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Acre mostra os seus 50 anos de lutas para se tornar ‘Estado’ em sessão especial no Senado

Qual é o legado do Acre para o Brasil? Para muitos brasileiros, responder esta pergunta seria difícil. Mas nesta segunda-feira ela se tornou fácil. Isso porque o país inteiro pode acompanhar, no final da manhã e início da tarde de ontem (18), das 11h30 às 14h, uma sessão especial em comemoração aos 50 anos do Acre Estado, no Plenário do Senado Federal.  A sessão foi proposta (através do requerimento n 1.575) e presidida pelo senador Jorge Viana (PT/AC) e foi o ato que fechou – e com ‘chave de ouro’ – as comemorações oficiais do Acre Estado. Uma prova do reconhecimento brasileiro para com a rica história acreana.
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Mas que historia tão rica é esta que infla de orgulho os corações acreanos? Em resumo, trata-se de uma história grafada em muitas lutas por liberdade e ideais únicos. A trajetória de um povo aguerrido e, sobretudo, ‘abusado’. Afinal de contas, o que mais se pode dizer de um Estado que teve como articulador do seu processo de emancipação o ilustre deputado José Guiomard dos Santos e que surgiu das mãos dos políticos históricos João Goulart (na época, foi o presidente que promulgou o projeto de lei do Acre Estado: 4.075, de 15 de junho de 1962) e Tancredo Neves (Primeiro Ministro)?

A sessão especial no Senado contou com a presença de dezenas de acreanos (tanto os nascidos na ‘terrinha’, quanto os chamados acreanos ‘de coração’) no plenário da Casa e milhares que acompanharam a transmissão da solenidade pela TV Senado e TV Aldeia. Entre os presentes, estavam o presidente da Câmara de Rio Branco, vereador Juracy Nogueira; o procurador Sammy Barbosa, do MPE; o superintendente do Incra/AC, João Thaumaturgo Neto; da chefe do Gabinete Civil, Márcia Regina; do neto de Guiomard Santos; prefeitos e parlamentares acreanos; representantes de veículos de comunicação do Estado; entre outros. Mais de 40 alunos dos Sesc Ler de Plácido de Castro também presti-giaram a solenidade.

A mesa da sessão foi composta pelo governador Tião Via-na, pelos 3 senadores do Acre: Jorge Viana (PT); Aníbal Diniz (PT) e Sérgio Petecão (PSD); pelo ministro aposentado do STF, Ilmar Galvão; pelo prefeito de Rio Branco, Raimundo Angelim; e pelos ex- governadores Binho Marques e Nabor Júnior. Antes de começar os discursos de cada um, foi tocado o hino nacional e o hino acreano, que deram uma mostra do espírito ufanista pelo Acre e por sua história que tomou conta do Senado.

O primeiro território, a maior ‘injustiça democrática’ do país
Proponente da sessão, o senador Jorge Viana mais uma vez expressou a sua paixão sem limites pelo Acre e seu povo. Jorge centrou seu discurso em enaltecer as dificuldades que os acreanos enfrentaram desde os conflitos na sua revolução, no final e princípio do século XX, até o subseqüente movimento autonomista que lutou pelo Acre Estado. E é neste contexto aguerrido que o senador considera que o seu povo sofreu a ‘maior injustiça democrática’ do Brasil, uma vez que os acreanos foram os primeiros que lutaram contra a dominação estrangeira no país e, como recompensa, foi privado de seus direitos à liberdade.  

Segundo o ex-governador (1999-2006), o Acre foi o primeiro Estado, no cenário amazônico, a se tornar ‘território’. Tal condição, inclusive, foi auferida exclusivamente para o Acre devido à sua importância naquele momento histórico, quando o mundo tanto precisava de borracha e aqui se produzia a maior parte do produto (até 90%). Mas este ‘pioneirismo’, lembra Jorge, só trouxe prejuízos aos acreanos. Sob a condição de território, o Acre foi vítima de um regime com viés autoritário, que o impedia de poder ter a sua legislatura, seu sistema judiciário, de escolher seus representantes e de arrecadar seus impostos.  

“Sou filho de acreano. Nasci e cresci no Acre. E a vida me deu oportunidades de conhecer outros lugares. Mas, de todos eles, eu nunca encontrei um lugar melhor pra se viver do que o Acre. Por isso, para mim, é um orgulho estar aqui. Esta sessão tem um significado especial pra todos nós, acreanos. Temos a chance de mostrar pra todo Brasil da epopéia da revolução acreana até as lutas indômitas que nos tornaram Estado. Esta saga que sacudiu a República, pois foi o Acre o Estado que mais fez da sua causa a nacionalidade brasileira”.  

Para finalizar, Jorge Viana citou um trecho do hino acreano: “E ergueremos, então, destas zonas/ Um tal canto vibrante e viril/ Que será como a voz do Amazonas / Ecoando por todo o Brasil”. Para ele, esta passagem do hino representa toda a grandeza política do Acre. O seu espírito combativo que faz com que o Estado mostre mais uma vez ao Brasil a sua capacidade de quebrar paradigmas e se renovar. E foi justamente esta história de 50 anos de defesa da autonomia, defende Jorge, que inspirou a luta dos Povos da Floresta nos anos 80 e que dá à atual gestão local rumos claros quanto ao dever/ compromisso para com o desenvolvimento atento às inúmeras demandas socioambientais.

“Nesta data, quem está de parabéns é o povo acreano. Hoje, temos indicadores sociais ambientais que começam a ser referência na Amazônia. Mas ainda temos muito que alcançar. E só honrando este nosso rico passado é que vamos poder construir o futuro”, concluiu.

A busca de um Estado por sua identidade
Outro apaixonado pela história e pelo povo do Acre, o governador Tião Viana fez questão de ressaltar em seu discurso a caminhada do Estado rumo à afirmação da sua identidade. Neste processo, Tião ressaltou a participação exímia no processo histórico de emancipação do Acre do memorável José Guiomard dos Santos. Isso porque foi Guiomard que trouxe para cá um conjunto de ideais diferentes, para fazer o Brasil mudar de visão em relação ao Acre.
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E foi com este grande personagem da autonomia do Estado que Tião relembrou vários outros agentes e fatos mal compreendidos da história acrea-na, desde os primeiros guerreiros que ajudaram Plácido de Castro a tomar o Acre da Bolívia até os soldados da borracha que vieram no 2º ciclo da borracha.  “O Acre é um lugar que ainda tem muitas questões a serem respondidas. Por exemplo: por que o Brasil tem tanta desconsideração com estas lutas do Acre? Temos de responder isso. Hoje, celebramos 50 anos de um Estado que buscava sua identidade há mais de 60 anos, desde o início da sua revolução. E foi com Guio-mard dos Santos que começamos a descobri-la”.

Para completar o seu raciocínio, Tião Viana defendeu que só após este processo histórico marcante é que os acreanos conseguiram redescobrir a direção certa na resposta da sua verdadeira identidade. De acordo com ele, esta identidade veio no final da década de 90, com o governo de Jorge Viana, que rompeu com o movimento exclusivamente pecuarista basea-do em requintes texanos e passou a valorizar o projeto de desenvolvimento sustentável.

“Encontramos uma identidade mais com a nossa cara. Amazônica. A pecuária responsável é sempre muito bem-vinda. Mas foi com este modelo de elevação dos indicadores socio econômicos que não abre mão da preservação da nossa natureza que encontramos a nossa identidade. E ela vem crescendo a cada ano e vai continuar assim, porque é só desta maneira que poderemos superar as desigualdades extremas do nosso Estado”.

Um testemunho de quem participou da emancipação
HomeSenado3Presente na vida política durante os anos que marcaram a emancipação do Acre Estado, o ex-governador e ex-senador Nabor Júnior participou da sessão e contribuiu com o seu testemunho fiel daquele momento. Segundo Nabor, no momento em que o movimento autonomista ganhava força e o projeto de acabar com o território acreano foi proposto, 1957, ele demorou 5 anos tramitando devido a  um embate político entre Guiomard Santos (que defendia a autonomia imediata) e Oscar Passos (que defendia que o Acre não podia virar Estado enquanto não tivesse condições financeiras para tanto).

“Falam muito no Guiomard Santos, mas o Oscar Passos também foi uma peça essencial neste processo. Foi só quando ele entrou em um acordo com o Guiomard que o projeto de lei foi pra frente. Até porque o Oscar Passos era do partido do João Goulart e amigo pessoal dele. Se o Oscar não tivesse dado o aval dele, o Goulart não promulgaria o projeto de lei. Além disso, outros parlamentares participaram deste debate e foram importante no acordo entre as partes tais como os ex-senadores Cunha Melo (que foi quem barrou a tramitação do PL nos 5 anos por ser contra) e Jaime Araújo (que foi o relator do projeto e quem fez as emendas que possibilitou o acerto dele)”.

Um legado que é fonte inesgotável para o futuro
HomeSenado4Primeiro a discursar na sessão especial, o senador Aníbal Diniz (PT/AC) fez um discurso emocionado sobre a riqueza cultural diversificada (em especial, com raízes nordestinas) presente nos principais processos históricos do Acre. Aníbal também resumiu a trajetória de lutas de 1 século do Acre até conquistar a atual condição democrática. Para tanto, ele enfatizou fatos de uma característica inerente ao povo acreano: a forte ‘politização’.  Entre eles: a vitória de José Augusto como 1º governador eleito do Acre após ter sido José Guiomard Santos o ‘pai’ da luta pela autonomia do Estado; após assumir em 63, José Augusto só ficou 1 ano no cargo, pois em 64 veio o golpe militar; etc.

Aníbal também defendeu que o Acre tem um legado em sua história que serve como uma fonte inesgotável de inspiração para os avanços atuais do Estado. E, mais do que base para os avanços, trata-se de um legado que inspira também soluções para as novas demandas a serem enfrentadas para um Acre melhor no futuro. “Por toda nossa história, o Acre está se transformando para melhor. Ainda temos muito mais a fazer pela frente. Desafios difíceis. Mas desde quando eles não foram assim? Desafios existem, mas não nos amedrontamos diante deles”.    

O carinho pelo Acre de uma senadora gaúcha e do ‘quarto senador’
HomeSenado5Convidados a discursar sobre suas impressões sobre o Acre na sessão especial no Senado, os senadores Wellington Dias (PT/PI) e Ana Amélia Lemos (PP/RS) mostraram o carinho inestimável que têm pelo Estado, por sua história e representatividade atual para o país. Uma mostra do fim daquele antigo preconceito do povo brasileiro em relação ao Acre.

A senadora gaucha foi a primeira a discursar. Positivamente provocada pelo presidente da sessão, o senador Jorge Viana, a falar da participação de gaúchos na história acreana, Ana Amélia se disse defensora da união federativa em todo país. Nesse sentido, ela não poupou elogios ao hino e a história acreana e destacou grandes feitos mais atuais dos acreanos (atuação política de Jarbas Passarinho e Jatene; novelas de Glória Perez; a emenda 29 proposta por Tião Viana; luta ambiental de Marina Silva e relatoria conjunta do Código Florestal de Jorge Viana). Por fim, ela destacou o perfil socioambiental das políticas acreanas e o portagonismo delas para o Brasil na Rio+20.

“O Acre tem um papel fundamental no equilíbrio ecológico de uma região como a Amazônia, que é afamada como o pulmão do mundo. O Acre é quem está mais a frente neste sentido. E tem muito a contribuir nesta conferencia da ONU (Rio+20). Isso prova que, ao contrário do que se diz, o Acre não é um lugar tão distante assim das demais regiões do país. Na verdade, do ponto de vista ambiental, ele é o centro do planeta”, disse ela.

Já o senador Wellington Dias contou as mudanças que sentiu no Acre entre as 2 vezes que visitou o Estado, a primeira em 1984 e a segunda em 2011. “Foram mudanças que impressionam muito. É um privilégio ver isso. O Acre descobriu cedo uma forma decente de tratar sua natureza. E, o mais importante, agregou esta responsabilidade com a qualidade da vida humana. Ela foi pensada com um saldo, um olhar humano. Este trabalho deve ser referência para todo Brasil. E é por ele que coloco meu nome à disposição dos acreanos e afirmo que a bancada de vocês tem pelo menos 4 senadores. O Acre é um pedaço do Brasil que nos orgulha muito”, se comprometeu Dias.  

“Estou aqui para ajudar. Não sou um problema”
HomeSenado6Único senador de Oposição no Estado, Sérgio Petecão (PSD/AC) focou seu discurso em 2 eixos. O primeiro foi também ressaltando a bela história do Acre e de seus construtores, tais como os ex-governadores Jorge Kalume, Wanderley Dantas, Geraldo Mesquita, Joaquim Macedo, Flaviano Melo (que não pode estar presente na sessão de ontem devido a problemas de saúde) e Nabor Júnior. A 2ª preocupação de Petecão foi mostrar que reconhecia os importantes avanços que o Estado conquistou nas últimas décadas, mas que é preciso se enxergar que ainda uma ‘realidade’ acreana que precisa de muitas melhorias.

Lembrando de sua participação na criação da Frente Popular, Petecão reconheceu os grandes avanços  que o Estado teve com o projeto dos últimos 20 anos, mas destacou os seus ‘poréns’ neste projeto, garantindo a pluralidade de vozes políticas na sessão.

“Fui eleito, com 200 mil votos, para falar da realidade do Acre. Por isso, não posso vir aqui e falar que está tudo bem. Que o Acre não precisa de nada. As coisas não são assim. Quando é pra elogiar, eu vou elogiar. Mas quando for a hora de criticar o que tá errado, de fazer a cobrança, eu vou fazê-los. Sempre digo que o bem do povo do Acre está acima de quaisquer interesses políticos partidários. Por isso, desejo um bom governo ao Tião Viana. Reconheço o esforço da Frente. Mas fui eleito pelo povo e é por ele que luto. Quando precisarem da minha ajuda pelo bem dos acreanos, independente de ser um trabalho da situação ou da oposição, vou estar à disposição.  As vezes que precisarem da minha ajuda, irei ajudar. Não sou um problema”.  

Petecão também aproveitou a oportunidade para mais uma vez cobrar a volta do antigo fuso horário acreano, para pedir a volta de antigas práticas produtivas que ele acredita que ‘davam certo’ no passado e para cobrar que a ‘beleza’ do Centro de Rio Branco se estenda também aos bairros da cidade.

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