O indígena Manoel Kaxinawá, de 53 anos, professor bilíngue na aldeia “Colonia 27”, localizada nas imediações da BR-364 entre os municípios de Tarauacá e Cruzeiro do Sul, poderá ser a novidade nas eleições deste ano no Acre. Ele quer ser deputado para defender políticas públicas que garantam a manutenção de uma “vida natural” na floresta. Candidatou-se pelo Partido Pátria Livre (PPL), da coligação Frente Popular liderada pelo PT e, se eleito, será o primeiro indígena a ocupar uma vaga no legislativo estadual.
Nascido na Terra Indígena Igarapé do Caucho, aldeia Tamandaré, em Tarauacá, Manoel estudou e se tornou professor bilíngue de sua comunidade até 1991, quando transferiu a função ao sobrinho Assis – também professor e cacique – para vir coordenar a União das Nações Indígenas em Rio Branco. Nos últimos dois anos, atuou como assessor do prefeito em seu município.
Quando jovem, Manoel cortou seringa na terra indígena produzindo borracha para seu próprio grupo. Ele recorda com saudade desse tempo na floresta: “A gente vivia sem medo, não precisava comprar alimentos, era mais fácil viver”! Sua aldeia atual, a Colônia 27, onde vivem 180 indivíduos, compreende uma área de 305 hectares rodeada de fazendas, com apenas 30% de mata virgem. Não tem igarapé, nem rio, nem lago. Portanto, também não tem caça nem peixe.
Até 2001 a área deles era ainda menor, apenas um terço da atual (105 hectares), mas foi ampliada com a ajuda do então governador (hoje senador) Jorge Viana, que se tornou guru de Manoel e “grande líder” para muitas crianças que nasceram de lá para cá. No Estado todo, existem 36 áreas indígenas somando cerca de 2, 5 milhões de hectares onde vivem 18 mil indígenas de 15 povos diferentes.
Ao falar dos mudanças que ocorreram no modo de vida desses grupos, Manoel não se entusiasma, porque entende que os indígenas de um modo geral precisam cuidar melhor de suas tradições para ter de volta à vida natural que desfrutavam no passado, antes do contato com os não índios.
Sonho político
Ao se candidatar, Manoel pensa na vida natural que seu povo pode resgatar; e num tom de parlamentar afirma: “Queremos cuidar da nossa vida como é de direito, da forma como está no Estatuto do Índio. A Constituição do Brasil também garante isso no artigo 215. Já o artigo 216, diz que o Estado Brasileiro deve preservar o conhecimento material e também o imaterial”.
O candidato do PPL defende a criação de políticas públicas para as comunidades indígenas e diz que vai cobrar do governo a formação técnica para os jovens de todas as aldeias. Quer vê-los como engenheiros agrônomos, engenheiros de pesca, advogados para defender os direitos indígenas, contadores, médicos, dentistas e administradores. “Precisamos de todas as categorias para garantir a sustentabilidade cultural e espiritual”, afirma.
O candidato cita um exemplo da troca vantajosa que poderá ser estabelecida entre a cultura indígena e a cultura dos não indígenas: “Nós temos praticas medicinais que permitem inibir a fertilidade da mulher usando remédios da floresta. Não é necessário cortar as trompas. Também curamos outros males. Minha mãe vai fazer cem anos e ainda coloca linha na agulha sem precisar de óculos”, diz. Mas toda essa medicina está sendo queimada na floresta por pessoas que a desconhecem.
O professor indígena esclarece que seu povo não quer profissionais de nível superior com a mesma formação dos brancos, porque eles precisam realizar operações também com a medicina da floresta, que os não indígenas não conseguem. Ele acrescenta que a formação técnica ajudará os jovens índios a não pensar que “emprego é só ganhar o salário mínimo”.
Perguntado se, como deputado estadual, trocaria sua aldeia pela capital Rio Branco, como nova moradia, Manoel Kaxinawá respondeu com segurança:
“Posso ter uma casa aqui, mas não para morar. Aqui seria será o meu local de trabalho. A minha cidade é lá, na aldeia”. (Foto: Assessoria)