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Desenvolvendo uma cultura de gestão de risco e resiliência frente a desastres naturais na Amazônia Sul-Ocidental

O título deste artigo vem da Organização das Nações Unidas  (ONU) e sua campanha para aumentar a resiliência das nações e das comunidades frente a desastres.  Em 2005, a ONU declarou a década do Marco de Ação de Hyogo (MAH) que termina neste ano de 2015.  Dessa campanha, o que podemos aprender de relevante para reduzir riscos de desastres na Amazônia Sul-Ocidental?

Primeiro, nesta última década tivemos desastres aqui?  Um desastre, usando a definição da ONU, significa uma perturbação séria do funcionamento de uma comunidade ou sociedade que vai além da sua capacidade de responder com seus próprios recursos.  Neste artigo, vamos nos concentrar somente em desastres naturais. Aqueles desastres ligados mais diretamente com atividades humanas serão discutidos em artigos posteriores.

Um indicador de ocorrência de desastres naturais seria as solicitações por governos locais ou regionais de declarações de situação de emergência.  Usando esta definição operacional, tivemos vários desastres naturais durante a década de 2005 – 2015.  Em 2005, uma seca prolongada propiciou incêndios florestais em centenas de milhares de hectares de florestas no Acre. Mais de cem mil hectares de florestas se incendiaram em Pando, Bolívia e dezenas de milhares de hectares queimaram em Madre de Dios, Peru. Em 2010, tivemos incêndios florestais espalhados no Acre, alcançando dezenas de milhares de hectares de florestas. Inundações foram muitas com declarações de situação de emergência em Rio Branco em 2006, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, ou seja, nos últimos seis anos consecutivos.

A inundação do Rio Acre em 2012 atingiu três paises: Iñapari, na Região Madre de Dios, Peru, que ficou 80% embaixo de água na fronteira com Assis Brasil;  Cobija, no Departamento de Pando, Bolívia, teve 1.500 famílias afetadas; e uma série de cidades no Acre – Assis Brasil, Brasileia, Epitaciolândia, Xapuri, Rio Branco e Porto Acre sofreram tanto que a si-tuação de emergência se transformou num estado de calamidade pública a nível estadual.

As ferramentas para medir os impactos e custos são imperfeitas; no momento somente temos no Acre as Avaliações de Danos (AVADANS) até 2012 e os Formulários de Identificação de Desastre (FIDES) que são feitos durante os desastres. Durante o período de 2005-2014 os AVADANS e FIDES totalizaram mais de 600 milhões de reais.  Se fossem feitas avaliações pós-desastres, o total provavelmente teria sido maior.

O ano de 2014 trouxe uma experiência rara – transbordamento do Rio Madre de Dios que causou a pior inundação em 50 anos em Puerto Maldonado, Madre de Dios no Peru, com danos equivalentes a mais de 100 milhões de reais. Estas águas combinaram com as oriundas de chuvas da parte central da Bolívia e produziram a pior inundação histórica do Rio Madeira. Esta inundação cortou efetivamente o transporte rodoviário na BR-364, isolando a Amazônia Sul-Ocidental do sul do Brasil, fonte principal de transporte de combustíveis e alimentos para o Acre.  A Fecomercio do Acre estimou que, com esta interrupção do transporte, deixaram de circular mais de 800 milhões de reais na economia acreana em fevereiro e março de 2014.

O município de Tarauacá no Acre teve a triste oportunidade de pedir duas situações de emergência no mesmo ano de 2014, não só em abril, mas também em novembro, com a maior inundação da sua história.

Resumindo estes dados, podemos afirmar que, sim, durante a década da redução de risco de desastres, a Amazônia Sul-Ocidental foi impactada com múltiplos desastres naturais, com custos econômicos fortes, além dos custos humanos que são mais difíceis de quantificar.

O que podemos fazer para reduzir os riscos de desastres no futuro?  A ONU estabeleceu uma lista de cinco prioridades de ação:

1. Fazer com que a redução dos riscos de desastres seja uma prioridade.
2. Conhecer o risco e tomar medidas
3. Desenvolver uma maior compreensão e conscientização
4. Reduzir os fatores fundamentais do risco
5. Ser preparado e pronto para atuar

(Mais detalhes sobre esta lista poderiam ser encontrados no link http: //www.mi.gov.br/ cidadesresilientes/ pdf/ mah_ptb_ brochura.pdf.)

Abordar estas prioridades exige o envolvimento de todos os setores de uma sociedade; a Defesa Civil no Século 21 tem que ser um programa de sociedades inteiras. Esta lista serve não só no nível de município e estado, mas também para famílias e pequenas comunidades.

Para estimular governos locais a avançar com estas prioridades, Brasil, Bolívia e Peru adotaram o programa da ONU de cidades resilientes com dez passos para cumprir.  No momento, no Acre somente Rio Branco e Sena Madureira estão inscritos no programa, mas as inscrições estão abertas para outras cidades na região.

Temos desafios crescentes para reduzir os riscos de desastres.  O aumento da população combinado com a variabilidade natural do clima amplificada por influência humana propiciarão maiores desastres naturais no futuro. Mas a criatividade humana, junto com a vontade de mudar, pode fazer com que os impactos de eventos extremos naturais, como secas e inundações, se transformem em inconveniências no lugar de desastres.

A questão maior é se preferimos nos preparar para eventos extremos, desenvolvendo uma cultura de gestão de risco e resiliência, ou pagar o preço crescente de desastres?

*I. Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Experimento de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consorcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA).

Rachel Helena Mesquita de Farias, Assembleia Legislativa do Estado do Acre e membro do Grupo de Gestão de Risco de Desastres do Parque Zoobotânico, UFAC e da CEGdRA.

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