Há 1 semana, o assalto à Casa Lotérica Trevo da Sorte, com 25 reféns, parou a cidade de Rio Branco. As notícias do fato romperam barreiras e logo o país inteiro passou a acompanhar o caso. Já passavam de 6 horas de negociação quando os assaltantes se entregaram. Ninguém saiu ferido.
Nessa história toda, um homem chamou a atenção durante as coberturas jornalísticas locais. Ele não estava dentro da lotérica e nem era refém, mas aparecia em uma foto divulgada no site G1 do Acre, em posição de ataque. Muito estiloso, o policial aposentado Albion Gomes de Almeida, 65 anos, estava à paisana quando percebeu a ação dos bandidos. Ele foi uma das primeiras pessoas a identificar o assalto.
Rapidamente, a foto começou a repercutir nas redes sociais e virou um ‘meme’ (termo usado para imagens, frases ou vídeos que se espalham pela internet). Montagens com Albion foram compartilhadas no meio virtual e logo ele, que até então era conhecido no Acre pela reputação de policial destemido, passou a ser moda também entre os jovens.
A imagem que ficou eternizada em um retrato único foi feita pelo repórter fotográfico Eduardo Duarte. Ainda sem acreditar no sucesso do seu trabalho, ele conta como tudo aconteceu.
“No dia do assalto a minha esposa estava indo à loteria no exato momento. Eu permaneci no meu trabalho, que fica a alguns metros de onde tudo aconteceu. Ela resolveu algumas coisas em uma loja de tecidos, parou para comprar uma ‘raspadinha’ e, quando ia entrar na lotérica, o Moisés, líder dos assaltantes, fechou a porta na cara dela. No mesmo instante, ela me ligou e disse ‘rapaz, o cara fechou a loteria e deixou todo mundo preso lá. Está tendo um assalto. Teve tiro. Teve tudo’”, relata Eduardo.
O jornalista lembra que as suas primeiras reações foram pedir que a esposa fosse para casa e depois sair com o equipamento fotográfico em disparada ao encontro do local onde as pessoas estavam sendo mantidas reféns. Ele chegou às proximidades da loteria junto aos profissionais de segurança.
“Quando cheguei à esquina da rua, na farmácia de manipulação, escutei 2 tiros e vi as pessoas se recolhendo. Consegui andar em torno das quadras dali e me posicionar atrás da banca de bombons. Nessa hora, a polícia ainda não tinha feito o cerco. Por isso consegui uma posição privilegiada. A preocupação ainda era saber o que estava acontecendo lá dentro. O efetivo também era pequeno até aí”.
O fotógrafo revela que aproveitou para fazer o máximo de fotos possíveis, com medo de ser retirado do local pelos policiais militares, já que a posição o deixava em risco e até então era o único profissional da imprensa ali. Segundo ele, fazer os registros era de suma importância naquele instante. Foi então que ele conseguiu captar a imagem de Albion e ganhar destaque nacionalmente.
“Os policiais já estavam me pedindo para sair quando ouvi aquela voz lá do canto. Era o Albion dizendo ‘larga a arma e se rende’. Foi totalmente destoante você ver os policiais e, entre eles, um senhor de chapéu, pochete e camisa à paisana. Eu me perguntei ‘o que esse cara tá fazendo aí?’. Então só virei e o fotografei”, lembra.
Poucos minutos depois, Eduardo foi afastado do local e posto atrás da linha de isolamento. Ao mesmo tempo, a imprensa acreana chegou, mas tinha sido ele o único a pegar o melhor ângulo.
O fotógrafo declara que não sentiu medo de ser atingido durante o tempo em que passou próximo à lotérica. Após procurar proteção em uma banca de doces, a sua maior preocupação era fazer as fotos. “Isso faz parte do nosso trabalho. Os profissionais de imagem são os que correm mais riscos, mas estamos cientes disso”, declara.
Informado de que a sua foto havia ganhado grande repercussão na internet e em jornais a nível nacional, Eduardo se diz surpreso e que não esperava que a foto de Albion armado fosse fazer tanto sucesso, até porque ele não conhecia o ex-policial. “Não sabia quem ele era. Os profissionais mais antigos que o conhecem com todo um folclore em volta dele. Para mim, era uma figura estranha que estava naquele lugar”, revela.
O fotógrafo conta que grandes veículos de comunicação reproduziram o seu material, sem dar os devidos créditos, mas, apesar disso, afirma não ter ficado abalado. “Vários sites compartilharam a foto. Esta história do ‘meme’ não me deixou chateado. Fique até feliz. É engraçado ver uma foto minha virando ‘meme’. Acho que a imagem, depois que acontece, tem realmente que correr e mostrar o que houve. Não vi nenhuma sendo usada de forma comercial ou indevida. Quem usou para brincar ou noticiar, tá valendo. Até o momento não soube de nenhuma legenda fora de contexto e isso me deixa mais tranquilo”, aponta.
Depois da foto, ex-policial é reconhecido pelas pessoas na rua
Albion ficou tão famoso que é difícil caminhar nas ruas de Rio Branco sem ser reconhecido. Alguns apertam a sua mão, outros dão parabéns pelo desempenho na tentativa de conter o assalto. A foto feita por Eduardo Duarte tornou o policial aposentado uma celebridade acreana.
Ainda surpreso com o sucesso instantâneo, ele conta como foi flagrado apontando uma arma para o assaltante. “Eu ia passando no local quando ouvi alguém gritar ‘é um assalto’. Foi então que fiquei em posição de alerta para auxiliar na segurança até os reforços chegarem. A minha ideia foi ajudar quem estava precisando de ajuda. Eu estava pronto para qualquer eventualidade”.
O policial, que está aposentado há menos de 1 ano, revela que em 43 anos de serviço nunca havia participado de algo grande como o assalto à lotérica. Ele acredita que a ação da polícia foi correta. “Nossa tranquilidade foi essencial para o desfecho que teve, sem vítimas”, avalia.
Um encontro marcado
A GAZETA esquematizou um encontro entre Albion e Eduardo Duarte. Os 2 nunca haviam se falado antes, apesar das histórias de vida deles terem se cruzado durante um momento de tensão.
Na manhã de ontem, pela 1ª vez, o policial aposentado e o fotógrafo puderam conversar sobre o dia do assalto. Eduardo aproveitou a ocasião para presentear Albion com uma cópia da foto que o tornou famoso. Os sorrisos surgiram espontaneamente.
“É uma figura carismática. Presenteá-lo é uma forma de aproximação, porque a gente nunca tem contato com aquilo que a gente está fotografando”, declara Duarte.
Feliz com a fotografia, Albion aprovou o trabalho de Eduardo. “A foto foi muito bem tirada. Gostei muito. Esta imagem vai ser emoldurada e será guardada como relíquia”, afirma ele. (Fotos: Odair Leal/ A GAZETA)