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Juridicamente, as 11,5 mil demissões são inevitáveis, afirma procurador do MPT

 O Ministério Público do Trabalho é uma das instituições fiscalizadoras da lei que tentou, desde 1988, buscar solucionar o problema envolvendo os 11,5 mil funcionários públicos do Acre, contratados sem concurso público ou por regime celetista ou regime estatutário.

 O raciocínio, segundo o órgão, é reto: ingressar no serviço público sem concurso é ilegal. É inconstitucional. Ponto.

 Para o procurador do MPT no Acre, Marcos Gomes Cutrim, do ponto de vista jurídico, as demissões são inevitáveis. “E a lei não pode ser responsabilizada por isso”, analisa. “É justamente o contrário: foi pelo fato de governantes não observarem e zelarem pela lei que a situação chegou a esse ponto”. Leia os principais trechos da entrevista concedida na última sexta feira na sede do MPT.

A GAZETA: As demissões são ou não são inevitáveis?

Marcos Cutrim: Qual foi a discussão que gerou na última sessão do STF? O Supremo disse: ‘Olha… realmente vão ter que demitir’. Agora, o ‘como’ é que está sendo estudado. É o que se chama de modulação de efeitos da Adin [Ação Direta de Inconstitucionalidade]. Que efeitos são esses que vão ser regulados? O Supremo julga amanhã e depois de amanhã está todo mundo na rua? Certamente, não.

A GAZETA: Mas, como seria feito, então?

Marcos Cutrim: Primeiro, é preciso estabelecer um prazo para o Estado do Acre para demitir esse pessoal todo: colocar na rua mesmo. E também observar algumas situações que foram constatadas nesses 25 anos, desde a Constituição.

A GAZETA: Uma das preocupações dessa ‘modulação’ diz respeito aos aposentados.

Marcos Cutrim: Sim. Os aposentados como é que ficam? Como ficam os aposentados por invalidez? E os pensionistas também, que estão recebendo pensão de servidor que era irregular e que morreu? Como é que vão ficar essas pessoas? Aí, é preciso esperar a segunda parte do julgamento do Supremo para saber como isso vai ser tratado.

A GAZETA: Essas pessoas, irregulares ou não, contribuíram com o regime previdenciário…Não seria justo o Supremo ignorar essa contribuição…

Marcos Cutrim: O que eu vou te falar agora é uma especulação. Em termos de ‘tempo de serviço’ até mesmo os servidores irregulares que contribuíram, uma vez demitidos, mais tarde, vão poder compensar lá na Previdência Social. Eles vão pegar uma certidão de tempo de serviço do Estado, averbar na Previdência e só vai trabalhar pelo tempo restante na iniciativa privada ou no próprio Estado se for aprovado em concurso. Eles não vão perder esse tempo de serviço.

A GAZETA: Mas, a situação dos aposentados é mais complicada…

Marcos Cutrim: Imagine que um homem que atingiu 35 anos de serviço, tendo sido 25 no Estado de forma irregular. Ele já contribuiu. Por lei, a Previdência não pode devolver esse dinheiro que ele recolheu, ainda que ele seja um servidor irregular. E ele adquiriu o tempo que a própria Constituição determina para aposentadoria. Então, ele tem que se aposentar. Essas situações é que o Supremo vai dizer. Essa questão da modulação dos efeitos dá um poder enorme ao Supremo para decidir como serão resolvidas essas questões.

A GAZETA: Imagine que o senhor esteja diante de uma plateia formada por uma parte dos 11,5 mil servidores irregulares. O que o senhor argumentaria a favor da demissão? Por que é importante fazer esse tipo de correção agora?

Marcos Cutrim: As pessoas e os servidores que vão ser demitidos têm que entender: a Constituição da República é a lei maior do país. É ela quem diz como o país tem que funcionar em todas as áreas. E das regras diz respeito ao acesso ao cargo público. A regra é: só se acessa um cargo público uma pessoa que seja aprovada em concurso público.

A GAZETA: Qual princípio está em jogo?

Marcos Cutrim: A ideia é que o acesso seja feito por meio de um princípio que chamamos ‘impessoalidade’. Por meio do mérito: disputaram um concurso em condições de igualdade e não porque tem relações de parentesco, de amizade, filosófica, religiosa, partidária. Nós temos que pensar no futuro: nos seus filhos, eu diria. Se nós descumprirmos a Constituição, é possível que daqui a algum tempo o seu filho pode ser prejudicado porque não é apadrinhado pelo gestor público.

A GAZETA: Quem errou?

Marcos Cutrim: Os administradores que poderiam ter realizado o concurso ou eram a figura do governador ou dos prefeitos. Todos os governadores e prefeitos que permitiram essa situação porque não fizeram concurso público são responsáveis por esse caos. A postura do estado foi protelar o máximo possível a decisão que, agora, o Supremo vai tomar. No final das contas, não valeu à pena para ninguém.

A GAZETA: Lideranças politicas têm declarado que será possível conciliar o respeito à Constituição e a manutenção dos 11,5 mil funcionários.

Marcos Cutrim: Do ponto de vista jurídico, as demissões, ao meu ver, são inevitáveis.

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