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Aprendendo lições de desastres para não repetir a história

Experiências dolorosas, como  desastres,  precisam de reflexão, mas o que impede esta reflexão é nosso desejo de esquecer a dor. Quem esteve num acidente automobilístico quer lembrar a dor associada? Mas no caso de desastres, analisar a evolução deles é um mecanismo importante para reduzir os riscos de desastres no futuro.  Uma maneira de fazer isto é via simulados de mesa onde desastres passados ou hipotéticos podem ser simulados com desenhos de cidades ou de áreas críticas num papel esticado numa mesa.

Nos anos passados, com a ajuda do coordenador da Defesa Civil Municipal de Rio Branco, usamos simulados de mesa no miniMAP Gestão de Risco e Defesa Civil para preparar a população da região de fronteira de Assis Brasil, Iñapari e Bolpebra para inundações e incêndios. Na verdade os eventos mostraram principalmente as limitações da nossa preparação, mas serviu para alertar a sociedade local e mobilizar o setor privado.  Este fevereiro, este setor foi chave para retirar móveis e pessoas em Iñapari durante a inundação do Rio Acre.

Desde 2005, passamos por muitos desastres – os incêndios de pastagens, cultivos e florestas em 2005 e em 2010, as inundações severas do Rio Acre em 2012 e 2015 e de outros rios, e a inundação do Rio Madeira em Rondônia em 2014 que reduziu drasticamente o abastecimento do Acre e Pando durante dois meses.

Talvez a situação mais complicada tenha sido a dos incêndios de 2005 quando mais de 300.000 ha de florestas queimaram e cerca de 400.000 ha de pastagens e cultivos viraram cinzas no leste do Acre.  Para melhorar a preparação e resposta a eventos semelhantes, a Defesa Civil Estadual e a Defesa Civil Municipal de Rio Branco analisaram recentemente com técnicos do ICMBio, da Unidade de Situação/IMC e de um grupo de pesquisa da UFAC  a possibilidade de realizar um simulado repetindo a situação de 2005, mas com os recursos e conhecimento atuais.

O melhor pode ser o inimigo do bom.   No lugar de eliminar os danos, consideraram a possibilidade de reduzi-los pela metade, ou seja, somente 150.000 ha de florestas queimariam e 200.000 ha de pastagens e cultivos ficariam perdidos.

Para iniciar esta discussão na sexta-feira passada, a Unidade Central de Geoprocessamento (UCEGEO) preparou um mapa com as cicatrizes de incêndios de 2005 em imagens de satélite de 2015.  O mapa foi projetado na tela da unidade de resposta para ver o tamanho do desafio.  O impacto foi marcante para todos participantes: centenas de cicatrizes de incêndios variando de alguns até milhares de hectares espalhados pelo leste do Acre.

A tarefa de reduzir este impacto pela metade envolveria muito mais do que o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil; exigiria a coordenação com um grupo maior e especialmente com a sociedade civil.

Nas próximas fases deste simulado, a participação de outros grupos será essencial para que esta lição relativa ao desastre de 2005, altere políticas públicas e a cultura regional.  Sem estas mudanças, secas extremas no futuro poderão ter efeitos devastadores.  Afinal as palavras do George Santayana são relevantes neste contexto1: “Os que não podem lembrar do passado são condenados a repeti-lo”.

* Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Risco de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA).

(Footnotes)
1 https://en.wikiquote.org/wiki/George_Santayana

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