Em entrevista ao jornal A GAZETA, o diretor do Departamento de Polícia da Capital e do Interior (DPCI), delegado Nilton Boscaro, destacou o trabalho intenso da Polícia Civil no combate ao tráfico de drogas no Estado e falou sobre as dificuldades burocráticas que atrapalham o serviço.
De acordo com ele, a droga mais apreendida no Acre é a maconha, seguida da cocaína, esta última, geralmente, usada para tráfico doméstico.
Ele explica que a logística para traficar a cocaína é mais fácil e lucrativa. “Nós temos o Peru como maior produtor de cocaína e em terceiro lugar a Bolívia. Então são dois países produtores de cocaína que estão ao nosso redor. Eles não trazem tonelada de cocaína para Rio Branco. O que compensa mais para eles é ir e pegar de pouquinho, pois é menos perigoso para questões lucrativas”, explica.
Já o maior produtor de maconha é o Paraguai. Para chegar ao Acre, a droga entra no Brasil pelo Mato Grosso do Sul. Quando as polícias civis de outros estados de rota não conseguem interceptar a droga, a polícia do Acre fica responsável por apreender grandes quantidades da substância. “A Polícia Civil aqui no Acre teve bastante resultado graças ao trabalho integrado com as polícias civis de outros estados”, destaca.
Nilton Boscaro trabalhou na fronteira em 2010. Ele conta que nessa época conseguiu o êxito, juntamente com a equipe, de zerar as bocas de fumo em Brasileia. “É tanto que os usuários estavam atravessando a ponte para ir comprar no território boliviano, onde já sai da nossa jurisdição”.
Segundo ele, a polícia fazia um trabalho de investigação para chegar até os verdadeiros traficantes. “Nós aguardávamos esses usuários transpor a fronteira. Já em território brasileiro, os apreendíamos com a droga, que era para consumo. Normalmente, o usuário informava onde tinha comprado imaginando que esse traficante não poderia ser pego aqui no Brasil. Mas, quando esse traficante vinha para este país, nós já tínhamos instaurado procedimento criminal e teríamos um mandado de prisão. Quando ele atravessava, a gente prendia. Por isso, em 2010, chegamos nesse nível no município de Brasileia”, relatou.
Nos últimos anos, o número de apreensões de drogas mostra a efetividade da Polícia Civil. E o objetivo é melhorar ainda mais, segundo Boscaro. “Em 2013 foram apreendidos 30 kg de cocaína e 400 kg de maconha. Em 2014 foram 34 kg de cocaína e 168 kg de maconha. Este ano, na antiga rodoviária de Rio Branco, nós conseguimos apreender 380 kg de maconha, que estava vindo do Mato Grosso do Sul. Enquanto que até hoje foram apenas 5 kg de cocaína. Nós queremos aumentar esse número de apreensões. A Polícia Civil atua firme no combate à droga comercializada no Estado”.
De acordo com o delegado, há um informe de que grandes quantidades de drogas estão atravessando o Estado do Acre, por meio fluvial. “Esse é um trabalho da Polícia Federal. Trata-se de uma droga que vem de outros países e vai para outros países utilizando o Brasil apenas como uma rota”.
Demora em expedir mandados preocupa o delegado
Apesar dos êxitos conquistados, Nilton Boscaro afirma que ainda existe um fato que atrapalha a agilidade da polícia. Segundo ele, muitas vezes, conseguir um mandado de busca e apreensão com alguns juízes de Rio Branco é uma verdadeira ‘maratona’.
“Para prender, tenho que ter um mandado de busca e apreensão. Só que essa representação vai para o Poder Judiciário. Alguns juízes avaliam e já deferem ou indeferem naquele momento. Ou seja, nos dão uma decisão na hora. Não é rápido, mas é mais rápido do que outros juízes que mandam para o Ministério Público opinar sobre a expedição de um mandado de busca e apreensão. Esse trâmite burocrático atrapalha o trabalho da polícia”.
Segundo Boscaro, a Polícia Civil não investiga para acusar, mas sim para apurar o fato. “Mesmo eu indo pessoalmente para agilizar uma situação, porque é algo alarmante, ainda assim demora, leva uma manhã inteira, ou um dia inteiro para conseguir um mandado de busca e apreensão. Quando escurece, não podemos mais prender, porque é regra. Apenas se tiver um mandado específico e nem todos os juízes concedem”.
Mapa da rota do tráfico: Bolívia, Peru e Paraguai produzem a droga
Secretaria de Segurança Pública destaca ações nas fronteiras do Acre
MARCELA JANSEN
O secretário de Segurança Pública do Estado do Acre, Emylson Farias, em entrevista ao jornal A GAZETA, falou sobre as diretrizes adotadas pela atual gestão no combate ao tráfico de drogas no Estado.
Ele frisa que o ponto de partida da Secretaria foi instituir um novo Sistema de Segurança no Estado a fim de desenvolver ações eficazes nos municípios do Acre, em especial, os que fazem fronteiras com Peru e a Bolívia, atualmente considerados como um dos maiores produtores de drogas da América Latina.
“Nós temos inúmeras ações que estão sendo implementadas e essas ações fazem com que tenhamos, inclusive, dados que sejam positivos nesses primeiros cinco meses. O primeiro passo foi desenvolver um trabalho integrado, pois temos a consciência de que somente assim poderemos obter os resultados desejados”, disse.
Segundo Emylson, a Secretaria de Segurança tem fortalecido o olhar e atenção à fronteira a partir do Gabinete de Gestão Integrada (GGI), onde estão presentes a Polícia Militar, Civil, Federal, Rodoviária Federal, Força Nacional e Ministério Público. Ele explica que dentro da GGI foi criada uma câmara temática com a finalidade de debater detalhadamente ações que serão realizadas nas fronteiras.
“Essa atenção e esse olhar diferenciado tem feito com que realizemos ações especificas. Debater essas ações dentro da câmara temática tem sido de fundamental importância, pois quando falamos em fronteiras, nós visualizamos o combate não apenas de drogas, mas de outros ilícitos”, frisou.
Ele ressalta que a atuação do Gabinete de Gestão Integrada tem como foco, atualmente, o combate aos entorpecentes e armas de fogo, em todo o Estado.
“Essa atenção redobrada com relação a nossa fronteira existe, pois entendemos que ali estamos combatendo não apenas a entrada de drogas no país. Temos nos focado também em combater a entrada ilegal de armas de fogo em nosso país. Entendemos que se combatermos esses dois ativos criminais, crimes com furtos, roubos, homicídios, enfim, podem diminuir no Acre”, disse o gestor ao destacar ainda a recente operação no bairro Taquari, na Capital, como exemplo de ação resolutiva para o problema não apenas em municípios fronteiriços.
“Nós tivemos, recentemente, em Rio Branco, uma operação que ocorreu dentro do bairro Taquari. Esta operação tinha como objetivo principal prender traficante, tirar drogas de circulação, que é um ativo criminal que nos preocupa, e arma. Volto a frisar que se tivermos um entendimento de que combatendo estes dois ativos criminais, arma e droga, a gente diminua a criminalidade e isso é fruto de um olhar inteligente, estratégico e planejado”.
Emylson reforça a necessidade de o trabalho ser desenvolvido em conjunto com todos os órgãos que compõem a Segurança Pública do Estado. “Se falo em fronteira, não tem como falar apenas de Polícia Civil ou Militar, mas também em Polícia Federal, Rodoviária Federal, enfim, precisamos da atuação de todos. Sabemos o que devemos combater e esse trabalho em conjunto é imprescindível”.
Por fim, ele frisa que além do combate às drogas, armas de fogo, o terceiro foco do Gabinete de Gestão Integrada (GGI) é a ocupação do território pela força policial. “Não adianta apenas apreender e não ocupar o espaço território, pois estaremos deixando o caminho livre para que os ativos criminais continuem a acontecer. Quanto ao trabalho nas fronteiras, temos um trabalho que tem nos proporcionado resultados positivos. Antes apreendíamos trouxinhas, hoje, apreendemos toneladas. Temos avançado, porém, sabemos que precisamos continuar avançando, pois quando falamos em combater crimes na fronteira, nos referimos também a combater crimes em todos os municípios”, finalizou.
Estrangeiras usadas como “mulas” ficam presas no Estado
BRENNA AMÂNCIO
Natali Andrade esfregava as mãos suadas uma na outra enquanto tentava controlar a respiração ofegante. Estar dentro daquele ônibus representava muito em sua vida. Ela estava deixando para trás o lar no seu país, o Peru, para se aventurar em uma missão arriscada: levar drogas para São Paulo.
Não conhecia o Brasil, apesar de ter nascido no interior do Acre. Não tinha lembranças daquele Estado, pois logo pequena foi levada para o Peru, onde cresceu e começou a estudar.
Enquanto o ônibus seguia na estrada, ela se lembrava do acordo firmado com uma colega do hotel onde trabalhava como recepcionista.
A outra jovem lhe fizera uma oferta generosa. Caso ela tivesse coragem de levar drogas para São Paulo e tudo desse certo, ela voltaria a trabalhar ali e ainda teria seus estudos na faculdade de Administração de Empresas quitados. E ela sabia o quanto era pesado o valor da mensalidade para a sua família.
Movida pela recompensa e pela curiosidade de conhecer o Brasil, Natali decidiu se arriscar.
Pouco antes de sair do Peru, duas mulheres a prepararam para a viagem. Os 2,5 kg de cocaína foram colados ao seu corpo, na região da barriga, para passar despercebido por qualquer um.
No entanto, na entrada de Xapuri, a polícia interceptou o ônibus em que ela estava. Naquele momento, Natali já sabia que sua vida iria mudar. “Quando eu vi a polícia pensei: eu estou presa”, disse ela à equipe do jornal A GAZETA ao recordar da situação ocorrida em 19 de novembro de 2013.
Natali Andrade da Silva, 21, é uma das sete estrangeiras presas que cumprem pena na Unidade de Regime Fechado Feminino, em Rio Branco.
A jovem foi condenada a 4 anos e 5 meses de prisão. No entanto, desde que chegou ao presídio em 2013, só conseguiu falar com a família por telefone uma vez.
Muito emocionada, Natali afirma que sonha em voltar para casa. “Eu me arrependo muito, porque os meus pais não sabiam. Eu saí de casa sem falar com meus pais. Eles pensam que errar é humano, mas ficaram sentidos com o que aconteceu, porque eu sou a única filha deles”.
O futuro é incerto para ela, mas os planos que lhe fazem sobreviver os dias dentro da cadeia é terminar os estudos e trabalhar dignamente. “Eu nem sei como vai ser a minha vida lá fora”, admite.
Outra estrangeira presa no local é a venezuelana Jenifer Carolina Gaite, de 24 de idade. A história dela parece tirada de um filme.
A jovem saiu da Venezuela para trabalhar no Peru e encontrar uma amiga no início deste ano. Para conseguir melhorar de vida, ela deixou os dois filhos pequenos sob a responsabilidade da irmã no país de origem.
Logo conseguiu emprego com uma senhora que, além do trabalho, lhe propôs levar uma maleta para São Paulo. Disse que a recompensaria com mil dólares.
Apesar das circunstâncias, Jenifer declara que não sabia de droga alguma. Não desconfiou das intenções da patroa.
Ao passar pelo Acre, no dia 26 de março, a maleta foi interceptada pela Polícia Federal. Dentro havia cocaína.
Até o momento, Jenifer não foi julgada e espera ansiosamente pelo seu futuro longe das grades. “Não sei quanto tempo vou passar presa”.
“Eu fui enganada”, afirma peruana detida em Rio Branco
A peruana Cristina Lopez Domingues, 36, está presa no Acre desde abril de 2014. Em poucos meses ela estará livre, de acordo com a sentença que recebeu da Justiça.
Sua vinda para o Estado não tinha nada a ver com drogas ou encomendas estranhas. Na verdade, Cristina sempre trabalhou duro com a agricultura e como vendedora ambulante no Departamento San Martin, no Peru.
Mãe de três filhos, sendo o mais velho de 18 anos e o mais novo de 6 anos de idade, ela sempre buscou fazer o melhor para garantir o sustento da família.
Para modernizar o seu pequeno negócio, Cristina resolveu vir a Rio Branco comprar material de qualidade e aproveitaria para visitar um amigo.
“Na verdade eu fui enganada por outra menina que conheci na capital do Peru. Eu vendia roupas, sapatos e outras coisas. Queria modernizar o meu negócio. Eu não conversei com ninguém sobre droga. Comprei a mala para viagem com a menina, porque ela também era vendedora ambulante”, relatou.
O que Cristina não sabia era que a outra vendedora havia colocado a droga dentro do forro de sua mala. Sem saber de nada, ela veio em direção ao Acre. “Quando encontraram a droga eu me senti impactada, surpreendida. Nunca me passou em mente ser esse tipo de pessoa. E aconteceu comigo. Foi uma surpresa tão grande! Minha mente foi longe, porque eu tenho três filhos”.
Atualmente, Cristina está mais consolada com a situação. Afirma ter aprendido muito no tempo em que passou presa por um crime que não cometeu. “Por um lado, só Deus sabe o propósito para as nossas vidas. Isso foi como uma escola em minha vida. Aprendi várias lições, sendo uma delas não confiar mais nas pessoas e nem na minha própria sombra”.
Traficantes chegam a prometer até R$ 3 mil para que jovens levem drogas
“Ei, moço? Tira uma foto minha. Peraí. Deixa eu arrumar meu cabelo. Faz anos que eu não sei o que é tirar uma foto”, pediu Aline Fernanda Oliveira de Souza, 21, ao repórter fotográfico de A GAZETA por meio de uma janelinha da cela onde estava.
Muito extrovertida, a jovem logo puxou conversa com a equipe de reportagem. Ela queria ser vista, mostrar ao mundo que ainda existia, mesmo estando presa há dois anos e três meses.
Aline Fernanda sabia o que queria desde o início. Diferente de outras mulas, ela não foi enganada. Quis trazer drogas para o Acre na esperança de dinheiro fácil.
“Comprei a droga no Mato Grosso do Sul para vender aqui e dar de comer as minhas filhas e a minha mãe que está doente. Ninguém trabalhava na minha casa e eu tinha que ajudar”, justificou.
Ela e outras duas mulheres se aventuraram rumo a um destino incerto com 98 kg de maconha no início de 2013. “Eu não sabia de nada. Apenas peguei a mercadoria, soube da quantia que eu ia receber e vim. Eu não sabia nem onde era o Acre, para falar a verdade. Eu ia receber 3 mil reais pela droga”.
Aline Fernanda foi condenada a ficar sem a liberdade por 8 anos e 9 meses. Tempo em que não verá as filhas e nem a mãe. “Hoje, para mim tudo isso que passei não valeu nada, mas se tivesse dado certo teria valido alguma coisa, porque eu teria matado a fome das minhas filhas”.
Atualmente, a Unidade de Regime Fechado Feminino comporta 165 presas, mas esse número varia diariamente. No local, as detentas têm acesso a cursos, estudos, oficinas e atividades religiosas.
Segundo a coordenadora da unidade, Ana Cristina Pereira, a língua diferente não é empecilho para as estrangeiras. “O tratamento é igual. Sobre a comunicação, o que acontece é que elas vão se adaptando e se fazendo entender. A gente tenta entendê-las do jeito que dá”.