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Nós vamos pagar a conta do pré-sal

Todo mundo já ouviu falar que o Brasil será, dentro em breve, um dos grandes produtores mundiais de petróleo graças às descobertas de imensas jazidas do ouro negro na camada pré-sal do leito submarino na região litorânea localizada entre os estados de Santa Catarina e Espírito Santo. Já faz alguns anos que o governo tem alar-deado – e a imprensa tem repercutido sem partidarismo – que essas novas reservas de petróleo irão gerar riqueza, abrir milhares de oportunidades de emprego e revolucionar o desenvolvimento econômico do Brasil.

A camada do pré-sal formou-se entre 150 e 100 milhões de anos atrás no espaço que surgiu com a separação dos continentes Americano e Africano. Na medida em que esses continentes separavam-se, formaram-se grandes lagos nas depressões resultantes. Como os rios dos novos continentes corriam para as regiões mais baixas, os lagos recém-formados passaram a receber, ao longo de milhões de anos, grandes volumes de matéria orgânica que assentaram em seu leito e mais tarde se transformaram em rochas sedimentares geradoras do petróleo.

O distanciamento paulatino e constante dos novos continentes deu origem ao Oceano Atlântico, que terminou por recobrir todo o espaço existente entre eles. Com o tempo, uma grossa camada de sal, com 1-2 km de espessura, se formou sobre a camada de matéria orgânica depositada no início da separação dos continentes. Essa camada de sal marinho isolou a camada de matéria orgânica que, graças a processos termoquímicos, se transformou em hidrocarbonetos – petróleo e gás natural.

Se forem confirmadas as estimativas de 80 bilhões de barris de petróleo armazenadas na camada do pré-sal brasileiro, o país seria catapultado à sexta posição no ranking mundial em termos de reserva de petróleo, atrás da Arábia Saudita, Irã, Iraque, Kuwait e Emirados Árabes.

Em fevereiro de 2015 a produção de petróleo oriunda do pré-sal atingiu cerca de 740 mil barris por dia, ou aproximadamente 26% da produção diária do país. Temos que reconhecer que é um feito e tanto. Afinal, para extrair petróleo e gás da camada pré-sal é necessário ultrapassar uma lâmina d’água de mais de 2 km, uma camada sedimentar com cerca de 1 km e outra de 1-2 km de sal. Na camada pré-sal o petróleo foi encontrado em profundidades que variam entre 5 e 7 km abaixo do nível do mar.

Está claro que produzir petróleo em condições tão adversas requer tempo, desenvolvimento tecnológico e muito dinheiro. Não é à toa que nos últimos anos a Petrobras foi cantada em prosa e verso porque a maior parte da tecnologia para a exploração e produção no pré-sal foi desenvolvida no país. Se lembrarmos de que a maior parte dos recursos que garantiram esse feito também teve origem no país, dá para entender porque parte da imprensa mundial pintou o Brasil como uma superpotência econômica e tecnológica.

Infelizmente os tempos são outros. A realidade bateu à porta do nosso país. E ela não trás boas notícias.

Quando o petróleo começou a jorrar dos primeiros poços do pré-sal, em meados de 2008, o preço do barril de petróleo era de aproximadamente U$ 40. Subiu para mais de U$ 120 em meados de 2014 e caiu vertiginosamente para pouco mais de U$ 50 na atualidade. Publicações especializadas são quase unânimes em estimar que no curto e médio prazo o preço do petróleo dificilmente alcançará U$ 100.

Não entendeu minha preocupação com o fato de o preço do petróleo ter que demorar tanto a voltar ao patamar de U$ 100? Simples. Segundo estimativas de especialistas, o custo para a extração de um barril de petróleo da camada do pré-sal é de aproximadamente U$ 110 dólares. Com o preço do petróleo no mercado internacional se mantendo por volta dos 50 dólares a exploração de petróleo do pré-sal é, sob o ponto de vista econômico, inviável. Explico: se o petróleo do pré-sal fosse explorado para ser exportado ninguém em sã consciência o compraria pelo seu preço de custo, que é pelo menos U$ 50 superior ao preço de mercado.

Se a Petrobras fosse uma empresa privada, ou uma estatal séria, que funcionasse sem interferências de políticos e partidos corruptos, os investimentos e os gastos com a continuidade da exploração do pré-sal seriam suspensos até que as condições de mercado voltassem a ser favoráveis. Mas não é isso que vai acontecer.

Contra o bom senso e a lógica comercial, e a despeito de toda a repercussão negativa da operação lava jato, a Petrobras e o Governo Federal usarão de malabarismos e artimanhas para sugar recursos do orçamento federal e da população (via BNDES) para tentar manter o ritmo de investimentos para a exploração e o desenvolvimento dos campos de produção de petróleo do pré-sal.

Como não vai dar para vender o petróleo do pré-sal no mercado internacional, a Petrobras vai vender ele aqui dentro, no mercado interno. E nós, os consumidores, é que vamos bancar os altos custos de exploração requeridos pelos poços instalados na camada do pré-sal. Além dos altos custos de exploração ainda teremos que bancar, muito provavelmente, desvios tipo os desnudados pela operação lava jato.

E tudo isso será mantido via preços de combustíveis na estratosfera. Você acha que a gasolina está cara? Se prepare para mais aumentos! E não adianta você argumentar que os preços do petróleo no mercado internacional estão estáveis ou caindo. O preço que pagaremos aqui no Brasil tem que se mais alto. Afinal, não teremos outra opção, mas pagar a conta do pré-sal. Que lástima.

* Evandro Ferreira é engenheiro agrônomo e pesquisador do INPA/Parque Zoobotânico da UFAC.

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