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Construindo o futuro da juventude acreana através da música

Escola Acreana de Música capacita, aperfeiçoa e incentiva os alunos a escolherem o instrumento musical que melhor representa a sua identidade

Ouvidos e olhos atentos. Uma sala cheia de alunos. O professor faz alguns sons em um tambor à sua frente. Ao redor, vários instrumentos e a única regra é tocar o que mais deseja. A Escola Acreana de Música (Emac), criada a pedido da própria comunidade, funciona como inspiração para dezenas de pessoas.

Localizada no bairro Tucumã, em Rio Branco, a escola atende alunos de todas as sete regionais de Rio Branco. Para entrar, apenas por meio de sorteio, que, inclusive, é gravado para dar mais transparência. O método impede que haja beneficiados ou apadrinhados políticos.

Todos podem se inscrever, independente de classe social ou crença. Há apenas uma exigência. Se for criança ou adolescente, deve estar na escola educacional. Ter boas notas e ser um bom aluno. As atividades não podem prejudicar o compromisso na sala de aula.

Para Dircinei Souza, diretor da Escola Acreana de Música, o local pode ser classificado como uma extensão e difusão da educação musical. “Nossa missão é promover a inclusão social através da cadeia produtiva da música no Estado, incentivando a pesquisa, o registro, qualificando e fazendo a produção musical com a participação de crianças, adolescentes, jovens e adultos. Tudo isso contribui para uma melhor convivência humana”.

Em 2011/ 2012, 3.500 pessoas chegaram a se inscrever para estudar no local. Desses, foram matriculados 482 alunos. Já em 2012/ 2013, esse número caiu para 640 inscritos e 180 matriculados. Em 2013, 272 inscritos e 91 matrículas. Neste ano, o número fechou em 73 alunos matriculados.

Dircinei explica que essa redução aconteceu devido a uma mudança na metodologia da escola. O local passou a priorizar a educação de jovens. Além disso, no começo, o instrumento mais procurado era o violão. Hoje, buscou-se diversificar mais. Ou seja, diminuíram a quantidade para aumentar a qualidade do ensino.

A idade mínima exigida para começar a estudar na Escola Acreana de Música é 7 anos. O aluno que nunca teve contato com qualquer instrumento é alfabetizado com a flauta doce, pois é ela que lhes dá os primeiros passos sobre respiração e ritmo.

A equipe docente é composta por 16 professores, com um ensino dividido em fundamental (alunos de 7 a 9 anos), básico (10 a 13 anos) e formação livre (14 anos para frente). Além disso, existem também as oficinas de canto, percussão, cordas coletivas e uma variedade de outros instrumentos musicais.

As aulas vão de segunda à quinta-feira, nos horários das 8h às 11h30 e das 14h às 17h30. São duas turmas, uma que faz aulas às segundas e quartas e a outra nas terças e quintas. Cada turma tem em torno de 8 horas de aula por semana. Ou seja, este é o tempo em que o aluno se dedica à sua educação musical. Na sexta-feira, o espaço fica livre para projetos como o ‘Sexta Tem’, que já serviu de palco para cantores de Israel e dos Estados Unidos. No entanto, a escola busca valorizar os artistas locais. De 2012 a 2014, já foram apresentados mais de 90 shows.

Dircinei recorda o tempo em que tudo era mais difícil em Rio Branco. “Antes, quem desejasse se formar em música tinha que sair do Estado, como eu fiz na época. Agora é diferente. Se a pessoa começar desde criança aqui com a gente, ela vai sair capacitada, qualificada e aperfeiçoada. Hoje, temos um curso superior de Música na Universidade Federal do Acre. Quando o nosso aluno chega lá, ele já leva uma bagagem riquíssima, diferente daquele que nunca estudou o assunto”, destacou.

Apesar de todos os avanços e experiências, o diretor acredita que ainda há o que ser aprimorado. “A Escola Acreana de Música é um potencial. Nosso sonho é estender ainda mais as nossas conquistas. Caso a escola receba mais estrutura, algumas coisinhas que nós já pedimos e estão sendo encaminhadas, a meta seria abrir mais 100 vagas para 2015”, afirmou.

Ao todo, sua capacidade seria para receber até 400 alunos. Mas a escola ainda tem um pouco para crescer até chegar até este patamar, inclusive, aumentando seu quadro de professores.

Diretor da Escola Acrena de Música, Dircinei Souza

 “Meu sonho é um dia tocar a música mais difícil do mundo”

Ana Luísa, 11, estuda para ser uma famosa violinista

A música é uma das maiores belezas da vida. E quem se envolve e se entrega de verdade a ela ganha mais do que o ritmo da alegria. A música eleva a auto-estima, dá confiança, paciência,  sensibilidade e melhora o raciocínio. Todos são elementos indispensáveis para alguém ter uma trajetória bem sucedida, seja como músico ou em qualquer outra profissão. Estas também são as características mais notórias nos alunos da Escola Acreana de Música.

Ao conversar com eles, observa-se que, no início, eles são tímidos. Um traço de personalidade bem comum no final da infância e na adolescência. Porém, basta conversar um pouquinho mais que os acanhamentos vão desaparecendo. Logo surge, no próprio jeito deles, um perfil artístico. Mostram-se muitos seguros ao falar das suas habilidades musicais, das suas qualidades e até do quanto a Emac lhes ajudou a moldar estes talentos.

Uma destas artistas mirins é a pequena violinista Ana Luísa de Araújo Lima. Ela tem apenas 11 anos. Mas quando se dispõe a tocar seu violino, a pose e a aptidão até para segurar o instrumento lembram uma profissional que se vê em qualquer concerto musical. Ana Luísa chegou a Emac com 8 anos. E aproveitou cada aula dos 3 anos estudando lá.

“Quando eu comecei não sabia muita coisa. Eu era ruim. Mas aprendi e estou melhorando bastante. Agora me sinto muito boa tocando o meu violino”, conta a estudante, bem convicta.

Ana Luísa diz que se apaixonou pelo violino quando chegou à escola e viu uma apresentação pela primeira vez com ele. Amor ao primeiro som. E é justamente com este instrumento clássico que ela pretende realizar um grande sonho: “quero fazer uma bela apresentação solo, tocando a música mais difícil do mundo”. Por enquanto, Ana nunca fez nenhuma performance fora da escola. No entanto, isso não inibe em nada o brilho do seu sonho.

Dois anos de aulas e o desabrochar de um talento para a vida inteira

Alunas da Emac nutrem fascínio pelo instrumento musical predileto: o teclado

Quanto tempo é preciso para aprender a tocar? Isso depende. A música desperta os talentos ocultos das pessoas. E estes dons precisam ser lapidados. Nos casos de Nicoly Quintela, 13 anos, Thais Marques, 14 anos, e Beatriz Rodrigues, 13 anos, tocar teclado ‘bem’ (como elas definem) foi um aprendizado de 2 anos. Até três. Esse é o tempo em que elas estão na Emac. Começaram a não ‘apanhar’ tanto do teclado com 1 ano, mas só melhoraram com a prática e muita dedicação.

A primeira que fala sobre a sua experiência na escola é Nicoly. Comunicativa, ela fala que escolheu o teclado e o piano pela melodia deles. “A harmonia do piano é um dos sons mais bonitos que já ouvi”. E, por falar em ouvido, ela, suas colegas e seus professores destacam que Nicoly tem um bom ouvido para a música. “Dizem que eu tenho facilidade para ouvir. E admito que isso é um pouco verdade. E me ajuda bastante na hora de tocar”, completou uma Nicoly mais confiante.

Já Thais Marques se diz também uma apaixonada pelo instrumento (apesar de também tocar violão) e ressalta o quanto a escola lhe ajudou a crescer musicalmente. “Aprendi tudo aqui e hoje me divirto muito com as aulas, desde as teóricas até as mais práticas”, comenta ela, sendo completada pela amiga Beatriz Rodrigues, reforçando que gosta das aulas no papel, mas que se tiver que escolher uma favorito, sem dúvida ficaria com as aulas práticas.

Sobre a afinidade com o teclado, as três jovens aprendizes relataram o papel crucial que a Emac teve de deixá-las se aproximar naturalmente do instrumento. Elas viram, se encantaram e hoje sonham com as teclas. Em outras palavras, não são os pais e muito menos a escola que decide o que cada estudante vai tocar. Isso é um dever deles e que só o amor à música pode revelar.

De centro cultural até uma referência no ensino musical
A Escola Acreana de Música nem sempre foi assim. Na verdade, antes a proposta do local era bem diferente. De acordo com Dircinei Souza, a arte se apoderou do prédio da Emac em 1994. No princípio, o local virou o Centro Cultural do Tucumã. Um espaço para valorizar a arte em geral, como artesanato, corte e costura, pintura e desenho, teatro, artes plásticas, etc.

A ideia funcionou bem e logo fez parte de uma política pública de criar cantos de difusão da Cultura em cada bairro de Rio Branco. Em 1998, através de uma parceria com a Ufac, vizinha do centro, as atividades chegaram até o Colégio de Aplicação, incentivando aos alunos de lá a terem aulas de violão, teatro. Sempre com turmas rotativas. Seis meses era o máximo de duração. Em 2000, o projeto na Ufac acabou. E o centro continuou funcionando, até se reinventar.

Esse novo modelo veio nas vésperas de 2010. Dirciney Souza conta que a comunidade se reuniu e manifestou o desejo de tornar o centro cultural em um lugar onde se pudesse aprender música. Daí, começou a se planejar uma verdadeira escola de música para o local. Em 2011, o governo reformou o prédio e arquitetou ele inteiro para esta finalidade. No mesmo ano, fez uma parceria com a ONG Musicalizar. Com 20 professores, a entidade passou a ensinar música lá.

Mas era preciso fazer este ensino crescer. Por isso, em setembro de 2012, por meio de um decreto de Criação publicado no Diário Oficial do Estado, a Emac passou a ter uma gestão própria, a de Dircinei, contando com tudo o que uma escola que se propõe a lecionar música tem direito. Passou a ter um Plano de Desenvolvimento Institucional, Regimento Interno, um Plano Político Pedagógico, objetivos claros e até cadastro no Inep e Corines (o que garante certificação ao aluno).

Além disso, a Emac adquiriu autonomia para dialogar com a sociedade. E assim firmar parcerias com associações relacionadas à música, com projetos sociais, bandas de fanfarras,  igrejas, e muito mais. E também criou projetos como oficinas musicais e até o Sexta Tem (que já garantiu aos alunos da Emac apresentações e troca de experiências com artistas de Seatle, do Peru, de tribos indígenas, de Israel, grupos de Hip Hop, corais religiosos e até dança do ventre).

Para o aprendizado da música, a Emac tem o ambiente perfeito. Desde a sua planta arquitetônica, tudo na escola gira em torno da educação musical. Tem auditório para apresentações e aulas práticas, salas acústicas, um espaço ao ar livre, um amplo pátio de recreação e uma biblioteca com mais de 5 mil títulos gerais (incluindo alguns do gênero musical. Em 2015, mais 2 mil livros devem chegar, incluindo 600 só de música). A biblioteca, aliás, é uma herança de quando a Emac era um centro cultural. Portanto, é aberta para ser utilizada pela sociedade em geral.

(Fotos: Brenna Amâncio/ A GAZETA)

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