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Sombra e luz

Somos conhecidos há anos e nunca ouvi falar bem dele.
As referências são as piores. Dizem que não é bem certo. Quem usa drogas. Quem trafica. Quem foi péssimo marido. Quem é desonesto. Quem briga com os vizinhos. Quem estar perto dele significa ter problemas.
De modo que nunca me senti motivada a ser sua amiga. Nem inimiga. Se o encontro, cumprimento. E mantenho cautela.
Mas estes dias assisti a uma cena que me fez pensar.
Avistei-o num parque, ele não me percebeu. Estava com suas filhinhas, que moram com a mãe. De mãos dadas, uma de cada lado. Ora caminhava devagar, no ritmo das crianças, sorridentes. Quando elas cor-riam, ele corria junto. Depois as meninas paravam para colher umas florzinhas no chão. Ele agachava com elas. Esperava. Conversava com as duas, sorria.
As pequenas estavam muito satisfeitas, no seu passeio com o papai. Que parecia mais uma criança, de tão entregue ao momento. Mesmo assim, via-se que cuidava das filhas. Carinhoso e brincalhão.
Ao descobri-lo também doce, senti despontar em mim uma nota de afeição por ele.
Então, uma vez mais, certifiquei-me do quanto é vão e sempre impreciso o julgamento que um ser humano pode fazer de outro.
Pois o outro, sombra e luz, é um universo, um mundo de surpresas e de possibilidades.

Onides Bonaccorsi Queiroz é jornalista, escritora e autora do blog verbodeligacao.wordpress.com
E-mail: onides.queiroz@gmail.com

Categories: OPINIÃO
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