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Desastres são previsíveis?

Os danos advindos de “desastres crônicos” referentes a secas prolongadas e  associadas a incêndios e inundações já totalizaram mais de 300 milhões de reais em Rio Branco nos últimos anos, como discutimos num artigo publicado no dia 13 de setembro no jornal “A GAZETA”.  Não foram poucos os prejuizos, tampouco o sofrimento humano associados a esses desastres.

Mas o que é um desastre e como podemos reduzir o seu risco? O Ministério da Integração Nacional recentemente definiu desastre como “resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um cenário vulnerável, causando grave perturbação ao funcionamento de uma comunidade ou sociedade envolvendo extensivas perdas e danos humanos, materiais, econômicos ou ambientais, que excedem a sua capacidade de lidar com o problema usando meios próprios”. 

Baseado nesta definição, a inundação de fevereiro de 2012 do Rio Acre provocou uma série de desastres nas suas cidades ribeirinhas, chegando a mais de 200 milhões de reais de danos econômicos e uma quantidade não mensurado de dor humana. 

Se quisermos reduzir o risco de desastres, precisamos entender um pouco como eles ocorrem e seus possíveis impactos. Podemos dividir desastres em dois tipos: crônicos e outros que escapam a nossa capacidade de imaginação.  Estes eventos que foge  da nossa experiência e imaginação podem ser classificados como “Cisnes Negros”.

A razão deste nome vem do livro de Nassim Taleb que notou pela sua experiência que se você só viu cisnes brancos, isto não o permitiria pensar que existem cisnes negros.  Em outras palavras, o indivíduo ou uma sociedade não consegue antecipar facilmente alguns eventos que são estão fora da sua experiência, mas pode-riam ser impactantes.

Listamos incêndios e inundações como desastres crônicos, mas foi sempre assim?   Vamos voltar oito anos atrás em 2004 e usar a nossa imaginação. Encontramos um vidente, naquela época, que disse:  “Olha, no ano que vem a seca vai ser tão severa que centenas de milhares de hectares de florestas vão sofrer incêndios. E a mesma situação acontecerá em 2010, impactando o oeste do Estado com dezenas de milhares de hectares de florestas incendiadas. Além disso, inundações ficarão tão frequentes que em 2009, 2010, 2011 e 2012 os danos causados em Rio Branco serão medidos em dezenas de milhões de reais cada ano!”

E o vidente continua com mais prognósticos: “Cerca de mil bolivianos vão se refugiar no Acre por causa da violência em Pando, Bolívia em 2008. No mesmo ano a sede do governo de Madre De Dios, Peru será queimada completamente”.  E, se isto não for suficiente para colocar em duvida  a sua credibilidade, o vidente complementou: “No dia 30 de dezembro de 2011 vai acontecer um evento da cultura haitiana na praça da cidade de Brasiléia, onde estarão mais de mil haitianos refugiados”. 

Neste ponto da conversa em 2004, você provavelmente pensou que o nosso vidente estava bebendo cachaça demais para sua saúde. Afinal, incêndios florestais pode-riam acontecer, mesmo sendo muito improvável;  o Haiti, porém, é uma ilha  quase 3.000 km distante do Acre, situada no Caribe. Foi muita cachaça mesmo.

Mas, eventos extremamente raros como incêndios florestais de grandes dimensões ou razoavelmente raros como inundações, em oito anos, passaram a ser desastres crônicos, o que significa que os cisnes negros se transformaram em cisnes brancos, ou seja, acontecimentos que se tornaram comuns em poucos anos.

Olhando oito anos à frente para 2020, será que podemos anticipar outros desastres e criar formas de minimizar seus riscos? Discutiremos possíveis cisnes negros em artigos subsequentes, mas se os últimos oito anos servem como guia, alguns desastres podem ser previstos, no entanto outros estarão além da nossa imaginação. Os custos poderão ser medidos de dezenas a centenas de milhões de reais e muitas vidas serão afetadas. Diante desta incerteza, o que podemos fazer?

Um primeiro passo é aceitar que desastres vão acontecer nos próximos anos.  Negar esta realidade é muito humano, porém, perigoso. Um segundo passo seria implementar programas que fortalecem comunidades frente a desastres, reduzindo os seus impactos negativos. A preparação para um tipo de desastre, como inundações, ajudaria comunidades a desenvolver a resiliência a desastres de outros tipos. A Defesa Civil Nacional tem um programa chamado “Construindo Cidades Resilientes a Desastres” (http://www.defesacivil.gov.br/cidadesresilientes/) que pode ajudar muito a guiar políticas públicas em municípios, poupando gastos públicos e reduzindo sofrimento humano nos próximos anos.

Para prefeitos e vereadores eleitos este programa pode ser relevante social e ambientalmente, além do custo baixo, comparado aos altos custos de desastres recentes. Afinal, estamos no século 21 e precisamos nos preparar para novos desafios, incluindo os que vão além da nossa imaginação.

Foster Brown, pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC) e Cientista do Experimento de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Parque Zoobotânico da UFAC.  É membro da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais (CEGdRA) desde 2011.

Antonio Willian Flores de Melo, Docente do Centro de Ciências Biológicas e da Natureza da UFAC.

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