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O Código e seus códigos indecifráveis

O debate sobre o Código Florestal é complexo. Seus meandros lembram quase uma caixa de Pandora. Alguns labirintos das negociações até aqui são insondáveis. Mas há um fato inconteste: se dependêssemos apenas dos ruralistas com cadeira no Congresso, as poucas conquistas que temos na preservação do meio ambiente, inclusive algumas constitucionais, já tinham descido barranco abaixo há muito tempo. E o fato de que alguns ambientalistas radicais se recusam ao diálogo também não ajuda. Não na hora de negociar o que é possível.

Não entendo muito bem do tema. Aliás, sou leiga. O que conheço é do que leio. E a gente nem sempre pode confiar no que está escrito. Mas, trabalho com o senador Jorge Viana e sou da escola do Padre Paolino Baldassari. Isso por si só já diz alguma coisa, né?

Com o Jorge tenho aprendido sobre a importância do acordo, da mediação, da articulação. Elencar prioridades e não abrir mão de alguns preceitos básicos. Água, nascentes de rios, por exemplo. E Jorge, com seu poder de articulação, fez por merecer a indicação do DIAP que o colocou entre os 100 cabeças do Congresso na última quarta-feira.

Sua mediação constante e livre trânsito entre os diversos setores interessados no tema permitiram que mantivesse um mínimo que é quase o máximo: a garantia de que a MP da presidente Dilma, alterando as aberrações aprovadas na Câmara dos Deputados, não caducasse e, com isso, perdesse seu valor no próximo dia oito de outubro.

Claro, Jorge Viana não foi o único interlocutor, mas seu papel foi fundamental. E a boa repercussão nos jornais mostra bem isso. Da tribuna do Senado, ele relatou as dificuldades enfrentadas para a construção do entendimento. “Foram meses de muito trabalho e, ontem, fizemos o possível. Conseguimos algo que se apresentava como impossível”, disse, ao frisar que o novo Código Florestal responde às expectativas do país por uma lei que promova segurança jurídica para a produção agrícola e que proteja as florestas.

A principal conquista da votação na comissão mista do Congresso que trata do veto presidencial ao novo Código Florestal foi manter as regras permanentes, consideradas a espinha dorsal da legislação florestal. Como bem disse Jorge Viana ontem, é lamentável que o meio ambiente ainda não garanta uma bancada expressiva que ajude a melhor nego-ciar temas tão importantes como esse.
Bem, por ter nascido em uma linda cidade do interior do Acre cercada por quatro rios – Iaco, Purus, Caeté e Macauã – e as margens do que já foi outrora um belo igarapé, o Cafezal, aprendi cedo a valorizar o que a nossa floresta tem de melhor. E floresta boa é floresta em pé. Rio bom é rio limpo.

Aluna aplicada da escola do Padre Paolino, aprendi faz tempo que, mesmo morando na Amazônia, perdemos as duas essências da natureza que nos sustentam: a floresta em pé e os rios limpos. O que se vê por onde se vai são áreas e mais áreas degradadas. São rios e mais rios poluídos que mandam seus duros recados a cada inverno inundando as cidades e, em alguns casos, sem poupar ricos ou pobres.
Aí você me pergunta: tá, e o que isso tudo tem a ver com Código Florestal? Tudo, absolutamente, tudo. Porque como diz um amigo meu, nada é tão ruim que não possa ficar pior. E a continuarmos com essa falta de regras claras na legislação ambiental, não demora muito e corremos o risco de voltar voltamos para o tempo da savana – e não é a Sawana do Detran, baby! Portanto, é melhor que a sociedade comece, de fato, a tomar consciência que essa história de mudanças climáticas! Aquecimento global não é história pra boi dormir nem história para da carochinha. Muito menos é coisa para um futuro distante. Ela bate à nossa porta como um demônio sedento.

Nossa sorte é que ainda temos (pouco) tempo. Ainda há como, pelo menos, amenizar a situação. Reverter alguns quadros, preservar o que ainda não foi consumido pelo fogo e pela ganância do homem. E, como dizia o ex-senador Mão Santa: atentai bem, sociedade! Porque se não estivermos de olhos bem abertos e vigilantes na condução dessa reta final da votação da MP, os ruralistas radicais podem tentar um novo bote (eles não dormitam, nem descansam), pois já demonstraram quão implacáveis podem ser nessa guerra.

*Charlene Carvalho é jornalista e antropóloga.

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