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Suicídio: uma contradição da vida

Numa simples visita ao Google  pode-se constatar que no  Brasil, a taxa de suicídio, principalmente entre adolescentes e jovens aumentou pelo menos 30% nos últimos 25 anos. Contudo, os índices de suicídios no País ainda são baixos, quando comparados com a média mundial, notadamente no Japão. Essa inclinação suicida de muitos homens e mulheres, pelo mundo afora, é uma verdadeira contradição da existência humana, uma vez que há milhões de pessoas lutando, com a ajuda da ciência para sobreviver um pouco mais.

A verdade é que o mundo intelectual, já de longa data, tem empreendido numerosas investigações teológicas, filosóficas, psicológicas e sociológicas sobre o suicídio, sem, contudo evitar as contradições ou as  antinomias, verdades aparentemente contraditórias entre si, da questão.

O filósofo existencialista Alberto Camus, declarava que só existe um problema filosófico serio: o suicídio. A vida é absurda, uma bolha vazia no mar do nada, e é uma questão séria quanto à sua continuação ou não, dizem alguns existencialistas. Camus, embora reconhecendo o absurdo envolvido, muitas vezes, na própria vida, argumentava que o suicídio é uma reação inadequada para esse absurdo. A verdadeira reação humana seria “viver” em plena consciência aquele absurdo.

Sócrates negava que o homem tenha o direito de cometer suicídio. Segundo ele raciocinava, o homem é propriedade dos deuses, e a vida e a morte dependem deles, e não da vontade humana. Ele pensava que sempre será melhor sofrer do que cometer um mal e o suicídio é um mal, pelo menos na maioria dos casos.

Platão aborda o assunto, de um ponto de vista legal, ou político-religioso-legal: o que se mata a si mesmo, o que se despoja violentamente da vida que o destino lhe fixou sem que seja forçado a isso, o que por covardia se inflige  a si mesmo um castigo injusto, deverá ser enterrado em lugar isolado e deserto (?) sem glória, sem estrelas e sem nome.

Aristóteles denuncia o suicida como um covarde que foge da pobreza ou da dor. O suicida, diz Plotino, produz dano à sua alma. Mas é o mesmo Plotino que diz que o homem cegado pela paixão, comete  violência  contra si mesmo.

Suicidar-se é segundo Kant, ofender a dignidade da pessoa, a qual, como ele mesmo diz na Metafísica dos Costumes, está obrigado, enquanto pessoa, a conservar sua própria vida.

Voltaire, sem querer fazer apologia de uma ação, o suicídio que as leis condenam, indica, ironicamente, que nem o Antigo Testamento nem o Novo Testamento jamais proibiram ao homem abandonar sua vida quando já não pode mais suportá-la.

Schopenhauer, embora pregasse uma doutrina de futilidade e desespero, opunha-se ao suicídio sob a alegação de que esse ato representa os desejos do indivíduo, e não um verdadeiro ato de renúncia.

Há uma corrente de filósofos existencialistas que são frontalmente contra o suicídio. O suicídio diz Jean Paul Sartre, é errado porque é um ato de liberdade que destrói todos os atos futuros de liberdade. É uma afirmação do ser mediante a qual a pessoa finalmente nega seu ser. Ou, nas palavras corriqueiras, o suicídio é um ato do vivente antirracional ao qual falta uma verdadeira base lógica.

Definir o suicídio desta maneira, no dizer do filósofo contemporâneo Norman Geisler, ressalta precisamente quão irracional o ato realmente é. É um arrazoado que destruiria o raciocínio da pessoa.

Teologicamente, a vida é um dom de Deus, e devemos ter cuidado acerca de como tratamos esse Dom. Os primeiros pais da igreja permitiam o suicídio somente em circunstâncias muito específicas e limitadas, mas a maioria dos teólogos cristãos tem classificado o suicídio como uma forma de homicídio. Agostinho negava que o suicídio seja legalismo, sob qualquer circunstância, e Tomás de Aquino o secundou. Ele expunha estes três princípios gerais contra tal ato:

1. O suicídio é desnatural e contrário ao amor, que o indivíduo deveria ter para consigo mesmo e para com o próximo.

2. É também uma ofensa contra a sociedade, pois ninguém vive para si mesmo, como também ninguém morre para si mesmo.

3. O suicídio usurpa o poder de Deus, o único que pode tomar as decisões acerca de quando o homem deve viver ou morrer. Os teólogos católicos romanos, naturalmente, têm tomado a posição de Tomás de Aquino, como também os teólogos protestantes conservadores.

O mal do suicídio, independente de dizerem que a causa mais comum do ato intencional de matar a si mesmo, ser transtorno mental, alcoolismo ou abuso de drogas, é que o suicida não anuncia previamente que vai cometer o ato. O caso do rapaz que se enforcou no motel traz essa característica: adentrou ao recinto pela manhã e, sem estardalhaço, cometeu o ato contra sua própria vida. Este jovem e outros milhões, nos quadrantes da terra, se inserem no pensamento do filósofo Nietzsche, para quem o homem deve ter, pelo menos, a liberdade de escolher morrer.

*Pesquisador  Bibliográfico em Humanidades.
E-mail: assisprof@yahoo.com.br

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