A discussão sobre mudanças climáticas oferece uma oportunidade para entender melhor como o nosso planeta funciona. Um dos argumentos usados para refutar que atividade humana está afetando o clima é que mesmo com 7 bilhões de indivíduos, a humanidade é muito pequena em relação aos processos que atuam no planeta.
Para responder a esta afirmação, precisamos entrar no mundo dos números e usar a língua mais universal do mundo: a matemática. Por exemplo, se cada pessoa ocupa 1 metro quadrado, os 7 bilhões de pessoas ocupariam 7 bilhões de metros quadrados. Dado que um quilômetro quadrado tem um milhão de metros quadrados, a população humana inteira ocuparia somente 7.000 quilômetros quadrados, ou seja, uma área de 70 km por 100 km. Pode aparecer grande, mas em comparação com a área de terra firme da Terra sem gelo, 130 milhões de quilômetros quadrados, a humanidade como indivíduos ocupa somente 0,005% dela, quase nada.
Mas nós somos mais do que a área individual. A área urbana é cerca de meio milhão de quilômetros quadrados para cidades maiores do que 500.000 habitantes, totalizando mais de 2 bilhões da população mundial. Esta área é 0,3% da área de terra firme, ainda pequena.
A situação, porém, começa a ser diferente quando falamos de agricultura, pecuária, extração de madeira, estradas, etc. Pesquisadores em instituções americanas e espanholas estimaram que mais de 50 % da área terrestre sem gelo já foi modificado por seres humanos até 2007. As modificações principais incluem áreas cultivadas (13%) e pastos (26%). Como indivíduos ocupamos quase nada da Terra, mas com as nossas ações afetamos uma área significativa. Existem estimativas de que apropriamos cerca de um quarto da produção prímária (produção de plantas) da superfície terrestre. Além de afetar a superfície terrestre, estamos afetando os oceanos, desde a pesca até a acidificação das águas superficiais.
Agora vamos voltar a mudanças climáticas para ver se a atividade humana é significativa. Um argumento usado é que os fluxos naturais de carbono são tão grandes e os da atividade humana são tão pequenos e considerados insignificantes. O porém reside na natureza dos fluxos. Os grandes fluxos naturais somam cerca de 200 bilhões de toneladas de carbono (BTC) por ano, mas são cíclicos, se não, o estoque de gás carbônico na atmosfera em poucas décadas dobraria ou sumiria. A contribuição de atividades humanas, na ordem de 10 BTC por ano, porém, é cumulativa e acelerando.
Desde da década de 1950 temos bons registros da concentração de gás carbônico na atmosfera que subiu de 315 partes por milhão (ppm) em 1959 a 392 ppm em 2011. Este aumento de 77 ppm pode ser usado para calcular quanto carbono acumulou na atmosfera em termos de bilhões de toneladas de carbono. O fator de conversão, 2,13 BTC por ppm de gás carbonico, significa que cerca de 164 BTC acumulou na atmosfera durante esses 52 anos.
Dados independentes da produção de petróleo, gás natural e carvão indicam que cerca de 295 BTC foram emitidos durante este período, ou seja, atividade humana de queima de combustíveis fósseis emitiu 80% mais do que acumulou na atmosfera, o resto indo para os oceanos, acidificando as águas superficiais, e no crescimento de florestas e outra vegetação. Atualmente temos 400 ppm de gás carbônico na atmosfera e a concentração continua a subir.
De um lado, somos insignificantes em termos da área que ocupamos como indivíduos no planeta, mas tanto no efeito da cobertura da vegetação, na produção primária e na composição da atmosfera, viramos uma força planetária. Esta força pode ser usada inteligentemente, como Jonathan Foley e outros colegas escreveram na revista Nature em 2011 num artigo entitulado “Soluções para um Planeta Cultivado”.
Eles notaram que precisamos dobrar a nossa produtividade de comida nas próximas décadas e ao mesmo tempo reduzir o nosso impacto no meio ambiente. Todavia abordagens revolucionárias são essenciais para superar os desafios que a pobreza e aumento de demanda num mundo de mudanças criam. Temos a capacidade, no entanto precisamos desenvolver a vontade no tamanho desses desafios.
Para os leitores interessados na documentação das afirmações deste texto, uma versão com referências está disponivel no sítio do jornal A GAZETA e pode ser obtida através do e-mail: [email protected].
*Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA).