“Toda a glória seja dada ao Senhor”. A frase emocionada e acompanhada de dois pulos de alegria foi disparada na quarta-feira passada, pelo jovem Lucas Medeiros, enquanto concedia entrevista à GAZETA, minutos depois de verificar na tela do computador, que 1.001 novos cadastrados permitiram engordar a sua conta bancária em mais R$ 200 mil, valor referente a 14 dias apenas de registros.
Medeiros pertence à Equipe Titânio, vinculada à Telex-Free, um grupo de pessoas que já fez ao menos 5 milionários por meio do marketing multinível no Acre. Ao seu lado, Jailson Lima, o pizzaiolo que deixou o emprego de R$ 740 por mês para se tornar um dos mais bem sucedidos empreendedores deste negócio.
O marketing de rede já é uma febre no Acre. Em Rio Branco, embora tenha começado há apenas um ano e meio, já contaminou famílias inteiras em Rio Branco e se expande para o interior do Estado.
Em Plácido de Castro, município a 100 quilômetros de Rio Branco, a cidade parece mais estar vivendo um ano político, com faixas, banners, outdoors e penduricalhos de toda a espécie de empresas que oferecem ganhos gordos e rápidos.
Em Cruzeiro do Sul, encontros de até 250 pessoas são feitos todas as semanas por líderes de rede e, até algumas igrejas evangélicas recomendaram a seus fiéis que se cadastrassem na rede de seus pastores. Este é, por exemplo, o caso de uma denominação do Bairro Sobral, aqui em Rio Branco.
Mas até onde esta nova ordem econômica pode levar? É possível haver algum cunho de farsa em ganhos rápidos e astronômicos? E as velhas pirâmides financeiras, golpes que levaram muitos a amargar prejuízos ainda na década de 1920? Elas voltaram?
“É preciso muito cuidado realmente”, diz o consultor da Polishop, Daniel Hoory, em entrevista exclusiva para o caderno ACRE ECONOMIA via Skype. Hoory faz parte da categoria “Diamante” na Polishop, empresa especialista em venda de produtos inovadores e é um dos mais bem sucedidos na América Latina, no sistema multinível.
“As pessoas aí do Acre têm que ter em mente que não são todas as empresas que podem ser consideradas sérias. É preciso muito cuidado. Mas é perfeitamente possível escolher aquelas que podem alavancar sua vida financeira com ga-nhos excelentes”, conta o mi-lionário, desde sua casa em São Paulo, para A GAZETA.
Para o presidente da Federação do Comércio do Estado do Acre, (Fecomércio), Leandro Domingos, o ponto de vista transparece cautela. “Não vejo com bons olhos, pois percebo que existem pessoas que se desfizeram de bens pessoais, como carros e jóias, para investir nesse tipo de negócio. Vejo como um negócio de alto risco. Não concordamos com esses investimentos e temos certeza de que, em um determinado momento, muitos vão perder”, dispara Domingos.
Ele considera “um certo exagero nesse ramo de negócio alguns mais qualificados no plano de marketing”.
“Cheques vultosos, bem acima dos padrões de altos executivos, são expostos a esmo como forma de incentivar a adesão de novos distribuidores. O que não é explícito é o lucro líquido do valor, uma vez que, em se tratando de negócios, deve haver um capital de giro mínimo”, pontua o presidente da Fecomércio.
Quem formou rede, no entanto, acredita que não. “A TelexFree, por exemplo, conta com a colaboração de divulgadores para seus produtos. É algo sustentável porque ela partilha os lucros com telefonia com seus parceiros cadastrados e paga em média R$ 50 milhões por mês em imposto de renda ao governo”, defende Lucas Medeiros.
O sistema tem um escopo de funcionamento mais ou menos simples. Funciona assim: as empresas criam um algum benefício para quem indica clientes, ou pelo menos tentam, apesar de na prática poucos desfrutarem desses benefícios, e formam parcerias.
Para Marcos Duda, outro consultor em marketing multinível, a ideia pode ser traduzida da seguinte forma: Quantas vezes você já viu um filme no cinema e indicou para alguns amigos e pessoas que por sua indicação foram assistir ao mesmo filme? Quantas vezes você comprou determinado produto ou utilizou algum serviço e indicou para conhecidos e esses adquiriram o mesmo? Fazemos isso o tempo todo, afinal “amigos fazem o que amigos fazem”. Portanto, em cima disso foi criada a ideia do marketing multinível.
“As pessoas podem ser remuneradas por esse efeito “viral” que criam no consumo delas mesmas. Quanto maior o nível de relacionamento e credibilidade social da pessoa, maior esse efeito. Em resumo, a ideia é pegar parte do lucro da venda do produto e distribuir com as pessoas que ajudaram por seu marketing pessoal na venda do produto. Mas isso, em níveis”.
No Acre, banco temeu quebradeira financeira
Divergências à parte, o que na prática vem ocorrendo no Acre, depois da explosão de empresas de vendas diretas é um esvaziamento de poupanças e aplicações em certas instituições financeiras.
Na correria de um lucro altíssimo, alguns atingindo a casa dos 26% ao mês, muitos poupadores raparam suas economias para empregar o dinheiro na compra de pacotes destas empresas.
Em Rio Branco, a situação chegou ao ponto de executivos de um banco estatal pedirem uma reunião com líderes de rede de uma dessas empresas para conscientizá-los do esvaziamento das poupanças. “Queremos que vocês peçam a seus afiliados que retornem com os lucros para o nosso banco”, teria dito um dos funcionários.
A questão que se colocou é: esse novo tipo de comércio digital pode prejudicar a praça local? Para o presidente da Fecomércio, a resposta é sim.
“As pessoas retiram seus recursos de aplicações conservadoras para apostar no marketing multinível. Se esses investimentos circulassem no comércio local, seria interessante, mas isso não acontece. Os recursos vão em sua maioria para fora do país”, frisa Domingos. No Acre, ainda não há estatísticas de quanto poderia ser o impacto do escape de dinheiro que as redes de multiníveis podem acarretar.
Mas se percebe que muitos investidores do negócio em rede estão optando por comprar terrenos e imóveis, um dos setores de maior valor agregado no Acre.
Ainda há chance para mais pessoas aderirem
Para quem ainda pretende entrar nesta área de negócios, a boa notícia é que experiências como as que os acreanos estão vivendo hoje já fazem parte da rotina de 40% da população americana. Nos Estados Unidos, famílias inteiras vivem do sistema de marketing multinível e que no Brasil, por incrível que pareça, ainda não foi totalmente disseminado nem nos grandes centros do país.
Marcas tradicionais como a Hinode, Avon, Herbalife já praticam a venda direta de alguma forma, mas a diferença para as que estão se consolidando se dá pela celeridade com que os ganhos são obtidos.
“Não tenho do que reclamar, porque embora tenha meu emprego tradicional, o sistema me garante um ganho extra, algo impensável anos atrás e que foi até motivo de chacota por muitos quando resolvi aderir”, conta o jornalista Jardel Angelim.
Para Welington Silva, consultor da Polishop no Acre, é importante que as pessoas tenham em mente que ao comprar um produto, ela poderá ter ganhos junto à empresa. “Não se trata de levar vantagens, mas de se permitir um complemento de renda”, explica o divulgador.
“É fácil? Não é. É preciso muita paciência e convicção de que as pessoas merecem melhorar de vida. Não é pedir tanto”, pontua Silva.
Como trabalham as empresas de marketing multinível legítimas
* Tem consumo alto de seus produtos fora rede, ou seja, existem mais pessoas fora da rede cadastrada, utilizando seus produtos, que dentro;
* Se não existisse a rede esses produtos seriam comercializados da mesma maneira e pelo mesmo preço de maneira tradicional;
* Como a empresa paga sobre venda de produtos, se não entrar mais ninguém ela continua faturando e pagando normalmente, afinal o dinheiro vem das vendas e não da entrada de pessoas;
* Se a empresa fechar, ela não fica devendo nada para ninguém, afinal o pagamento veio das vendas concretizadas;
* Empresas legítimas participam de órgãos de regulamentação como no caso do Brasil a ABEVD;
A lógica da rede
* Nascem e morrem pessoas todos os dias;
*Nem todos indicam pessoas;
*Boas empresas têm produtos que geram recompra;
*Os contratos geralmente têm prazo de validade e se a pessoa fica muito tempo inativa tem que cadastrar novamente;
* Já indicamos coisas sem ganhar nada! Por que não indicar ganhando?
Fonte: Associação Brasileira de Vendas Diretas (ABVED)