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Ciência e tecnologia (ponderando nossos problemas)

Nesta semana vivemos, aqui em Rio Branco, a 66ª Reunião Anual da SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, com o tema “Ciência e Tecnologia em uma Amazônia sem Fronteiras”.  No evento, foram enfocados tópicos que afetam em especial o Estado do Acre. Tais como: questões indígenas; subida desproporcio-nal dos grandes rios; preservação da floresta; combate ao desmatamento e; políticas públicas em prol do desenvolvimento sustentável da região. A meu ver, com o acontecimento, se materializa a afirmação, em dias idos, do filósofo Alfred Whitehead (1861-1947)  “a ciência moderna nasceu na Europa, mas a sua pátria é o mundo”. Uma vez que, aqui nas últimas fronteiras,  acadêmicos e cientistas se uniram em uma combinação qualitativa destinada, notadamente a estudar os fenômenos naturais da Amazônia.

Agrada-me testemunhar que estamos pensando os nossos problemas, pondo de lado a ciência planetária que procura saber se o universo é eterno e ilimitado, ou pesquisar as estrelas para estudar os limites do tempo. Avaliar se detectores de luz e computadores de alta velocidade pode ser usado para vigiar 2.500 galáxias, fotografando todas as estrelas que explodirem nestes imensos enxames de astros. Determinar quanto tempo à vida vai continuar existindo no nosso planeta e quando o nosso mundo vai acabar, destruído pela expansão do Sol, daqui a bilhões de anos. Mostrar, com telescópios, que as galáxias contendo as estrelas e os planetas estão se afastando uma das outras, como fragmentos de uma grande explosão.

A propósito, pensadores existencialistas em redor do mundo, são da opinião que chega  de despender milhões de reais nessas pesquisas extraterrestres, que até aqui não deu em coisa alguma. Todavia, alheias ao problema da sobrevivência humana, as nações poderosas estranhamente gastam milhões de dólares na tentativa de criar a vida, ou descobrir sua origem. Quando, o óbvio seria destinar tempo e recursos para cuidarmos da vida que já temos aqui. Se é assim temos um fato irônico em que a ciência devotada à solução de nossos problemas, se tenha tornado por sua vez um problema. Antes, devemos refletir sobre a vida do homem, seu abandono e suas angústias. Exaltar a liberdade pessoal e sublinhar a necessidade de tornar a vida significativa  e não buscar “encontrar” o significado da vida. Afinal, a existência humana é poder ser: projetar-se, utilizando as coisas como instrumento. As coisas não são para contemplação, mas para serem usadas pelo homem, diria M. Heidegger  (Ser e Tempo)

Não se trata de conceito idiota, pois sei da importância que a ciência e a tecnologia têm, especialmente no perscrutar dos fenômenos que permeiam o planeta terra e, por expansão, todo o sistema cosmológico. Ocorre que esses “avanços” não livram o mundo, o de hoje e o de amanhã, das ameaças de destruição total.

Karl R. Popper (1902-1994) físico, matemático, provavelmente o maior  filósofo da ciência do século XX, defensor tenaz e agudo  da sociedade aberta, ou seja, do Estado democrático, apoia essa linha de pensamento. Popper,  dizia que o avanço da ciência se dá pela criatividade de imaginar hipóteses novas que possam explicar e resolver os problemas gerados pelas expectativas humanas preexistentes. Isto é, o fim último da ciência é o homem e as suas agruras terrenas. O fato de, para cada problema, existir  sempre infinidade de soluções logicamente possíveis constitui um dos eventos decisivos de toda a ciência, e é uma das coisas que fazem da ciência uma aventura  tão excitante. Na ciência, enfatiza Popper,  devemos usar  a imaginação e ideias ousadas, ainda que uma e outras devam ser sempre temperadas pela crítica e pelos controles mais severos.

Atualmente a ciência, inclui-se aí somente aquelas de cunho de investigação empírica, apesar do avanço a passos largos, não atende a demanda de problemas advindos da existência humana, pois nós, simples mortais, continuamos sem respostas para muitas necessidades básicas, cruciais para a sobrevivência humana.

A realidade dos problemas se torna mais assustadora quando se faz uma análise das tendências para os próximos anos. Não existe o menor sinal de que os problemas serão menores. Então, onde estão os mecanismos científicos avançados, no campo: da economia; da política; do direito; do social; da ciência médica, etc., que não encontram solução para os problemas humanos?

Ademais, todo esse fantástico avanço tecnológico, somado aos fabulosos progressos da ciência, não tem sido suficiente para debelar causas primárias, como a fome, que afetam e aumentam a cada dia,  a má sorte de bilhões de seres humanos, notadamente das  nações do terceiro mundo.

Uma saída, dentre outras, é ir além da “ciência normal” que vive de solucionar problemas que emergem do  “paradigma” com resultados alcançados pela ciência do passado.  Substituir esses protótipos, como queria Thomas Kuhn (1922-1996) por novos modelos capazes de guiar a pesquisa no futuro, em torno dos problemas humanos que o velho paradigma não foi capaz de resolver completamente. Quem é do ramo sabe do que falo!

*Pesquisador  Bibliográfico em Humanidades.
E-mail: assisprof@yahoo.com.br

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