O dia 8 de março, dia internacional da mulher, não poderia passar sem a história da carioca Cláudia Renata Salim Pereira Malheiro, de 47 anos. Além de entender a lei do impedimento, ela foi a campo e mostrou que o gênero pouco importa no quesito futebol. Cláudia Malheiro começou a carreira no esporte sendo jogadora e anos depois se tornou a primeira mulher a comandar um time masculino do Brasil, a primeira técnica do país. Hoje ajuda os clubes do Acre, direta ou indiretamente, na formação das categorias de base.
Cláudia Malheiro começou a jogar futebol quando tinha 15 anos. Atuou em times de Manaus/AM e Rio de Janeiro/RJ. Para ela, o esporte foi uma forma de diversão, já que morava na zona rural com a família.
Apaixonada pelo futebol, a engenheira agrônoma de formação quis ir além de ser apenas mais uma jogadora entre tantas espalhadas pelo mundo. Aos 34 anos, passou a estudar e se interessou pela parte técnica da modalidade.
“Comecei a me interessar pelas formações, táticas, enfim. Quando voltei para o Acre, em 1999, fui convidada para ser auxiliar técnica de Ulisses Torres (que na época comandava o Vasco da Gama). Deu tão certo que fomos campeões estaduais naquele ano”, disse ela, orgulhosa.
No mesmo ano, Malheiro assumiu o comando técnico do Vasco da Gama e treinou a equipe na participação no Campeonato Brasileiro da Série C – Ulisses Torres estava suspenso na época. Foi quando se tornou a primeira mulher a comandar um time de futebol profissional no Brasil.
Ela ainda comandou o Andirá em 2000 e em 2007, quando garantiu o inédito vice-campeonato estadual ao Morcego. Entre 2010 e 2012 foi coordenadora das categorias de base do Rio Branco. Hoje, com poucas esperanças nos times profissionais, ajuda algumas equipes na formação de jovens atletas, mas não descarta voltar à beira do gramado.
“As equipes profissionais do Acre são muito desorganizadas e dependem muito do repasse do Governo. Falta dinheiro, falta uniforme nos treinos, preparador físico, médico e outras dificuldades. Me desanimei porque acho que precisam aparecer pessoas comprometidas com o projeto de tornar um clube realmente profissional. Não é só dinheiro, é vontade e comprometimento. Se isso um dia acontecer, eu topo voltar a treinar um time”, declarou Cláudia Malheiro.
Preconceito e respeito
Além da pressão e dos preconceitos das arquibancadas, a treinadora também teve o desafio de trabalhar com um esporte genuinamente masculino. Para ela, isso não foi problema.
“O preconceito é mais da arquibancada. Quando comecei as críticas eram pesadas mesmo, mas depois o pessoal começou a reconhecer meu trabalho.
Dentro de campo, por incrível que pareça, sempre fui muito respeitada pelos jogadores. O respeito que eles têm por mim me deixou feliz. Isso marca a gente. Uma mulher no comando de um time de futebol não é normal, mas pra mim foi natural. Trabalhei na roça, junto com homens. ‘Enfrentar’ eles dentro do gramado foi fácil”, relatou.
Momento marcante
Casada e mãe de duas filhas, Cláudia Malheiro destacou que a carreira no futebol deixou lembranças positivas. Uma delas foi um fato que ocorreu no jogo entre Rio Branco e Andirá, pelo Campeonato Acreano de 2000. Técnica do Morcego na época, ela se deparou com uma briga entre jogadores.
“Esse jogo foi marcante. De repente os jogadores começaram a brigar no campo. Eu, de forma impensada, entrei no gramado para apartar a briga. Achei que ia apanhar, mas me surpreendi. Eles me respeitaram e pararam a discussão no mesmo instante que cheguei. Foi uma forma deles mostrarem respeito. Nunca vou esquecer isso”.
Sem medo
E para as mulheres que sonham em trabalhar no futebol ou em outras profissões consideradas masculinas, Cláudia Malheiro deixa um recado.
“Quem quiser encarar uma profissão que não é comum para as mulheres, tem que ter coragem e persistência. É preciso também ter vontade para seguir em frente. Não desistir é fundamental”, finalizou. (João Paulo Maia / GE Acre)