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Construindo a garantia do direito humano à alimentação Cleísa Brasil da Cunha Cartaxo* Um bilhão de pessoas passam fome no mundo e a construção das soluções para esse problema passa, necessariamente, pela união de esforços entre sociedade civil organi

Um bilhão de pessoas passam fome no mundo e a construção das soluções para esse problema passa, necessariamente, pela união de esforços entre sociedade civil organizada e governos. Em virtude desse quadro, no dia 16 de outubro comemorou-se, no mundo inteiro, o Dia Mundial da Alimentação.

Essa data foi criada pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) como forma de chamar a atenção dos diversos paí-ses que compõem a ONU para as questões referentes à fome e à produção de alimentos no mundo, tais como a necessidade de se promover o aumento da produção de alimentos; a cooperação econômica e técnica entre países em desenvolvimento; a participação de populações rurais e mulheres nos processos de tomada de decisões; o aumento da consciência da população mundial sobre o problema da fome no mundo; a transferência de tecnologias aos países em desenvolvimento; além de fomentar a solidariedade mundial para a luta contra a fome, a má nutrição e a pobreza.

No documento “O Estado da Insegurança Alimentar no Mundo 2012” a FAO alerta para o fato de que cerca de 870 milhões de pessoas ainda sofrem de subnutrição crônica em todo o mundo, o que representa 12,5% da população mundial ou 1 em cada 8 habitantes do planeta. Segundo o mesmo documento, apesar desses números haverem diminuído em 132 milhões de pessoas com relação ao período de 1990-1992, essa redução se deu de forma mais acentuada até o ano de 2007, demonstrando de forma preocupante a desaceleração desse processo promovido pela crise econômica mundial, pondo em risco os resultados já alcançados.

No Brasil, a problemática da fome foi tratada pelo sociólogo Josué de Castro em seu livro “Geografia da Fome”, lançado em 1946, o qual mostrou que as verdadeiras causas do problema tinham a ver com a adoção de modelos econômicos e de políticas públicas excludentes e preconceituosas.

Ao longo de décadas, a construção de um entendimento comum de que a participação e o controle social na definição e acompanhamento das políticas públicas de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é fundamental para se chegar o mais próximo possível dos mais vulneráveis tem resultado em grandes avanços nessa luta, a partir da conversão de esforços entre a sociedade civil organizada, governos (federal, estadual e municipal) e parlamentares.
A importante mobilização da sociedade civil para esse tema no país culminou com a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) em 1993 – extinto dois anos depois – e sua recriação em 2003, pelo presidente Lula, a partir do Decreto nº 4.582 de 30 de janeiro de 2003.

A partir de então, importantes políticas e programas de segurança alimentar e nutricional já implantados no país, como por exemplo, o Programa Nacional de Alimentação Escolar e o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, foram revistos, enquanto outros novos como os Programas Fome Zero, Bolsa Família e Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar foram criados, sendo permanentemente acompanhados pelo Conselho, que possui caráter consultivo e de assessoramento ao Presidente da República na definição das políticas de SAN.

A articulação entre sociedade civil e Governo Federal resultou, dentre outras coisas, na criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricio-nal (Sisan) em 2006, que deve funcionar como instrumento de promoção do direito humano à alimentação adequada e à segurança alimentar e nutricional da população brasileira uma vez que é composto por diversas instâncias de debate, proposição e avaliação como a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; o Consea nacional; a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional; órgãos e entidades de segurança alimentar e nutricional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e por instituições privadas, com ou sem fins lucrativos, que manifestem interesse na adesão e que respeitem seus critérios, princípios e diretrizes.

Outra prova de que essa união entre sociedade civil organizada e as três esferas de poder é positiva para o país se concretiza na inclusão do direito à alimentação como um direito constitucional de todo cidadão brasileiro, se fazendo presente no parágrafo 6 da Constituição Federal a partir da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 047/2003, promulgada em 4 de fevereiro de 2010 pelo Congresso Nacional.
Apesar dessas conquistas, muito ainda se tem que avançar rumo à construção de uma sociedade justa e sem fome. O Brasil ainda conta com um preocupante número de 50 milhões de brasileiros que têm, diariamente, seu acesso à alimentação saudável e adequada limitado ou nulo.

Por essa razão, nesse momento em que vivemos no planeta uma das mais graves crises econômicas e ambientais, cujas consequências recaem, inclusive, sobre nosso país, faz-se imprescindível o fortalecimento desse diálogo e o empenho contínuo e permanente de movimentos sociais com governos estaduais e prefeituras municipais no sentido de se promover a implementação do Sisan por meio da criação dos conselhos locais e assim termos de fato políticas públicas de SAN que atendam de forma mais efetiva à população brasileira.

*Cleísa Brasil da Cunha cartaxo é engenheira-agrônoma, mestre em Horticultura (Tecnologia de Pós-colheita), pesquisadora da Embrapa Acre, secretária-executiva do Coep Acre, membro do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, cleisa.cartaxo@embrapa.br

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