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A esperança de cura para Hepatite C chega ao Acre

1No Acre, até 15 pessoas morrem todo mês em consequência de alguma complicação hepática, muitas delas causadas pela Hepatite C, aponta a Associação dos Portadores de Hepatites do Estado do Acre (Aphac). A aprovação dada pela Anvisa ao medicamento Daclastavir é a esperança de cura a muitos pacientes. Ele é o primeiro de uma série de três medicamentos que prometem negativar a doença.

A APHAC estima que 80 mil acreanos estejam desenvolvendo uma das quatro hepatites (A, B, C e Delta) neste momento. E o pior que muitos deles não sabem que possuem o vírus. O medicamento poderá ser ministrado ao paciente independente do estágio da doença.

Entre outras vantagens, em relação aos atuais medicamentos, incluindo o temido interferon e seus pesados efeitos colaterais, o Daclastavir associado com Sofosbuvir e Simeprevir promete mais de 90% de cura em até 12 semanas e por via oral. Muito diferente das 48 semanas de tratamento com regimes à base de interferon e ribavirina ou, em algumas situações, é preciso associar o uso de outros medicamentos (telaprevir ou boceprevir) considerados tóxicos.

Além disso, esses medicamentos também poderão ser utilizados em pacientes que aguardam ou já realizaram transplante, por se tratarem de produtos de menor toxicidade, com menos efeitos colaterais.

A gerente do Serviço de Atendimento Especializado (SAE) do Hospital das Clínicas (HC) de Rio Branco, Edna Gonçalves, ressalta que ainda este ano, cerca de sete mil pacientes no Acre serão beneficiados com o novo tratamento.

Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil é um dos primeiros a adotar essa nova tecnologia na rede de saúde pública. A cada ano, aproximadamente 16 mil pessoas são tratadas pela doença no Sistema Único de Saúde (SUS). A expectativa é que o novo tratamento beneficie 60 mil pessoas nos próximos dois anos.

Estima-se que até 3% da população mundial pode ter tido infecção por esse vírus, o que corresponde a 185 milhões de pessoas. No Brasil, a prevalência estimada do vírus na população é em torno de 1,4 a 1,7 milhão, principalmente na faixa dos 45 anos.

Já no Acre, as autoridades de saúde realizam o acompanhamento da evolução do tratamento contra as hepatites de aproximadamente nove mil novos casos só este ano. “Atualmente, as hepatites matam mais que qualquer outra doença no Acre. Além disso, são tão graves quanto o HIV, por exemplo. Toda semana diagnosticamos pelo menos 5 novos casos”, destacou Edna Gonçalves.

No SAE, os pacientes recebem tratamento e estrutura de exames, além de acompanhamento psicológico, social e médico-multidisciplinar.

 

Tratamento com efeitos colaterais fortes e transplantes

Os remédios injetáveis tradicionais causam problemas colaterais graves à saúde do paciente
Os remédios injetáveis tradicionais causam problemas colaterais graves à saúde do paciente


Atualmente, estão em tratamento pouco mais de 50 pessoas, a maioria conhecida pelo nome entre os médicos e enfermeiros. Os remédios injetáveis usados atualmente causam problemas colaterais graves à saúde do paciente, que, muitas vezes, pode ser obrigado a suspender o tratamento por causa dos riscos. Além disso, o índice de cura dos tratamentos disponíveis não ultrapassa 70%.

“O novo tratamento vai diminuir o sofrimento deles. É triste ver uma pessoa sangrando dia e noite, dependendo do quadro, sem poder fazer nada”, lamenta Edna Gonçalves.

O primeiro transplante de fígado do Acre e também da região Norte feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS) foi realizado em Rio Branco, no início do mês de abril de 2014. Lúcio César Leite Nepomuceno passou por mais de oito horas de procedimento cirúrgico para receber o fígado doado por uma família da capital acreana.


A droga deve ser associada a outros
Daclatasvir é o primeiro inibidor pangenotípico do complexo NS5A aprovado no país que permite o uso em combinação com outros medicamentos para o tratamento de infecção crônica pelos genótipos 1, 2, 3 e 4 do vírus da hepatite C (HCV) em adultos. Essa medicação já foi aprovada nos Estados Unidos da América e é comercializada em alguns países europeus.

Adotado em combinação com sofosbuvir, consiste em um regime totalmente oral, livre de interferon, que proporcionou taxas de cura de até 100% em estudos clínicos, incluindo pacientes com doença hepática avançada, genótipo 3 e aqueles com falha do tratamento com inibidores da protease. O sofosbuvir e simeprevir ainda aguardam o registro.

O tratamento com interferon é duro, mas tolerável. O primeiro por injeção subcutânea de agulha aplicado uma vez por semana. O segundo deve ser tomado via oral, sendo quatro comprimidos por dia, de acordo com o peso e a resistência de cada pessoa aos efeitos colaterais. O tempo de tratamento varia de seis meses a um ano, dependendo se o genótipo da doença é do tipo 1, 2 ou 3.

Os efeitos colaterais variam de uma pessoa para outra. O mais forte é o Interferon, que é o terror de quem está para iniciar o tratamento e cerca de 20% dos pacientes o abandonam pela metade. Ou seja, de cada 100 pacientes que começam a tomar a medicação, 20 desistem.

Na maioria das vezes, os efeitos colaterais são de gripes, dores de cabeça, tosse, ânsia de vômito, calafrios, náuseas e muito sono. Em alguns casos, há até a perda parcial da audição.

 

Com a palavra o infectologista

Jorge Romero, infectologista
Jorge Romero, infectologista


“É um presente de Papai Noel aos pacientes com Hepatite C. É um alívio para o médico e pacientes”, comemora o infectologista Jorge Romero a aprovação do medicamento que chega para revolucionar o tratamento contra a doença.

“São medicamentos de via oral, que vão causar poucos efeitos colaterais. O tratamento anterior era indicado somente para um genótipo da doença, mas esse novo medicamento é indicado para todos os tipos de hepatite C e pacientes com cirrose”, explica.

Com a autorização da Anvisa o novo medicamento pode ser comercializado no Brasil, mas quem não quiser esperar até a droga chegar ao SUS deve preparar o bolso para investir até R$ 500 mil na aquisição do produto.

“Trabalhamos com a tendência de que a hepatite C vai desaparecer com o tempo devido à eficácia do tratamento. Assim, como a hepatite B que já possuímos vacinas”, destaca o médico.

O custo do tratamento de um portador de hepatite C, por exemplo, varia de R$ 6 mil a R$ 8 mil por mês.

A doença e suas formas de transmissão

Todo o material perfuro cortante deve ser esterilizado
Todo o material perfuro cortante deve ser esterilizado

A hepatite C é uma doença causada por vírus C (HCV) e transmitida principalmente pela transfusão de sangue, pelo compartilhamento de material para uso de drogas, objetos de higiene pessoal como lâminas de barbear e depilar, alicates de unha ou outros objetos que furam ou cortam na confecção de tatuagem ou colocação de piercings. Além do contato sexual ou por mães para bebês durante a gravidez. A enfermidade pode gerar lesões no fígado e até mesmo câncer hepático.

De acordo com o antigo presidente da Associação dos Portadores de Hepatites do Estado do Acre (Aphac), Heitor Júnior, os salões de beleza e gabinetes odontológicos são locais de maior risco de transmissão da doença, caso algumas orientações não sejam seguidas.

Nos salões de beleza é obrigatório existir um aparelho chamado autoclave (um aparelho utilizado para esterilizar artigos cirúrgicos através do calor úmido sob pressão) para esterilização dos materiais de manicure e pedicure. Itens como alicates, tesouras, afastadores, pinças de metal e outros instrumentos metálicos devem ser esterilizados.

Procedimento seguido a risca pela equipe do salão de beleza, Misturinha Chic. De acordo com a gerente Ana Souza, todo o nosso material perfuro cortante é lavado após cada atendimento com reagentes químicos apropriados e esterilizado em autoclave. Já os descartáveis como lixas, palitos de madeira e protetores de bacia são imediatamente inutilizados após serem usados.

“É uma maneira de garantir a segurança da nossa equipe e das clientes que cada vez exigem maior segurança relacionada a saúde”, confirma a gerente.

 

Associação de Portadores de Hepatite auxilia no tratamento dos pacientes

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Criada em 1993, a Associação de Portadores de Hepatite do Acre, que atualmente é presidida por Elza Mendonça, comemora os avanços obtidos ao longo desses anos.

De acordo com Mendonça, à missão da Aphac é trazer luz aos infectados com vírus da hepatite. Segundo ela, o Acre é o lugar que possui mais casos de hepatites no Brasil. “Para você ter uma ideia, atualmente 10% da nossa população é portadora com o vírus da hepatite. Portanto, é mais do que necessário o desenvolvimento deste trabalho”, disse.

Atualmente, a associação possui núcleo em sete municípios. Porém, segundo o parlamentar, funcionam ainda de forma precária. “Estamos presentes também nos municípios de Cruzeiro do Sul, Tarauacá, Feijó, Sena Madureira, Brasileia, Epitaciolândia e Plácido de Castro”, frisou.

Um dos objetivos da associação é instalar um núcleo da Aphac em cada município. “É importante desenvolver esse trabalho no interior, pois a informação quanto à doença é mínima. Temos que ter um olhar especial para essa questão da prevenção”.

Para o deputado estadual Heitor Junior (PDT), um dos principais defensores desta causa, a instalação do núcleo em cada município é importante, haja vista que o paciente não necessitaria vir até a Capital para fazer o tratamento, uma vez que a medicação poderia ser enviada ao local onde o portador do vírus mora.

“O que precisa ser mudado de imediato é a questão logística. Ela passa pela dispensação de medicamentos. Você manda referenciado para o hospital daquela cidade a medicação e a pessoa faz tratamento na cidade dela. O paciente só viria a Capital para realizar os primeiros exames, o tratamento seria realizado em sua própria cidade”, pontuou o parlamentar.

Ele frisa que o importante no momento é ir até o paciente e não esperar por ele, pois, em muitos casos, mesmo tendo noção de que possui o vírus, ele não procura o médico.

“Temos que fazer ação básica de saúde. Hoje, não podemos mais esperar que o doente venha até nós. Temos que modernizar nosso pensamento e ter noção de que temos que ir atrás das pessoas. O Estado tem que fazer a parte dele, tem que buscar a pessoa e vacinar”.

Entre os trabalhos desenvolvidos, um dos mais importantes, segundo Heitor, é a distribuição de cestas de alimentação para os pacientes que estão em tratamento. “Levando em consideração que o portador de hepatite que está em tratamento não pode se alimentar de qualquer coisa, decidimos distribuir cestas de alimentação para os que estão em tratamento. Distribuímos em média 50 cestas nos municípios. Na Capital, distribuímos em média de 150 a 200 cestas de alimentos”.


Deputado comemora chegada de novos medicamentos

Deputado Heitor Júnior (PDT)
Deputado Heitor Júnior (PDT)

O deputado Heitor Júnior (PDT) comemorou a chegada de novos medicamentos para o tratamento da Hepatite C no Estado. Ele lembra que os remédios daclatasvir, simeprevir e sofosbuvir, juntos são eficientes, com um percentual de cura de cerca de 90%.

Segundo o parlamentar, o novo tratamento, que será ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), apresenta menor custo, tem mais potencial e provoca menos efeitos colaterais.

“Recebi a notícia essa semana do diretor Nacional do Programa DST/AIDS e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita, que garantiu que, até a semana que vem as 263 pessoas listadas iniciarão o tratamento. Vamos avançar muito. Estamos a um passo de uma nova agenda para as hepatites no Estado”, disse.

O parlamentar salienta que o Acre inicia uma nova fase no tratamento para a doença. “A liberação dos inibidores de protease ocorreu foi graças a parcerias firmadas entre o Governo Federal e estadual. Esses medicamentos que representam a cura total da hepatite C é um grande ganho para a saúde pública do Estado”, ressaltou.


Após ser tratada no HC, paciente se torna voluntária no atendimento aos hepatopatas

Lizete Lima Souza procura ajudar quem precisa
Lizete Lima Souza procura ajudar quem precisa

Lizete Lima Souza poderia ficar apenas nas estatísticas de pacientes com hepatite C que fizeram transplante fora do Estado, mas ela quis fazer diferente. E faz todos os dias ao trabalhar voluntariamente no acolhimento dos pacientes que chegam ao Serviço de Atendimento Especializado (SAE) assustados com o diagnóstico da doença.

Transplantada há 15 anos em São Paulo, Lizete chega de segunda a sexta-feira às 8h no Hospital das Clínicas e só sai junto com a gerente Edna Gonçalves, independente da hora. Sem receber sequer o vale transporte.

“Ela trabalha como qualquer outro funcionário e com o diferencial do carinho e uma paciência que só quem passou pelo tratamento, sabe o que os pacientes sentem. É por pessoas como ela que trabalhamos, é um orgulho para gente ter ela por perto”, explica a gerente.

“Aqui procuro dar o que recebi e já recebi tanto que me sinto na obrigação de ajudar quem precisa. Precisava fazer algo por alguém, já que tanta gente faz por mim. Acompanhava a luta dos servidores aqui, com muito trabalho e pouco pessoal e pensei que poderia ajudar de alguma forma. Para mim é uma alegria contribuir para que as pessoas possam ser saudáveis de novo”, relata Lizete emocionada.

A confiança entre os amigos de trabalho é tanta que após o segundo transplante de fígado realizado no Acre, o paciente foi acolhido por Lizete em sua casa. “Para mim foi uma honra ajuda naquele momento. Ele morava longe e precisava se instalar em Rio Branco para o pós-operatório. Nem pensei duas vezes. Ele foi lá para casa e cuidei como filho”, lembrou Lizete.

Sobre o dia a dia no trabalho Lizete destaca que o paciente chega muito carente e por isso, uma pessoa que já passou pelo problema sabe orientar melhor do que uma que não sabe o que é ter hepatite C.

“Às vezes converso mais que o necessário. O paciente fica tão carente ao receber o diagnóstico. Costumo dizer que a dor irmana as pessoas. Um problema compartilhado nos torna irmãos. Os casos mais graves nos tocam mais. Gosto de tratar as pessoas como gostaria de ser tratada e como fui aqui”, conclui Lizete.

“Para gente que está sadio algumas vezes não entende o paciente, por mais que queira. Por isso, valorizamos o trabalho da Lizete. Além do trabalho burocrático, esse gabinete serve também como divã”, confirma Edna Gonçalves.

 

Chegada do novo medicamento trouxe esperança para os portadores de hepatite do Acre

8“Descobri ser portador da hepatite C há 22 anos. Já vi muita gente morrer por complicações da doença. Também tive medo de morrer. Mas, graças a Deus, esse medicamento chegou e vou ter a oportunidade de recomeçar minha vida”, comemorou o engenheiro, Aristóteles Barroso, ao receber o tão aguardado remédio.

As primeiras unidades dos medicamentos sofosbuvir e daclatasvir foram entregues no final do mês de outubro, no Serviço de Atendimento Especializado (SAE) do Hospital das Clínicas de Rio Branco e pelo governador Tião Viana. O Acre é o segundo estado brasileiro a receber a medicação.

A gerente do SAE, Edna Gonçalves, confirmou que nesta primeira etapa de entrega serão beneficiados 260 pacientes que não podiam receber o tratamento anterior.

Aristóteles Barroso foi intolerante ao tratamento convencional e por mais de 20 anos a doença foi acompanhada de perto. “Após sofrer com essa doença, aviso às pessoas, que façam os testes, procurem saber da doença antes que seja tarde demais. Quando descobri, a sentença de morte era quase certa”, recordou o engenheiro que não escondia a felicidade de receber o medicamento.

De acordo com a médica infectologista Cirley Lobato, todas as pessoas na faixa dos 40 anos, devem fazer os testes para saber se estão com a doença ou não.

“Costumo dizer que a hepatite C atinge um órgão apaixonado, que é cego, mudo e surdo. Ou seja, o fígado só demonstra estar com problemas quando o estágio da doença já é avançado”, explicou a médica.

 

Pacientes não apresentam sintomas em muitos casos de hepatite

De acordo com o Ministério da Saúde, estima-se que o país tenha cerca de três milhões de pessoas contaminadas e a maioria não sabe, pois, os sintomas, em muitos casos, podem não aparecer mesmo em situações mais avançados da doença.

A hepatite C é uma doença que se caracteriza por uma inflamação no fígado, e pode ter origem em uma infecção viral ou até ser causada por medicamentos.

Segundo MS, o ideal seria a realização de pelo menos uma vez por ano do teste que detecta a doença. Quanto mais cedo à pessoa confirmar ser portadora do vírus, as chances de cura são maiores.

 

(Fotos: Odair Leal/ A GAZETA)

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