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Fumaça sem fronteiras

Foster Brown

Uma mesa-redonda na 66a reunião da Sociedade Brasileira para o Progesso da Ciên-cia (SBPC) em Rio Branco, no dia 24 de julho, intitulada “Impacto Trinacional da Queima de Biomassa e da Fumaça na Amazônia Sul-Ocidental” abordou o assunto de onde veio a fumaça resultante das queimadas e incêndios florestais nos anos 2005 e 2010, com representantes do Brasil, Bolívia e Peru. Dos membros da mesa apenas Mariano Castro, o vice-ministro do Ministério Peruano de Meio Ambiente, não pôde participar. Dr. Saulo Freitas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em São José dos Campos, São Paulo, mostrou os resultados de modelos e medidas de transporte de fumaça.  Durante a época de queimadas as concentrações de material particulado fino no ar, ou seja, fumaça, excederam múltiplas vezes o limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), com valores maiores do que se encontram em cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro.  Durante 2005, a concentração média de fumaça nas Capitais Rio Branco/Acre, Cobija/Pando-Bolívia e Puerto Maldonado/ Madre de Dios-Peru ficou acima do limite da OMS de três dias por ano durante os meses de agosto e setembro. A circulação atmosférica transportou fumaça por alguns milhares de quilômetros. A circulação típica no Acre permite que o vento transporte fumaça de norte para sul e sudeste. Somente durante uma friagem esta circulação inverte, trazendo ar e fumaça da Bolívia ao Acre. Consequentemente, Rio Branco recebe fumaça principalmente do Acre e do Amazonas, enquanto Cobija e Puerto Maldonado recebem muita fumaça do Brasil.

Dr.  José Martinez, professor da Universidad Autonoma Gabriel René Moreno de Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, concentrou  sua palestra sobre o que fazer para reduzir as queimadas que geram a fumaça. Numa palestra rica de recomendações, Dr. Martinez iniciou sua lista com  “Abandonar a cultura agrária do século 18” e adicionou  “Manter sociodiversidade para garantir biodiversidade” e “respeitar os usos e a cobertura da terra, segundo sua capacidade”. Em termos de colaboração trinacional, Martinez recomendou aproveitar as experiências fronteiriças da França e Espanha em termos de legislação transfronteiriça comum, que devem ser institucionalizadas pelo Parlamento Amazônico, envolvendo os governos nacionais do Peru, Brasil e Bolívia.

Durante o debate, Dr. Freitas notou que o Acre exporta mais fumaça para Madre de Dios e Pando do que recebe deles. Com concentrações de fumaça várias vezes superior ao limite da OMS de 25 microgramas por metro cúbico nas secas de 2005 e 2010, resta determinar os prejuízos  transfronteiriços para a saúde humana, para os ecossistemas florestais e para a agricultura.  Esta mesa-redonda deixou claro que a fumaça e seus impactos não respeitam fronteiras.

* I. Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Experimento de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Risco de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA). Trabalha com os doutores Martinez e Freitas sobre fontes de fumaça.

A Gazeta do Acre: