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Andi faz seminário para superar estigmas, fortalecer rede de comunicadores e debater a exposição dos menores na mídia

‘Eles não prestam! São marginais e devem ser trancados até estarem prontos para ir pra prisão’. Mesmo mascarado, tal pensamento preconceituoso sobre os adolescentes que cometeram infrações ainda é partilhado por grande parte da sociedade não só do Acre, mas de todos os lugares do Brasil. Uma visão de gente que esquece que antes de serem taxados de ‘infratores’, estes meninos e meninas em conflito com a lei são pessoas – futuros cidadãos – com direitos, apesar de mal conhecê-los. Neste sentido, cabe aos agentes sociais a missão de quebrar estes estigmas populares, pelo bem deste grupo de milhares dejovens excluídos do convívio social. E um dos protagonistas destes agentes é o jornalista, o comunicador.
Lei1Evento debateu a conscientização de comunicadores sobre o seu papel de abrir os olhos da sociedade para o tema
Atenta a isso, a Andi Comunicação e Direitos, em parceria com a Petrobras e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, realizou durante esta semana, nos dias 22, 23 e 24, no Kubistchek Plaza Hotel e no Espaço Ecco, em Brasília/DF, o Seminário ‘Direitos em Pauta, Imprensa Agenda Social e Adolescentes em Conflito com a Lei’. O evento contou com a participação de centenas de assessores de comunicação e jornalistas de todos os tipos de mídia, além de socioeducadores, terapeutas, ativistas de direitos humanos, gestores, magistrados especialistas da área em questão, do país inteiro.

O seminário foi uma oportunidade ímpar de debates para que os jornalistas e as demais categorias não só se aprofundassem melhor sobre o tema, como também serviu para que todos pudessem trocar expe-riências e interagirem melhor entre si. Tudo num objetivo claro da Andi em capacitar e qualificar os jornalistas de todos os cantos do país para consolidar um grupo, uma rede, de profissionais responsáveis para com os direitos do adolescente em conflito com a lei (de 12 a 17 anos) na hora de fazer a cobertura jornalística.

Lei2Cenize Vicente, da AndiEsta metodologia da ‘rede de comunicadores’ ficou expressa logo no 1º dia, no lançamento do seminário. Após a solenidade de abertura (com as falas de representantes das entidades que apóiam o evento) e da apresentação do curta ‘Um passo para ir’ (um filme da cineasta Eliana Caffé que traz 2 relatos de ex-presidiários contando suas histórias para retratar a exclusão e o resgate de suas dignidades), a Andi e a Fundação Abrinq fizeram a entrega de 20 diplomas de ‘Jornalista Amigo da Criança’. Trata-se de uma homenagem anual cedida aos principais parceiros jornalistas (ou ‘Jacas’) que atuam na defesa dos direitos dos menores de idade, criada desde 1997 e que já foi entregue a mais de 340 profissionais da comunicação.

E foi ressaltando o ‘zelo’ destes jornalistas que o 1º a falar na Abertura do seminário, Francisco Azevedo, presidente do Instituto Camargo Correa, centrou seu discurso. Para ele, são estes profissionais que fazem a diferença para quebrar os preconceitos sobre os jovens em medidas socioeducativas. “Por isso, é uma honra apoiar a rede de comunicadores da Andi”, disse. Já Sérgio Martins, gestor da área de projetos so-ciais da Petrobras, foi mais além, afirmando que as ações em prol dos direitos de menores de idade já são um ‘braço’ forte da Petrobras. Segundo ele, desde 2005 a empresa apoia mais de 500 projetos de cidadania e desenvolvimento social, sendo que 1/3 deles são voltados a adolescentes e crianças. “A defesa dos direitos deles já se tornou uma das nossas identidades”, resumiu.

Seguindo esta linha, a representante da Unicef no Brasil, Antonella Scolamiero, mostrou o quanto a realidade das crianças melhorou no país nos últimos 12 anos, saindo de uma taxa de mortalidade antes do 1º ano de vida de 29% em 2000 para o índice atual de 15,6%. Na parte dos abusos contra os menores de idade, Antonella enalteceu que a população elevou sua percepção e aprendeu o poder da denúncia. Porém, o grande problema de hoje é que ainda há um desconhecimento enorme em relação aos direitos dos jovens e o Estado muitas vezes usa isso como brecha para fugir de suas obrigações. “Cabe ao jornalista impedir isso. O Brasil tem uma das melhores legislações do mundo para a preservação dos menores. O problema é a ineficiência dos poderes públicos na aplicação destas leis”, alertou ela.

Tal cobrança foi partilhada pela representante da Secretaria Nacional de Direitos Humanos (DH) Carmem Oliveira. A ativista esteve recentemente numa convenção de DH da ONU e contou que lá foram reconhecidos os avanços na garantia dos direitos da infância e da juventude brasileira através do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Mas só isso, para ela, é pouco. A população tem de reconhecer estes avanços. “A maioria pensa que o caminho do adolescente em conflito com a lei e a prisão e depois o cemitério. Por isso o quer recluso, mas isso tem de mudar. Temos de mobilizar a opinião pública para fazê-la ver que antes do ‘infrator’ há alguém ali com direitos. Quem atua nesta área sabe o quanto ela é solitária. Portanto, quem pode nos ajudar nisso é o jornalista”, concluiu Carmem.

Por sua vez, a deputada federal Teresa Surita, da Comissão Parlamentar Mista dos Direitos da Criança (também conhecida por ter sido uma das relatoras da famosa ‘Lei da Palmada’ – n), destacou a importância de manter sempre em foco o debate dos jovens em conflito com a lei. Segundo ela, a sociedade vive uma ‘hipocrisia’ ao deixar de tratar de questões relacionadas ao tema, condenando parte da sua juventude. Ela acredita que só através do debate contínuo será possível se criar políticas públicas que contemplem 100% do ECA.

Por fim, a cerimônia de Abertura do seminário foi fechada com o discurso da presidente da Andi, Cenise Monte Vicente. De acordo com ela, o evento foi de extrema importância para a entidade, uma vez que imprimiu um olhar humanizado, sem preconceito e valorizador do contraditório aos comunicadores e demais classes participantes. “Apostamos em vocês, jornalistas, para que vocês possam fazer a sociedade também apostar no lado luminoso destes jovens (em conflito com a lei)”, declarou. Para Cenise, a partir de agora, com estas novas concepções, os jornalistas têm o dever de romper com a banalização do assunto e tirar a ‘máscara’ posta para que os menores apreendidos sejam só os da Ponta do problema, enquanto as fontes geradoras (redes de tráfico, famílias exploradoras, etc) continuam impunes.

Lei3Preconceito: a sociedade quer os adolescentes reclusos
Um novo olhar para o futuro
O terceiro e último dia do seminário teve os debates ‘Temas geradores: exclusão social como fator de risco à violência’ e ‘Reunião de pauta: Como a imprensa pode qualificar o debate público em torno desses temas?’ de manhã. À tarde, os jornalistas participaram de mais 3 grupos de trabalho. GT4 – ‘Recomendações para uma cobertura qualificada e ética das temáticas ligadas à exclusão social e aos adolescentes em conflito com a lei’; GT5 – ‘Lei do Sinase: desafios da implementação e cobertura da imprensa’; GT6 – ‘Jornalismo de internet, redes sociais e novas mídias: como dar voz aos adolescentes em conflito com a lei’. A seguir teve o resumo dos GTs e a plenária de encerramento do evento.

Nela, os jornalistas e demais categorias foram desafiados a assumir o compromisso de incorporar em seus trabalhos um novo olhar para lidar com os jovens em conflito com lei e com aqueles outros que são excluídos e estão propensos a prática do delito. Ficou para as classes o dever de expor o drama dos menores de idade de forma ética pra sociedade, de estabelecer o diálogo entre os autores sociais, mudar os estigmas da população e, acima de tudo, encostar o Poder Público na parede para fazer valer os direitos destes meninos e meninos, um dia podem vir a ser o futuro do país. Cabe a todos decidir se este será um futuro melhor, prospero ou um de perpetuação da pobreza e do crime.
Guia sobre o tema para jornalistas: um ‘puxão’ de orelha
Após a Abertura e a apresentação do curta metragem, o 1º dia do seminário seguiu com o lançamento do livro ‘Adolescentes em Conflito com a Lei – Guia de Cobertura Jornalística’. A publicação traz, em 135 páginas, uma apresentação completa de todas as informações básicas que um jornalista precisa saber para fazer uma cobertura ética e responsável de fatos relacionados aos menores de idade em conflito com a lei. Em 8 capítulos, ele aborda desde a visão geral deste público até os termos certos a serem usados, sugestão de fontes, práticas certas e inadequadas na apuração dos fatos, marcos legais desta legislação, como se dá o atendimento socioeducativo, como o jornalista pode ajudar neste trabalho, etc.
Lei4Vivarta diz que estudo do guia revela que matérias jornalísticas não retratam bem a situação dos jovens
Além do livro, o seminário também apresentou os dados de uma pesquisa da Andi para analisar as características da cobertura jornalística de 54 grandes jornais de todo o país. Os números não foram tão satisfatórios, do ponto de vista da garantia dos direitos dos jovens em medidas socioeducativas. Segundo o estudo, foram analisados mais de 30 mil textos jornalísticos. Destes, a maioria absoluta – 66% – está relacionado ao tema Educação. As matérias dos menores de idade em conflito com a lei aparecem com apenas 2,2% do total, no 15º lugar entre as 17 temáticas possíveis (só ganha de indígenas e reforma agrária).

A região Norte tem a melhor média: 765 matérias por jornal. O sul tem a pior: 284 matérias/veículo. É certo que há um aumento significativo no número de matérias relacionadas à infância e juventude: de 1996 a 2010, tal pauta ocupou 1.200% a mais dos espaços nos jornais. Só que ainda há um grande caminho a ser percorrido pela mídia para fazer jus ao assunto, segundo explicou o estatístico analítico da Andi, Veet Vivarta. Até porque o baixo número de matérias não é o único problema. Tem também a parte da qualidade destes poucos textos. Conforme estudo anterior da Andi (‘Balas Perdidas’) apresentado por Veet, das matérias ligadas à temática de adolescentes em conflito com a lei, 51,1% estão descontextualizadas; 60% têm escassez de vozes (geralmente o repórter escuta só a fonte policial); 80% delas retratam violência física praticada pelos jovens; 2% usam termos pejorativos; 34,2% usam termos desrespeitosos; 26% usam fotos dos menores (e em 1/3 delas eles são identificáveis).           

“As más matérias constroem conceitos errados na população. E, através deste estudo, fica claro que podemos mudar as coisas. Há espaço para isso. Pouco, longe do ideal, mas tem. Então, cabe ao jornalista dar um aporte maior de qualidade ao seu trabalho quando ele se relaciona com o menor de idade em conflito com a lei. Temos de acabar com as narrativas pobres, os simplórios recursos editoriais, as palavras e chavões preconceituosos e os textos que se limitam ao fato/a infração do menor ao invés de abordar às suas causas. Além disso, o jornalista precisa escrever mais para cobrar o Estado dos seus deveres”, apontou Veet.

Ainda do guia, ele faz uma avaliação de que o sistema socioeducativo do Acre ‘promoveu avanços no processo de ressocialização dos adolescentes submetidos a medidas socioeducativas, com a implantação de um Centro de Apoio à Família e ao Egresso. A estratégia é fortalecer os vínculos familiares e comunitários, buscando a superação das dificuldades surgidas quando do retorno ao convívio social’.

Para fechar o 1º dia, o seminário promoveu um papo aberto sobre a imagem dos adolescentes em conflito com a lei, com a participação de membros do Degase da Unicef e fotógrafos conceituados a nível nacional. Por fim, foi aberta a Exposição fotográfica ‘Retinas &Rotinas’.   

Justiça Restaurativa, redução da maioridade penal e outros temas
O 2º dia do seminário da Andi foi aberto com o debate ‘Temas geradores: Adolescentes em conflito com a lei’, seguido do ‘Reunião de pauta: Como a imprensa pode qualificar o debate público em torno desses temas?’. Os dois foram realizados tradicionalmente com a formação de uma ‘mesa’ de especialistas e trouxeram à tona novas temáticas inerentes à garantia dos direitos dos menores de idade em conflito com a lei. Entre eles, a avaliação dos 24 anos do ECA; a redução da idade para a imputabilidade penal para a partir dos 16 anos; a Justiça Restaurativa; ‘humanização’; prevenção do sistema socioeducativo, etc.
Lei5Segundo dia abordou ressocialização, o crack e outros
Começando pela ‘ressocialização’ e ‘prevenção’ do sistema de penas socioeducativas, a integrante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), Rosa María Ortiz, estes duas características são fundamentais, mas estão em falta não só no Brasil, mas em todo o continente sul-americano. Segundo ela, isso faz com que a violência ao menor siga uma tendência de alta. Com efeito, dados da OEA revelam que de cada 10 mortes na América do Sul, entre 6 a 7 são de jovens. Esta é a maior incidência mundial de fatalidade de jovens.  

Já a análise do ECA ficou por conta do juiz da Infância e Juventude de Caxias do Sul/RS, Leoberto Brancher. Na concepção dele, o estatuto foi um marco regulatório para a garantia dos direitos dos menores de idade. No entanto, ele voltou a frisar que a implementabilidade do ECA e a falta de comprometimento do Judiciário brasileiro banalizam tal lei.

“E isso impede que os nossos jovens tenham algo chamado Justiça Restaurativa. O sistema não pensa em prevenir. Ele pune. Quando chega a ele, o menor já cometeu o delito. E lá a aplicação das penas socioeducativas nem sempre é focada na ressocialização integral. Aquela humanizada. Pensada par atender aos anseios pessoais do garoto. Portanto, temos de mudar o foco e trabalhar, primeiro, em prevenir, depois ressocializar e fazer o menor que cometeu o delito se responsabilizar por tal ato. Reparar ele”, comentou.

O magistrado também defendeu que para esta Justiça restaurativa possa se concretizar, é preciso que haja mais controle e coerção do Estado, mas sem excessos. O juiz também apontou que é neste sentido que a imprensa pode cobrar e mudar o sistema, e não focando suas pautas em temas como a redução da imputabilidade penal. “Não é reduzindo a idade penal que as coisas vão melhorar. Se isso acontecer, a sociedade vai ganhar o que ela quer, que é se livrar do infrator, mas é da perspectiva do jovem? Ele só vai se perder mais cedo nos presídios, e sem chance de se reabilitar. Este não é o caminho”, completou o discurso do juiz a professora da PUC/RJ, Irene Rezzini.

Para fechar o 2º dia de debates, os jornalistas participaram de 3 grupos de trabalho para discussão: GT1 – Mídia e justiça juvenil: desafios e aprendizados na América Latina (que comparou a conjuntura da criança e adolescente em todos os países do continente); GT2 – boas práticas na cobertura do tema adolescentes em conflito com a lei (que apontou que a imprensa deve estar mais atenta para cobrir mais do que os delitos dos jovens, ela tem de ir na origem do problema e destacar as soluções, políticas públicas, para solucionar a questão); e GT3 – Práticas inadequadas na cobertura do tema adolescentes em conflito com a lei (que mostrou aos jornalistas que eles precisam ter muito mais zelo na hora de abordar tal tema). Após o debate nos grupos, todos se reuniram para fazer um resumo das discussões.

‘Eles não prestam! São marginais e devem ser trancados até estarem prontos para ir pra prisão’. Mesmo mascarado, tal pensamento preconceituoso sobre os adolescentes que cometeram infrações ainda é partilhado por grande parte da sociedade não só do Acre, mas de todos os lugares do Brasil. Uma visão de gente que esquece que antes de serem taxados de ‘infratores’, estes meninos e meninas em conflito com a lei são pessoas – futuros cidadãos – com direitos, apesar de mal conhecê-los. Neste sentido, cabe aos agentes sociais a missão de quebrar estes estigmas populares, pelo bem deste grupo de milhares dejovens excluídos do convívio social. E um dos protagonistas destes agentes é o jornalista, o comunicador.
Lei1Evento debateu a conscientização de comunicadores sobre o seu papel de abrir os olhos da sociedade para o tema
Atenta a isso, a Andi Comunicação e Direitos, em parceria com a Petrobras e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, realizou durante esta semana, nos dias 22, 23 e 24, no Kubistchek Plaza Hotel e no Espaço Ecco, em Brasília/DF, o Seminário ‘Direitos em Pauta, Imprensa Agenda Social e Adolescentes em Conflito com a Lei’. O evento contou com a participação de centenas de assessores de comunicação e jornalistas de todos os tipos de mídia, além de socioeducadores, terapeutas, ativistas de direitos humanos, gestores, magistrados especialistas da área em questão, do país inteiro.

O seminário foi uma oportunidade ímpar de debates para que os jornalistas e as demais categorias não só se aprofundassem melhor sobre o tema, como também serviu para que todos pudessem trocar expe-riências e interagirem melhor entre si. Tudo num objetivo claro da Andi em capacitar e qualificar os jornalistas de todos os cantos do país para consolidar um grupo, uma rede, de profissionais responsáveis para com os direitos do adolescente em conflito com a lei (de 12 a 17 anos) na hora de fazer a cobertura jornalística.

Lei2Cenize Vicente, da AndiEsta metodologia da ‘rede de comunicadores’ ficou expressa logo no 1º dia, no lançamento do seminário. Após a solenidade de abertura (com as falas de representantes das entidades que apóiam o evento) e da apresentação do curta ‘Um passo para ir’ (um filme da cineasta Eliana Caffé que traz 2 relatos de ex-presidiários contando suas histórias para retratar a exclusão e o resgate de suas dignidades), a Andi e a Fundação Abrinq fizeram a entrega de 20 diplomas de ‘Jornalista Amigo da Criança’. Trata-se de uma homenagem anual cedida aos principais parceiros jornalistas (ou ‘Jacas’) que atuam na defesa dos direitos dos menores de idade, criada desde 1997 e que já foi entregue a mais de 340 profissionais da comunicação.

E foi ressaltando o ‘zelo’ destes jornalistas que o 1º a falar na Abertura do seminário, Francisco Azevedo, presidente do Instituto Camargo Correa, centrou seu discurso. Para ele, são estes profissionais que fazem a diferença para quebrar os preconceitos sobre os jovens em medidas socioeducativas. “Por isso, é uma honra apoiar a rede de comunicadores da Andi”, disse. Já Sérgio Martins, gestor da área de projetos so-ciais da Petrobras, foi mais além, afirmando que as ações em prol dos direitos de menores de idade já são um ‘braço’ forte da Petrobras. Segundo ele, desde 2005 a empresa apoia mais de 500 projetos de cidadania e desenvolvimento social, sendo que 1/3 deles são voltados a adolescentes e crianças. “A defesa dos direitos deles já se tornou uma das nossas identidades”, resumiu.

Seguindo esta linha, a representante da Unicef no Brasil, Antonella Scolamiero, mostrou o quanto a realidade das crianças melhorou no país nos últimos 12 anos, saindo de uma taxa de mortalidade antes do 1º ano de vida de 29% em 2000 para o índice atual de 15,6%. Na parte dos abusos contra os menores de idade, Antonella enalteceu que a população elevou sua percepção e aprendeu o poder da denúncia. Porém, o grande problema de hoje é que ainda há um desconhecimento enorme em relação aos direitos dos jovens e o Estado muitas vezes usa isso como brecha para fugir de suas obrigações. “Cabe ao jornalista impedir isso. O Brasil tem uma das melhores legislações do mundo para a preservação dos menores. O problema é a ineficiência dos poderes públicos na aplicação destas leis”, alertou ela.

Tal cobrança foi partilhada pela representante da Secretaria Nacional de Direitos Humanos (DH) Carmem Oliveira. A ativista esteve recentemente numa convenção de DH da ONU e contou que lá foram reconhecidos os avanços na garantia dos direitos da infância e da juventude brasileira através do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Mas só isso, para ela, é pouco. A população tem de reconhecer estes avanços. “A maioria pensa que o caminho do adolescente em conflito com a lei e a prisão e depois o cemitério. Por isso o quer recluso, mas isso tem de mudar. Temos de mobilizar a opinião pública para fazê-la ver que antes do ‘infrator’ há alguém ali com direitos. Quem atua nesta área sabe o quanto ela é solitária. Portanto, quem pode nos ajudar nisso é o jornalista”, concluiu Carmem.

Por sua vez, a deputada federal Teresa Surita, da Comissão Parlamentar Mista dos Direitos da Criança (também conhecida por ter sido uma das relatoras da famosa ‘Lei da Palmada’ – n), destacou a importância de manter sempre em foco o debate dos jovens em conflito com a lei. Segundo ela, a sociedade vive uma ‘hipocrisia’ ao deixar de tratar de questões relacionadas ao tema, condenando parte da sua juventude. Ela acredita que só através do debate contínuo será possível se criar políticas públicas que contemplem 100% do ECA.

Por fim, a cerimônia de Abertura do seminário foi fechada com o discurso da presidente da Andi, Cenise Monte Vicente. De acordo com ela, o evento foi de extrema importância para a entidade, uma vez que imprimiu um olhar humanizado, sem preconceito e valorizador do contraditório aos comunicadores e demais classes participantes. “Apostamos em vocês, jornalistas, para que vocês possam fazer a sociedade também apostar no lado luminoso destes jovens (em conflito com a lei)”, declarou. Para Cenise, a partir de agora, com estas novas concepções, os jornalistas têm o dever de romper com a banalização do assunto e tirar a ‘máscara’ posta para que os menores apreendidos sejam só os da Ponta do problema, enquanto as fontes geradoras (redes de tráfico, famílias exploradoras, etc) continuam impunes.

Lei3Preconceito: a sociedade quer os adolescentes reclusos
Um novo olhar para o futuro
O terceiro e último dia do seminário teve os debates ‘Temas geradores: exclusão social como fator de risco à violência’ e ‘Reunião de pauta: Como a imprensa pode qualificar o debate público em torno desses temas?’ de manhã. À tarde, os jornalistas participaram de mais 3 grupos de trabalho. GT4 – ‘Recomendações para uma cobertura qualificada e ética das temáticas ligadas à exclusão social e aos adolescentes em conflito com a lei’; GT5 – ‘Lei do Sinase: desafios da implementação e cobertura da imprensa’; GT6 – ‘Jornalismo de internet, redes sociais e novas mídias: como dar voz aos adolescentes em conflito com a lei’. A seguir teve o resumo dos GTs e a plenária de encerramento do evento.

Nela, os jornalistas e demais categorias foram desafiados a assumir o compromisso de incorporar em seus trabalhos um novo olhar para lidar com os jovens em conflito com lei e com aqueles outros que são excluídos e estão propensos a prática do delito. Ficou para as classes o dever de expor o drama dos menores de idade de forma ética pra sociedade, de estabelecer o diálogo entre os autores sociais, mudar os estigmas da população e, acima de tudo, encostar o Poder Público na parede para fazer valer os direitos destes meninos e meninos, um dia podem vir a ser o futuro do país. Cabe a todos decidir se este será um futuro melhor, prospero ou um de perpetuação da pobreza e do crime.
Guia sobre o tema para jornalistas: um ‘puxão’ de orelha
Após a Abertura e a apresentação do curta metragem, o 1º dia do seminário seguiu com o lançamento do livro ‘Adolescentes em Conflito com a Lei – Guia de Cobertura Jornalística’. A publicação traz, em 135 páginas, uma apresentação completa de todas as informações básicas que um jornalista precisa saber para fazer uma cobertura ética e responsável de fatos relacionados aos menores de idade em conflito com a lei. Em 8 capítulos, ele aborda desde a visão geral deste público até os termos certos a serem usados, sugestão de fontes, práticas certas e inadequadas na apuração dos fatos, marcos legais desta legislação, como se dá o atendimento socioeducativo, como o jornalista pode ajudar neste trabalho, etc.
Lei4Vivarta diz que estudo do guia revela que matérias jornalísticas não retratam bem a situação dos jovens
Além do livro, o seminário também apresentou os dados de uma pesquisa da Andi para analisar as características da cobertura jornalística de 54 grandes jornais de todo o país. Os números não foram tão satisfatórios, do ponto de vista da garantia dos direitos dos jovens em medidas socioeducativas. Segundo o estudo, foram analisados mais de 30 mil textos jornalísticos. Destes, a maioria absoluta – 66% – está relacionado ao tema Educação. As matérias dos menores de idade em conflito com a lei aparecem com apenas 2,2% do total, no 15º lugar entre as 17 temáticas possíveis (só ganha de indígenas e reforma agrária).

A região Norte tem a melhor média: 765 matérias por jornal. O sul tem a pior: 284 matérias/veículo. É certo que há um aumento significativo no número de matérias relacionadas à infância e juventude: de 1996 a 2010, tal pauta ocupou 1.200% a mais dos espaços nos jornais. Só que ainda há um grande caminho a ser percorrido pela mídia para fazer jus ao assunto, segundo explicou o estatístico analítico da Andi, Veet Vivarta. Até porque o baixo número de matérias não é o único problema. Tem também a parte da qualidade destes poucos textos. Conforme estudo anterior da Andi (‘Balas Perdidas’) apresentado por Veet, das matérias ligadas à temática de adolescentes em conflito com a lei, 51,1% estão descontextualizadas; 60% têm escassez de vozes (geralmente o repórter escuta só a fonte policial); 80% delas retratam violência física praticada pelos jovens; 2% usam termos pejorativos; 34,2% usam termos desrespeitosos; 26% usam fotos dos menores (e em 1/3 delas eles são identificáveis).           

“As más matérias constroem conceitos errados na população. E, através deste estudo, fica claro que podemos mudar as coisas. Há espaço para isso. Pouco, longe do ideal, mas tem. Então, cabe ao jornalista dar um aporte maior de qualidade ao seu trabalho quando ele se relaciona com o menor de idade em conflito com a lei. Temos de acabar com as narrativas pobres, os simplórios recursos editoriais, as palavras e chavões preconceituosos e os textos que se limitam ao fato/a infração do menor ao invés de abordar às suas causas. Além disso, o jornalista precisa escrever mais para cobrar o Estado dos seus deveres”, apontou Veet.

Ainda do guia, ele faz uma avaliação de que o sistema socioeducativo do Acre ‘promoveu avanços no processo de ressocialização dos adolescentes submetidos a medidas socioeducativas, com a implantação de um Centro de Apoio à Família e ao Egresso. A estratégia é fortalecer os vínculos familiares e comunitários, buscando a superação das dificuldades surgidas quando do retorno ao convívio social’.

Para fechar o 1º dia, o seminário promoveu um papo aberto sobre a imagem dos adolescentes em conflito com a lei, com a participação de membros do Degase da Unicef e fotógrafos conceituados a nível nacional. Por fim, foi aberta a Exposição fotográfica ‘Retinas &Rotinas’.   

Justiça Restaurativa, redução da maioridade penal e outros temas
O 2º dia do seminário da Andi foi aberto com o debate ‘Temas geradores: Adolescentes em conflito com a lei’, seguido do ‘Reunião de pauta: Como a imprensa pode qualificar o debate público em torno desses temas?’. Os dois foram realizados tradicionalmente com a formação de uma ‘mesa’ de especialistas e trouxeram à tona novas temáticas inerentes à garantia dos direitos dos menores de idade em conflito com a lei. Entre eles, a avaliação dos 24 anos do ECA; a redução da idade para a imputabilidade penal para a partir dos 16 anos; a Justiça Restaurativa; ‘humanização’; prevenção do sistema socioeducativo, etc.
Lei5Segundo dia abordou ressocialização, o crack e outros
Começando pela ‘ressocialização’ e ‘prevenção’ do sistema de penas socioeducativas, a integrante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), Rosa María Ortiz, estes duas características são fundamentais, mas estão em falta não só no Brasil, mas em todo o continente sul-americano. Segundo ela, isso faz com que a violência ao menor siga uma tendência de alta. Com efeito, dados da OEA revelam que de cada 10 mortes na América do Sul, entre 6 a 7 são de jovens. Esta é a maior incidência mundial de fatalidade de jovens.  

Já a análise do ECA ficou por conta do juiz da Infância e Juventude de Caxias do Sul/RS, Leoberto Brancher. Na concepção dele, o estatuto foi um marco regulatório para a garantia dos direitos dos menores de idade. No entanto, ele voltou a frisar que a implementabilidade do ECA e a falta de comprometimento do Judiciário brasileiro banalizam tal lei.

“E isso impede que os nossos jovens tenham algo chamado Justiça Restaurativa. O sistema não pensa em prevenir. Ele pune. Quando chega a ele, o menor já cometeu o delito. E lá a aplicação das penas socioeducativas nem sempre é focada na ressocialização integral. Aquela humanizada. Pensada par atender aos anseios pessoais do garoto. Portanto, temos de mudar o foco e trabalhar, primeiro, em prevenir, depois ressocializar e fazer o menor que cometeu o delito se responsabilizar por tal ato. Reparar ele”, comentou.

O magistrado também defendeu que para esta Justiça restaurativa possa se concretizar, é preciso que haja mais controle e coerção do Estado, mas sem excessos. O juiz também apontou que é neste sentido que a imprensa pode cobrar e mudar o sistema, e não focando suas pautas em temas como a redução da imputabilidade penal. “Não é reduzindo a idade penal que as coisas vão melhorar. Se isso acontecer, a sociedade vai ganhar o que ela quer, que é se livrar do infrator, mas é da perspectiva do jovem? Ele só vai se perder mais cedo nos presídios, e sem chance de se reabilitar. Este não é o caminho”, completou o discurso do juiz a professora da PUC/RJ, Irene Rezzini.

Para fechar o 2º dia de debates, os jornalistas participaram de 3 grupos de trabalho para discussão: GT1 – Mídia e justiça juvenil: desafios e aprendizados na América Latina (que comparou a conjuntura da criança e adolescente em todos os países do continente); GT2 – boas práticas na cobertura do tema adolescentes em conflito com a lei (que apontou que a imprensa deve estar mais atenta para cobrir mais do que os delitos dos jovens, ela tem de ir na origem do problema e destacar as soluções, políticas públicas, para solucionar a questão); e GT3 – Práticas inadequadas na cobertura do tema adolescentes em conflito com a lei (que mostrou aos jornalistas que eles precisam ter muito mais zelo na hora de abordar tal tema). Após o debate nos grupos, todos se reuniram para fazer um resumo das discussões.

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