado ao poder” (Norberto Bobbio)

Nessa trilha, o ideal democrático “surgiu” como conceito séculos antes de Cristo. Foi exposto em Ética a Nicomâco de Aristóteles e investigava em torno do que deve ser o bem e o bem supremo. Conforme o próprio Aristóteles, esse ideal em essência ou ciência “parece ser a política”. “Com efeito, essa política, determina quais são as ciências necessárias nas cidades, quais as que cada cidadão deve aprender, e até que ponto. Dessa forma, o conceito grego de política como esfera de realização do bem comum tornou-se clássico, teve vida longa na tradição filosófica e permanece até os nosso dias,  mesmo que seja como um ideal a ser alcançado”. Thomas Hobbes, p. ex., dizia: “A Política e a ética, ou seja, a ciência do justo, do injusto, ou do iníquo, pode ser demonstrada a priori, visto que nós mesmos fizemos os princípios, pelos quais se podem julgar o que é justo e equânime, ou seus contrários, vale dizer, as causas da justiça, que são as leis ou as convenções” Neste sentido, dizem especialistas,  todas as obras sobre direito natural foram consideradas tratados de Política.

É ainda Aristóteles, em a Política, que teoriza o segundo significado do termo “política”. “Está claro, diz o estagirita, que existe uma ciência à qual cabe indagar qual deve ser a melhor constituição: qual a mais apta a satisfazer nossos ideais sempre que não haja impedimentos externos; e qual a que se adapta às diversas condições em que possa ser posta em prática”. “Como é quase impossível que muitas pessoas possam realizar a melhor forma de governo, o bom legislador e o bom político devem saber qual é a melhor forma de governo em sentido absoluto e qual é a melhor forma de governo em determinadas condições”.

Neste sentido, segundo Aristó-teles, a Política tem duas funções: 1ª descrever a forma de Estado ideal; 2ª determinar a forma do melhor Estado possível em relação a determinadas circunstâncias.

Efetivamente, a Política como teoria do Estado seguiu o caminho utópico da descrição do Estado perfeito (segundo o exemplo da República de Platão) ou o caminho mais realista dos modos e dos instrumentos para melhorar a forma do Estado, o que foi feito pelo próprio Aristóteles numa parte de seu tratado. As duas partes, todavia, nem sempre são facilmente distinguíveis e nem sempre foram distintas. Quando, a partir de Hegel, o Estado começou a ser considerado “o Deus real” e o caráter da divindade do Estado foi aceita pela historiografia, a Política, enquanto teoria do Estado  pretendeu ter caráter descritivo e normativo ao mesmo tempo.

A Política como teoria do Estado muitas vezes foi teoria do Estado como força, pois este é de fato o significado de qualquer divinização do Estado.

Aristóteles designou, ainda, uma terceira tarefa da ciência política. “Um terceiro ramo da investigação é aquele que considera de que maneira surgiu um governo e de que maneira, depois de surgir, pôde ser conservado durante o maior tempo possível.” Foi este o conceito de Política que levou, mais tarde, Maquiavel aguçar seu realismo, com as palavras famosas: “E muitos imaginaram repúblicas e principados que nunca foram vistos nem conhecidos como existentes. Porque é tanta a diferença entre como se vive e como se deveria viver, que quem deixa o que faz pelo que deveria fazer aprende mais a arruinar-se do que a preservar-se, pois o homem que em tudo queira professar-se bom é forçoso que se arruíne em meio a tantos que não são bons”. “Donde ser necessário ao príncipe que, desejando conservar-se, aprenda a poder ser não bom e a usar disso ou não usar, segundo a necessidade”.

Expusemos, de forma sucinta, que o conceito grego de política buscava como esfera de realização o bem comum da cidade (a pólis). Por sua vez, o conceito moderno de política, no dizer de Norberto Bobbio (1909-2004) está estreitamente ligado ao poder. O julgamento de Bobbio é corroborado por cientistas políticos da atualidade. Segundo os quais, a política é o processo de formação, distribuição e exercício do poder.    

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