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O que você tem a ver com a corrupção?

Desde o início de agosto, o país inteiro acompanha o julgamento mais importante da história da Justiça brasileira: o caso mensalão, baseado em um forte esquema corrupto, com desvio de recursos para a compra de apoio político e pagamento de dívida. Esse não é o primeiro e nem será o último caso de corrupção no Brasil. Segundo a ONG Transparência Internacional, o país ocupa a 73ª posição no ranking de corrupção, que significa quebra de um estado funcional e organizado. Além da política, a corrupção pode se manifestar no nosso cotidiano, em atitudes simples de qualquer cidadão.
Congresso Nacional contra a corrupção foi realizado em Rio Branco, nos últimos dias 23 e 24 de agosto
No julgamento do mensalão, são apontados 7 crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa ou passiva, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta. Além do mensalão, outros casos de corrupção fazem parte do processo histórico do Brasil. Nos últimos anos, podemos destacar os escândalos no Ministério da Pesca, com o gasto de R$ 31 milhões na compra de 28 lanchas; no Ministério do Esporte, com o desvio de dinheiro público usando ONGs como fachada; o Caso Cachoeira, envolvendo políticos influentes da capital federal; dentre outros.

Uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em 2007, mostra que aumentou a preocupação do brasileiro com a corrupção. O Sensus quis saber do que os brasileiros tinham orgulho e do que tinham vergonha. Os três principais motivos para não se ter orgulho do Brasil são: a corrupção (41,3%), a violência (17,1%) e a pobreza (12,7%). Entre os três principais motivos para se ter orgulho do Brasil estão as riquezas naturais (25,7%); a solidariedade do brasileiro (19,5%) e a ausência de guerras (18,4%). A pesquisa ouviu 2 mil pessoas.

Várias ações de combate à corrupção já estão sendo colocadas em prática, como as leis da Ficha Limpa, de Acesso à Informação, Portal da Transparência, cassação de políticos corruptos, julgamento do mensalão e ações da campanha eleitoral em 17 estados brasileiros (sendo 2 da região norte: Acre e Rondônia).

De acordo com o antropólogo e especialista em políticas públicas, Francisco Bezerra, a corrupção, tanto na gestão quanto no cotidiano da população, está ligada ao contexto histórico de cada país. “Tudo está interligado com a nossa colonização, aos desvios de personalidade, e as pessoas acabam cometendo atos corruptos no dia a dia sem perceber, furando filas, recebendo trocos a mais e outras coisas”, disse.

O especialista comentou, ainda, que o setor empresarial tem um papel importante na luta contra a corrupção. “O senso comum entende que esse assunto está ligado estritamente ao gestor público, mas não é. Está ligado ao poder empresarial também. As empresas precisam adotar medidas para conscientizar seus funcionários para eles serem exemplos dentro da sociedade, e nesse aspecto o Brasil avançou bastante”, finalizou.

Opiniões

A reportagem de A GAZETA também ouviu quem foi assistir ao congresso e conversou com quatro estudantes, que puderam expor suas opiniões sobre o assunto. Confira abaixo:


CLEITON ROCHA, 27 ANOS, ESTUDANTE DE ADMINISTRAÇÃO
“Sou afetado diretamente pela corrupção, dinheiro desviado dos cofres públicos que poderiam ser usados em melhorias na área da saúde, educação e saneamento básico, que são essenciais na vida de qualquer pessoa. Procuro ser correto nas minhas ações, como não furar fila em banco ou devolver troco a mais, coisas simples, do dia a dia”.


FÁTIMA BANDEIRA, 18 ANOS, ESTUDANTE DE JORNALISMO
“Nas eleições a gente vota. Mas, na minha opinião, temos o compromisso de acompanhar os políticos eleitos, as suas ações, porque é a gente que escolhe nossos representantes. Infelizmente, hoje vemos candidatos envolvidos com a corrupção e que continuam livres. Nós que devemos fiscalizar e não deixar isso acontecer”


IVES JOSÉ FERREIRA, 18 ANOS, ESTUDANTE DE ENGENHARIA CIVIL
“Não me acho uma pessoa corrupta. Tenho controle dos meus atos e sei que faço as coisas certas, mas não combato a corrupção das outras pessoas, porque essa não é a minha obrigação. A meu ver, cada um tem que ter consciência do que faz. Isso é uma coisa que vem de berço”


KARYNNE CASTRO, 19 ANOS, ESTUDANTE DE DIREITO
“Acho que deve ter um investimento maior em educação, porque o tema corrupção precisa ser levado às nossas escolas públicas e particulares. Esses estudantes são o nosso futuro. Na minha infância, por exemplo, nunca ouvi um debate sobre o assunto e isso pode fazer a diferença na vida de uma criança ou adolescente”

Congresso Nacional
Considerando a importância da conscientização dos jovens e da população em geral, o Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC) iniciou, em 2004, uma campanha para combater a corrupção. Atualmente, o projeto é conduzido pelo Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais dos Estados e da União (CNPG) e pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp).
Tião Viana pediu consistência no combate à corrupção; Patrícia Rêgo reforçou a reflexão sobre o assunto; Marina debateu o contexto do tema
A primeira edição do Congresso Nacional da campanha “O que você tem a ver com a corrupção?” aconteceu em outubro de 2011, em Porto Alegre/RS. Com o apoio do Ministério Público do Acre (MP/AC), Rio Branco, capital acreana, recebeu a segunda edição do evento nos últimos dias 23 e 24 deste mês. Na oportunidade, aconteceram palestras no auditório da Faao e no Teatro Plácido de Castro, com a participação de algumas personalidades locais e nacionais, como o governador do Acre, Tião Viana, a procuradora-geral de Justiça, Patrícia de Amorim Rêgo, a ex-ministra Marina Silva, entre outros.

O objetivo principal da campanha é combater os vários tipos de corrupção, desde os escândalos políticos até as atitudes simples do dia a dia das pessoas, além de estimular as novas gerações através da construção, em longo prazo, de um país mais justo e transparente.

“Essa campanha visa fazer com que a comunidade faça uma reflexão sobre as boas práticas e fortalecer ainda mais o combate à corrupção. As pessoas precisam refletir sobre o seu papel dentro da sociedade. A gente tem que tirar essa ideia do ‘jeitinho brasileiro’ como sendo tolerável, fazer a coisa certa e ter transparência nas nossas condutas, principalmente o gestor público”, comentou a promotora do Ministério Público do Acre (MP/AC), Waldirene Oliveira, uma das organizadoras do congresso.

Oliveira afirmou, ainda, que além dessa campanha outras ações estão sendo feitas paralelamente. “Estamos fazendo palestras nas Comarcas do interior do Estado, justamente para levar a essas pessoas a importância de atitudes limpas e honestas”, finalizou a promotora.

Na abertura do congresso, o governador Tião Viana declarou que já houve avanços, mas reconheceu que o combate à corrupção precisa ser mais consistente. “Já progredimos muito, mas é preciso dizer que ainda temos um longo caminho pela frente. Como governador e médico, vejo filas de cirurgias nos centros de saúde. Para se ter uma ideia, fomos avaliados pelo segundo ano consecutivo como melhor administração de saúde pública do país e nem por isso eu fico envaidecido. Meu sonho é ver a Saúde Pública funcionando, mas tem funcionário que recebe e não trabalha, o que prejudica a população e o governo tem que gastar mais dinheiro. Nesse país, temos que ter mais conscientização”, frisou.

A procuradora-geral de Justiça, Patrícia de Amorim Rêgo, também falou sobre os objetivos da campanha. “Aproximar o Ministério Público da sociedade e fazer uma discussão aberta sobre esse assunto são algumas das metas desse congresso. São de pequenos gestos até a vida pública que nós podemos acabar com a corrupção”, afirmou.

No segundo dia do congresso, as palestras foram divididas em quatro paineis: Sociedade, Política, Mídia e Cultura/Esporte. O segundo painel (Política) era o mais esperado pelos presentes, com a participação da acrea-na Marina Silva. Em seu discurso, a ex-ministra do meio ambiente ressaltou a importância de entender o contexto da corrupção e apontou a ética como solução.

“A política, na sua essência, é a arte de promover o bem comum. Mas se você perguntar para alguém o que é política, a pessoa vai dizer muitas coisas, menos que é a arte de promover o bem comum. Pessoas virtuosas criam instituições virtuosas. Para corrigir os seres humanos faltosos criamos a ética, que, pra mim, é a base de tudo. Temos meio e conhecimento para combater a corrupção, mas ela continua aí. Isso é um problema técnico? Não, é um problema ético”, destacou Marina Silva.

 A ex-senadora acreana também falou sobre o julgamento do mensalão, o mais importante da história do Supremo Tribunal Federal (STF). “Todo mundo me pergunta o que eu penso do julgamento do mensalão e eu só tenho uma coisa a dizer: que seja feita a justiça. Que os inocentes sejam inocentados e os culpados sejam condenados”, finalizou, sendo aplaudida de pé pelos presentes.

Casos de corrupção no Acre
Recentemente, 8 pessoas foram condenados no caso BanacreNos últimos meses, no Acre, dois casos de corrupção chamaram a atenção da população e reforçaram a importância de combater as irregularidades que insistem em fazer parte da administração pública do país.

Um deles foi a Operação “Tentáculos”, que prendeu uma quadrilha formada por 27 pessoas por fraudarem mais de 500 habilitações em três municípios do Estado: Rio Branco, Senador Guiomard e Bujari. A operação foi feita em um trabalho conjunto entre Ministério Público do Acre (MP/AC), Polícia Civil, Segurança Pública e Departamento de Trânsito do Acre (Detran/AC).
Foram mais de dez meses de investigação e entre os presos estavam psicólogos, um policial civil, três policiais militares e nove autoescolas. As carteiras de habilitação eram vendidas por cerca de mil reais pela quadrilha.

O outro é o “Caso Banacre”, onde oito pessoas foram condenadas por atos de improbidade administrativa cometidos na gestão do Banco do Estado do Acre (Banacre).

Pressionada, a administração do banco reuniu todos os créditos de todos os maiores devedores em um só título e programou uma nova data de vencimento. Como o Estado ainda não tinha quitado suas dívidas com os credores – no caso, os devedores do banco – a data de vencimento passou a ser alterada com frequên-cia, levando o Banacre para um prejuízo sem fim.
Quando o Banco Central fiscalizou a entidade financeira, constatou algumas irregularidades na administração do banco e constatou o crime por improbidade.

A Gazeta do Acre: