Ao tomar conhecimento da instalação do estacionamento rotativo, conhecido por ‘Zona Azul’, o presidente da Associação dos Guardadores e Lavadores de Carros de Rio Branco (AGLC), Maurício George Rosa Batista, lembra da sensação que teve. A medida está prevista para começar a operar em Rio Branco no próximo dia 15. E, para Maurício Batista, esta data significaria o fim do seu ganha-pão.
“Foi como se um médico me desse a sentença de morte, através do diagnóstico de uma doença terminal. Afinal de contas, são 16 anos nesse trabalho, debaixo de sol e chuva. É daqui que tiro o sustento da minha casa e da minha família”, destacou Maurício.
Nesse período de muita dificuldade, o flanelinha ressalta o carinho e o cuidado que tem com os clientes. “Procuro cultivar boas relações com meus clientes. Dar um bom dia, uma boa tarde. E, em troca, recebo o respeito deles. Afinal, trabalhamos, mas dependemos da boa-fé deles”, explicou.
Durante toda a entrevista, clientes que passavam pelo local faziam questão de cumprimentar o flanelinha. Segundo Maurício, já houve período de ele levar para casa, num dia só, cerca de R$ 350,00. Mas, nos primeiros meses, chegou a receber até R$ 2,00 em um dia inteiro nas ruas.
“Não tinha clientes no início. Foi uma fase difícil. Mas, hoje, por exemplo, alguns clientes fazem questão de me dar um presente na época do Natal. Ou oferecem lanches durante o dia”, afirma ele, emocionado.
Mas, apesar das boas surpresas, o trabalho não é fácil, afirma Maurício. “Aqui não temos uma cobertura para nos proteger do sol ou da chuva. Não temos banheiro. É complicado trabalhar. Só que precisamos e passamos por cima das dificuldades”, relatou.
Outro ponto negativo de se trabalhar nas ruas é a discriminação, destaca Maurício. “Já houve casos de pessoas que estacionam com o carro já arranhado. E, após perceberem o arranhão, quererem culpar o flanelinha. Isso não existe”, falou.
Zona Azul no Centro de Rio Branco
A Zona Azul será instalada em duas etapas, sendo que a primeira contemplará cinco ruas da região mais central de Rio Branco (Epaminondas Jácome, Arlindo Porto Leal, Avenida Brasil, Dr. Franco Ribeiro e Rui Barbosa), com operação a iniciar no dia 15 de dezembro. Já a segunda contempla as demais ruas do Centro e os bairros Bosque e Estação Experimental. Esta fase ocorrerá a partir do dia 2 de janeiro.
A Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito de Rio Branco (Rbtrans) prevê que o estacionamento rotativo estimule o comércio local e seja também uma alternativa vantajosa pra quem necessita estacionar seu veículo por um curto espaço de tempo.
A Zona Azul em Rio Branco funcionará por meio de equipamentos do tipo parquímetros, emissores de comprovantes de tempo de utilização de vagas (tíquetes), no período das 8h às 18h de segunda a sexta-feira e de 8h às 12h aos sábados, com um total estimado de 1.702 vagas quando estiver consolidado.
Nos horários especiais de funcionamento do comércio, em razão de datas comemorativas, eventos e outros, a Zona Azul poderá estender o horário de suas atividades.
De acordo com a Rbtrans, mais de 800 vagas devem ser disponibilizadas na primeira fase do projeto, que será focado em parte do Centro da Capital.
Sistema permite usar várias vezes a mesma vaga de estacionamento
O tempo mínimo de ocupação de cada vaga será de 30 minutos e o máximo de 120 minutos. O preço para o motociclista fica entre R$ 0,50 e R$ 1,00 e o valor para os que possuem automóveis entre R$ 1,00 e R$ 2,00. A exceção fica por conta das caçambas coletoras de entulho, autorizadas a permanecerem no local por 24h, porém com tarifa a ser cobrada pelo preço de R$ 10,00.
Para pagar as tarifas, os condutores poderão usar moedas, ou através de cartão recarregável.
A taxa de utilização poderá ser paga com moedas e cartão recarregável diretamente nos parquímetros ou nos pontos de venda. Os usuários ainda poderão realizar o pagamento partir do autoatendimento telefônico e um aplicativo gratuito no telefone móvel Smartphone. A Zona Azul também contará com vagas de estacionamento para idosos, mediante pagamento e para pessoas com deficiência física, gratuitamente.
O Sistema de Estacionamento Rotativo pago contribui, principalmente, na democratização do uso dos espaços públicos, permitindo que a mesma vaga seja utilizada por várias pessoas ao longo do dia. A rotatividade do uso das vagas contribui também para a qualidade de vida, haja vista que, os condutores circulam menos para encontrar uma vaga, reduzindo assim, o nível de poluição ambiental.
Cursos profissionalizante serão oferecidos aos flanelinhas
Para evitar que os flanelinhas fiquem desempregados devido à Zona Azul, 60 deles estão cadastrados para a realização de cursos de capacitação para o mercado de trabalho formal. Na primeira etapa, 38 deles estão previamente cadastrados. A maioria deve ser absorvida pela Sertell, empresa responsável pelo estacionamento rotativo, para atuar como vendedores do bilhete Zona Azul.
De acordo com a Prefeitura de Rio Branco, a ideia é oferecer cursos técnicos aos flanelinhas. Além disso, foi criado um projeto de lei que institui o Plano de Apoio à Requalificação Profissional dos Flanelinhas. Com isso, o profissional tem que estudar. Receberá uma bolsa-auxílio no valor de R$ 600 por mês, como incentivo.
O projeto foi encaminhado à Câmara de Verea-dores e precisa de aprovação para ser sancionado pelo prefeito Marcus Alexandre. Os cursos serão oferecidos pelo sistema ‘S’ e também pela Federação das Indústrias do Acre (Fieac). Os cursos foram escolhidos pelos próprios flanelinhas. A maioria deles optou por qualificação em construção civil e também técnica em elétrica.
Para mapear essas áreas, a direção de Trânsito da Rbtrans fez um levantamento. O primeiro em 2010 e atualizado este ano. Os dados apontam ao menos 122 flanelinhas em Rio Branco.
O responsável pelo levantamento, Nélio Anastácio, explica que, passado esse mapeamento geral, agora a direção foca nos detalhes e no estudo individual de cada caso. “Estamos cuidando do cadastro de campo para verificar a condição de cada um. Todo o nosso trabalho está sendo acompanhado pela associação deles, para que não haja injustiças ou falhas”, garante.
Analfabetismo de uma pequena parte da categoria preocupa o presidente
Maurício agradece a preocupação da prefeitura com os flanelinhas. “A lei da Zona Azul está aí. Foi aprovada e vamos ter que nos adequar a isso. O que a prefeitura está fazendo é convidar todos os flanelinhas para fazer a qualificação. E isso, para a gente, é bom, porque não vamos ficar sem nosso pão. Mas, existem companheiros que foram para a rua com apenas oito anos de idade e que não sabem fazer outra coisa além de guardar carro. Vamos dizer que é como um amparo, para que a gente não fique à mercê da sorte”, destaca.
Porém, algo preocupa o presidente da associação. É o fato de ter flanelinhas ainda analfabetos. Ele diz que dos 122, menos de 10% está nesta condição. Porém, garante que algo deve ser feito para olhar também por aqueles que têm pouca ou quase nenhuma escolaridade.
“Vamos sentar e ver o que pode ser feito. Isso foi algo que a gente não discutiu nas conversas anteriores, mas que me preocupa muito. Porque se vamos ter um curso. Vai ter a parte teórica e como fazer isso sem instrução nenhuma. É uma porcentagem pequena, mas que existe”, ressalta.
(Fotos: Odair Leal/ A GAZETA)