Não me lembro de ter decidido, nas últimas três ou quatro eleições, um voto tão explicito e antecipado para deputado federal. Embora eu não seja associado a nenhum partido, por minha condição de jornalista, eu sempre votei ideologicamente no PT, por ter acompanhado de perto sua criação no Estado e reconhecer maior identidade de seus dirigentes com os problemas e soluções acreanas. Conheci muito bem o Acre de antes do PT, e posso afirmar que o atual é melhor para o conjunto da sociedade.
Em plena ditadura militar na década de 70, eu, o Silvio Martinello, o Terri Aquino, a Célia Pedrina, o Toinho Alves, o Arquilau de Castro Melo, o Abrahim Farhat, o Alberto Furtado, o Binho Marques e tantos outros, jornalistas, estudantes e intelectuais, lideres comunitários e sindicalistas, bem como alguns militantes de esquerda – enfrentávamos dificuldades num regime que prendia, torturava e matava pessoas do bem. Entretanto, sabíamos compor (estrategicamente) com tipos que estavam do outro lado manifestando algum tipo de discordância diante da falta de democracia e respeito aos direitos civis.
No jornal Varadouro, por exemplo, que circulou entre 1977 e 1981, apoiamos a nomeação do ex-seringalista Joaquim Macedo, do partido (Arena) de sustentação ao regime militar, para governar o Acre, porque as outras indicações eram bem piores: o Coronel Natalino Brito, embora acreano, tinha formação militar; o outro era um deputado federal identificado com os grupos sulistas que compravam os seringais para desmatar a floresta, queimar e fazer pastos para o boi.
Humanista, homem simples e justo, Macedo manteve a linha politica do seu antecessor, o professor Geraldo Mesquita (também da Arena) e se opôs, corajosamente, à bovinização do Estado. Mesquita e Macedo governaram a favor do extrativismo e, de alguma forma, argumentaram junto aos poderosos milicos de Brasília que o povo do Acre não ia abrir mão de sua floresta, de sua tradição e de sua história revolucionária.
Em 1982, quando a sociedade brasileira conquistou o direito de eleger governadores, Nabor Júnior, do PMDB, contou com a nossa boa vontade e esperança. Foi um governador fraco, temeroso, mas se manteve aberto, democrata, honesto, e não traiu sua raça. Depois veio o jovem engenheiro Flaviano Melo, do PMDB, filho do histórico deputado estadual Raimundo Melo, que novamente contou com a boa vontade e expectativa popular. Mas, no final do mandato cedeu ao canto de sereia dos invasores (lembrem a conta Flavio Nogueira). O que se seguiu foi um desastre cívico: a sucessão de governadores identificados com os pecuaristas que levou a uma desordem nas instituições públicas e à presença do crime organizado, que só teve fim com a eleição de Jorge Viana (PT) em 1998.
De lá para cá a sociedade acreana respirou aliviada. O Acre atualizou suas finanças, passou a pagar em dia o funcionalismo e incluiu os municípios do interior no planejamento. A educação chegou até os seringais; a saúde, para o que era antes, avançou muito, o possível; as estradas melhoraram, o grande sonho da BR-364 até Cruzeiro do Sul se realizou, com pontes enormes e caras sobre os grandes rios que cortam o trecho. E na capital, aconteceu a modernidade reconhecida por quem a visita. A mudança permitiu também o surgimento de novos quadros políticos.
De Tarauacá, um pouco atrás, veio Dona Iolanda, moradora de seringal que quando menina queimou um dos seios com lamparina, e ao procurar tratamento na capital (na época) um farmacêutico aplicou injeção que lhe atrofiou uma das pernas. Quando adulta, engravidou e precisou fazer parto de risco na Maternidade Bárbara Heliodora.
Essa história, felizmente, acabou bem: o menino, chamado Angelim, hoje beirando os 60 anos, estudou no colégio dos padres e se formou em Economia na Universidade Federal do Acre. Em 2004, se elegeu prefeito de Rio Branco, pelo PT, reelegendo-se em 2008, período em que, em parceria com o governador Binho Marques (PT), revolucionou o ensino básico no município. Binho gravou um vídeo chamando-o de “deputado das crianças”.
Construiu calçadas, melhorou o transporte coletivo e instituiu a administração participativa criando os conselhos comunitários nos bairros. Organizou feiras-livres nos bairros e notabilizou-se, desde o primeiro dia na Prefeitura, com a limpeza da cidade.
Nas eleições municipais de 2007, eu estava com Angelim e o desembargador Arquilau lanchando no barzinho do Teatro Hélio, no meio da tarde, quando passou um moleque engraxate de 10 a 12 anos que na maior intimidade, chegou perto, bateu no ombro do prefeito e indagou:
-E aí, cara! Vai enfrentar outra campanha ano que vem?
Angelim riu, disfarçou, deu um abraço no moleque e o deixou seguir. Para nós, confessou:
– É difícil responder não. Tenho compromisso com o partido, com os amigos e, sobretudo, com a comunidade que acredita no meu trabalho e quer vê-lo prosseguir. O trabalho prosseguiu, melhor do que antes, e Angelim entregou a Prefeitura ao seu sucessor Marcus Alexandre (PT), enxuta e com dinheiro em caixa.
Ou seja: tenho mil razões para votar nesse sujeito humilde e competente para deputado federal.
*ELSON MARTINS